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Como um todo, a recente portaria publicada pelo Ministério do Trabalho é uma excelente notícia. Ela aproxima a definição brasileira de trabalho análogo à escravidão a aquela usada pela Organização Internacional do Trabalho e a maioria dos países (França, Alemanha, Inglaterra, Estados Unidos, entre dezenas de outros). Mas é fato que portaria poderia melhorar. Destaco a seguir alguns pontos negativos e positivos:

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NEGATIVOS

Muito poder ao ministro
A portaria determina que a lista suja dos empregadores acusados de manter trabalho será divulgada no site do Ministro do Trabalho apenas por determinação do ministro. Isso é um convite à corrupção. É fácil imaginar casos de ministros e seus assessores recebendo propina para não divulgarem a lista suja. Seria melhor se a portaria tivesse determinado um prazo, uma exigência ou um período fixo para a divulgação da lista.

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É uma portaria
Portarias servem para definir com precisão termos presentes nas leis. Há muito tempo os envolvidos no assunto esperavam uma portaria para definir o que é trabalho escravo no Brasil. Até aí, nada de errado com a portaria do Ministério do Trabalho. O problema é que trechos do documento parecem contradizer, em vez de especificar, o artigo 149 do Código Penal, que parece deixar claro que não é necessária restrição de liberdade para haver condição análoga à de escravo. Veja:

Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho,  quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.

Nesse caso, então, teria sido bem melhor se a mudança viesse pelo Congresso, com um novo texto para a lei, e não via portaria ministerial.

POSITIVOS

Definição mais precisa
A mudança mais relevante é que a caracterização de trabalho análogo à escravidão, condição degradante ou jornada exaustiva agora exige de restrição de liberdade (seja por ameaça, restrição de documentos ou não fornecimento de transporte para funcionários em locais isolados). A portaria aproxima a definição brasileira daquela usada pela Convenção 20 da OIT e por todos os países civilizados, para quem trabalho escravo, diferente do trabalho degradante, precisa ser não-voluntário (com exceção do serviço militar e do pagamento de impostos).

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Menos confusão
A definição mais precisa evitará a confusão, criada por muitos fiscais e avistas, entre irregularidade trabalhista e trabalho escravo. Muitas empresas já tiveram a reputação manchada por denúncias escandalosas de escravidão porque havia fios desencapados no banheiro dos alojamentos ou as camas estavam próximas demais. Anos depois, foram inocentadas na Justiça. Isso acontece em mais de 90% dos processos criminais.

Exigência de policiais
As operações de combate ao trabalho escravo costumam iniciar um processo trabalhista e uma denúncia criminal que, como eu disse acima, quase sempre resulta em absolvição. A exigência da presença de uma autoridade policial e de um boletim de ocorrência dará mais consistência à acusação criminal. Também deve impedir casos de corrupção entre os fiscais, pois agentes de órgãos diferentes atuando juntos ficam mais inibidos a pedir propina.