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Bovespa, atual B3, fotografada em 2017.
Bovespa, atual B3, fotografada em 2017.| Foto: Wikicommons

No final dos anos 90, quando trabalhava em um banco de investimentos, fui chamado para intermediar uma transação de compra de uma rede de supermercados da Colômbia por uma multinacional francesa. Por questões legais, a conclusão do negócio deveria ser em pregão de bolsa, só que a bolsa da Colômbia estava fechada havia décadas. Compra e venda de participação em empresas naquele país eram feitas “em balcão”, sem pregão, com pouco volume e baixa liquidez.

Por isso, tiveram que abrir a bolsa por um dia só para poder legalmente fechar o negócio. Entrei naquele imóvel clássico abandonado, parado no tempo, com preços marcados em giz no quadro negro com as últimas cotações de quando a bolsa operava. Foi surreal. Fiquei inquieto ao ver um belo país como a Colômbia, com povo educado e empreendedor, sem um mercado de capitais local ativo. Não demorou para imaginar como seria se o mesmo ocorresse no Brasil, um mercado relativamente grande se comparado aos demais da região, mas muito pequeno perante os maiores do mundo.

Sabia que ver as bolsas fechadas em mercados grandes também não era novidade. A Rússia fechou sua bolsa em 1917 e só reabriu 75 anos depois. A China, em 1952 e só voltou às atividades depois de 37 anos. Entretanto, mesmo ao serem reabertas, nunca mais foram as mesmas: agora tinham a mão pesada do controle de Estado que antes não tinham.

A nossa bolsa tem dono. Aparentemente, um grande fundo internacional é de facto o controlador da maior bolsa brasileira e faz lobby político intenso para permanecer como a única bolsa do Brasil, podendo assim forçar as nossas empresas a abraçarem a agenda restritiva do ESG

A verdade é que, se fecharmos nossa bolsa de valores, os mercados mundiais não seriam tão afetados. Quem sofreria os efeitos seria a nossa classe média que seria. Por quê?

Por cinco razões. Primeiro, o valor das empresas multinacionais que operam no Brasil é estabelecido por mercados internacionais. No caso da empresa francesa, que comprou a colombiana para aumentar suas receitas, o ganho dessa compra foi consolidado na França. Ganha quem investe através na bolsa de lá. E algumas grandes empresas brasileiras dão mais prioridade a ter suas ações cotadas em mercados maiores, mais líquidos e menos regulamentados do que no mercado local.

Segundo, porque somos, aos olhos dos mercados mundiais, um mero fornecedor de commodities. Não somos distribuidores, transformadores, nem mesmo os maiores consumidores de nossas próprias matérias-primas. Os mercados com os consumidores e as empresas que exercem essas atividades transformadoras são os que estabelecem preços.  Do ponto de vista mundial, não são nossos mercados que estabelecem os preços de nossas commodities (minerais e agrícolas); menos ainda de nossos produtos acabados.

Terceiro, nosso mercado de capitais nunca teve a chance de crescer.  Sofremos com governos que gostam de planejar a economia - um modelo historicamente interventor, com muita regulamentação e taxação, aquilo que os socialistas chamam de “avanços”. Em outras palavras, em vez de reduzir as regulamentações e permitir que vários mercados surjam, estamos sempre nos auto-restringindo. Enquanto que abrir, operar e financiar crescimento de pequenas e médias empresas é mais abrangente em outros países, aqui as restrições acabam limitando esse ciclo a um grupo seleto, o que reduz a diversidade de oferta de produtos e serviços, bem como a competitividade do mercado como um todo.

Quarto, nossas agências reguladoras e o CADE no papel defendem o livre mercado e a concorrência, mas na prática são criadores e pilares de apoio de oligopólios. A única ajuda a que se prestam é garantir mercado cativo e financiamento subsidiado para os “compadres”, i. e., grandes empresas amigas dos políticos. Diante de países desenvolvidos, no Brasil cada setor da economia é dominado por cartéis empresariais que não sofrem com as mesmas regulamentações que sufocam a livre-iniciativa dos pequenos e médios. Por consequência temos pouca concorrência.

Quinto, a nossa bolsa tem dono. Sim, aparentemente um grande fundo internacional é de facto o controlador da maior bolsa brasileira e faz lobby político intenso para permanecer como a única bolsa do Brasil, podendo assim forçar as nossas empresas a abraçarem a agenda restritiva do ESG - Ecologia, Social e Governança. A política de exigir que as empresas demonstrem que estão comprometidas com a “justiça e igualdade social” e com o meio ambiente através de investimentos em ESG é cara e inibidora para empresas médias e pequenas. Sugiro ao leitor que pesquise o tema.

É possível que nunca cheguemos ao ponto de fechar nossas bolsas. Não porque haverá pressão dos empreendedores, mas porque já existe evolução dos socialistas fanáticos por controle. Eles perceberam que não precisam ser donos do capital, se podem controlá-lo por meio de leis, agências reguladoras e impostos. Esse tipo de controle de todo o mercado brasileiro é crescente.

Os termos “capitalismo de estado”, “fascismo econômico”, “capitalismo planejado” e, sua última versão, “capitalismo progressista” significam a mesma coisa: neossocialismo. E seus inimigos sempre foram a classe média, a livre-iniciativa, o pequeno e médio empresário, o empreendedor e o mercado de capitais livre de interferências de governos, cartéis, oligopólios e monopólios.

Apesar da evolução do nosso mercado de capitais em número de investidores, observamos recentemente a pressão contrária e crescente através do capitalismo progressista do ESG.

Ter um mercado de capitais local pujante é fundamental não só para estabelecer preços, dar liquidez e acesso a capital para as pequenas empresas locais, mas também para promover impacto social real e sustentável, independente do Estado. Representa um importante canal para a classe média participar dos ganhos das empresas locais as quais ela conhece ou nelas trabalha, assim como poder investir sua poupança.

O mercado de capitais local ativo, de livre acesso para investidores e empresas, proporciona enriquecimento para a classe média, e sabemos que as forças políticas nacionais e internacionais que agem no nosso país não querem ver nossa prosperidade. Apesar da evolução do nosso mercado de capitais em número de investidores, observamos recentemente a pressão contrária e crescente através do capitalismo progressista do ESG.

Nossa bolsa e legisladores têm fomentado regulamentação favorável ao ESG sem contraposição efetiva até o momento, muito porque a opinião pública ainda não se deu conta do perigo que representa para si e para a sociedade. Assim como os brasileiros lutam por mais democracia, transparência e liberdade, têm de lutar também por um mercado mais livre, abrangente e acessível.  Sim, esses temas andam juntos e um não sobrevive sem o outro.

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