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J. K. Rowling: a autora de “Harry Potter” acusada de transfobia
J. K. Rowling: a autora de “Harry Potter” acusada de transfobia| Foto: EPA

Na patrulha identitária deve ter alguma norma que obrigue a dedicar um momento do dia a perseguir a escritora J. K. Rowling. Agora, ela já está fora de um especial sobre a obra dela própria na HBO no Ano Novo. Mas ainda não é o suficiente. Depois de incentivos à invasão da casa da escritora, vamos a mais um round de assédio. Agora o problema é errar o artigo ao falar com o estuprador x estupradxr.

Ainda que você não fale inglês, vale a pena dar uma olhada nesse vídeo. Repare na comparação do letreiro com o nome da criadora de Harry Potter antes e depois do cancelamento. A entrevista é com uma ativista que defende o apagamento da autora e diz que ela não foi apagada de nada. Pelo menos no Reino Unido ainda se permite que jornalista faça pergunta. Ian Collins pergunta à ativista se ela considera que não é um estupro masculino aquele cometido por uma pessoa que tem pênis. Ela desconversa.

J. K. Rowling disse que mulheres trans são estupradoras? Não, mas também não importa. A patrulha não ouve quem é de fora da patrulha, apenas cria estereótipos. Quem disse que mulheres trans são estupradoras foi a polícia da Escócia. Foi tomada a decisão de fichar como mulher e mandar para o sistema prisional feminino o estuprador x estupradxr que se autodeclarar mulher no momento da prisão. Não precisa ter feito transição, cirurgia nem mudado o documento. Quem conta?

O governo da Escócia está enfrentando uma oposição ferrenha dos movimentos feministas, mas alega que não quer dificultar a vida de quem já tem disforia de gênero. Para quê exigir exame médico, laudo, atendimentos ou documento se a pessoa cometer um crime e for presa? Vamos desburocratizar, né? A ideia é adotar o parâmetro do tuiteiro médio da patrulha identitária brasileira. Tem de acertar o artigo que a pessoa estiver a fim de ser chamada no momento da prisão.

O absurdo da situação vira uma distorção ainda mais distópica nas mãos da patrulha identitária. A coisa mais sensacional de debater com a seita woke tupiniquim é essa apropriação cultural dos métodos de Paulo Salim Maluf. Minha entrada para o jornalismo político, aos 19 anos de idade, depois de madrugadas sangrentas no jornalismo policial paulistano foi graças a ele. Ou melhor, foi graças a uma briga com ele exatamente por esta técnica de debate usada agora pela militância lacrativa.

A patrulha identitária malufou. Não importa o que aconteça ou o que alguém tenha falado, eles respondem o que quiserem. Você diz: "um estuprador não pode ir para a prisão feminina só porque disse na hora da prisão que é mulher". Resposta: "transfobia dizer que só mulheres trans estupram e não são estupradas". Lembra quando eu perguntava: "prefeito Paulo Maluf, e sobre as acusações de corrupção?". Resposta: "Sabe quem construiu a avenida Jacu Pêssego? Paulo Maluf!". Desde que Lula malufou começou essa palhaçada.

Quando eu vejo esse tipo de militância, sempre fico em dúvida. Pode ser um roteirista da Tatá Werneck fazendo teste de piada em rede social. Pode ser também roteirista da Praça é Nossa, vai que vão fazer uma nova velha surda, né? Mas aparentemente era isso mesmo. E experimente questionar quem disse que só mulher trans estupra ou quem disse que mulher trans não é estuprada. Cancelamento imediato por transfobia.

O argumento é que precisam invadir a casa da escritora J. K. Rowling e ela não pode mais ter o nome mencionado na própria obra porque fez uma manifestação altamente ofensiva às mulheres trans. Ela tuitou um artigo falando do absurdo de aceitar que qualquer estuprador simplesmente diga que é mulher, sem nenhuma prova de que seja trans ou esteja se consultando sobre, e vá imediatamente para o sistema prisional feminino.

A patrulha tenta fazer parecer que o problema é estigmatizar as mulheres trans que estejam sendo presas por estupro. Mas e se ela estuprar outra mulher na cadeia? Dane-se, não tem santa ali. Direitos Humanos para humanos direitos. Malufaram com força mesmo. Mas a questão não é essa, é que estamos lidando com estupradores, um tipo de bandido que nem a lei do cão tolera. Se ele tiver a oportunidade de declarar que é mulher e ir para uma cela feminina, vai usar. E já está usando na Inglaterra e no País de Gales.

Entre 2012 e 2018, 436 estupradores estupradorxs com genitália masculina declararam ser mulheres na Inglaterra e País de Gales. A maioria só descobriu que era mulher depois da prisão por estupro. Vejam só que coisa, como um baque mexe com todo o psicológico da pessoa, né? Foi prender que reavaliou toda a vida e descobriu até que era mulher. E esse processo deve ser um aprendizado bem intenso porque corre no boca-a-boca.

A população transexual carcerária no Reino Unido é muito pequena. Pego uma estatística de Inglaterra e Reino de Gales de 2016 a 2017, quando já se podia simplesmente declarar ser mulher e ir para o presídio feminino mesmo com corpo de homem. Havia mais de 85 mil presos e, em 2016, 70 trans. Em 2017 o número saltou para 125. O último dado, de 2019, é de 436. Deve ser a quebra de tabus sexuais que tem feito tanto preso se assumir trans, né?

E qual o percentual de crimes sexuais na população carcerária? Houve uma explosão desse tipo de crime no Reino Unido em 2019, checando a 1 em cada 8 presos. Estamos falando em 12,5% da população carcerária. E quando falamos da população carcerária que se declarou trans? Mais de 60% por crimes sexuais. Será que tem estuprador se aproveitando da brecha na legislação e inventando que é trans? Imagina, um estuprador jamais faria uma coisa tão cruel e ofensiva.

A discussão no Reino Unido ocorre porque a Escócia vai ter de decidir como lidar na prática com criminoso cruel que se aproveita do que tiver de brecha e não tem limite ético. Na Inglaterra e País de Gales já se verificou que muitos desses simplesmente declaram-se mulheres sem o menor constrangimento após a prisão. Há casos de quem realmente decidiu fazer uma transição de sexo e nem assim parou de estuprar, como Karen White, que foi condenada à prisão perpétua.

Bom, mas danem-se essas coisas todas que aconteceram, dados, fatos, gente real que sofreu de verdade. Eu é que sou insensível e não penso no drama da mulher trans que será levada ao presídio masculino porque sou branca e privilegiada. É verdade mesmo que sou insensível. Uma das frases preferidas do meu filho até os 5 anos de idade era: "desiste, minha mãe não se comove". Avalia como eu fico comovida com cancelamento de lacrador. Mas, como não posso desver, divido com vocês.

Um dos maiores mistérios da criação para mim é a autoestima do homem medíocre. Gostaria de um dia chegar a esse nível espiritual em que eu falo a maior estupidez e realmente acredito que foi uma mega sacada só para os mais intelectuais. O mais interessante da história toda é que danem-se as mulheres estupradas, o estupro foi minimizado e estamos diante da proliferação de esquerdomacho dando palestrinha feminista para mulher. Enquanto houver otário, malandro não morre de fome.

Como a realidade pouco importa, a turma já está dizendo que no Brasil é com autoidentificação e nunca deu encrenca. Que o CNJ já decidiu pela autoidentificação. Que nem precisa de trans para estuprar porque o carcereiro já estupra. Enfim, haja tempo livre para a turminha da lacração. Aqui houve sim uma decisão do CNJ - não do Legislativo, como seria preferencial - mas é bem diferente do sistema britânico. Tem gente que odeia lacrador. Eu gosto, é bem divertido. O que não pode é levar a sério.

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