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Caro leitor,
Quero ser um homem bom. Me lembrei disso assim que terminei a gravação do “Última Análise” de sexta (4), em que eu, Francisco Escorsim e Jones Rossi falamos de esperança, cinismo e principalmente dele, o idiota. Ainda no Uber, me vi transportado para a infância. Eu era uma criança chata, miúda, orelhuda e de cabelos desgrenhados que, talvez por alguma coisa que eu tenha ouvido em casa ou na escola, já sabia: quando crescer, quero ser um homem bom.
Aí cresci e me esqueci desse objetivo. Desse ideal. Nesse tempo, tentei ser muitas coisas. Tentei ser um homem inteligente e culto. Depois, tentei ser um homem esperto. Em seguida, tentei ser um homem bem-sucedido. Durante alguns anos dizia que queria ser sábio. Houve também uma fase em que quis ser nada, mas deixa pra lá. Até que, sem nem perceber, voltei a querer ser um homem bom. Só faltava tentar e venho tentando desde então.
O que é um homem bom?
“O que é um homem bom?” Taí. Boa pergunta. Acho que cada um faz uma ideia diferente do que configura o homem bom hoje em dia. Alguns dizem que o homem bom é o que se entrega totalmente ao seu semelhante. Há também aqueles para os quais o homem bom é o homem que está em paz consigo mesmo. Para outros, o homem bom é quem dá esmola e ajuda o cego a atravessar a rua. E todo mundo tem um modelo próximo no qual se espelhar: um pai, um tio, um amigo. Os sortudos têm vários. E não, não me esqueci dEle que é o ideal do homem bom.
Também eu tenho cá para mim um ideal bem vago do homem bom que quero e sou capaz de ser. Da bondade palpável, executável e real em meio às minhas circunstâncias muito específicas. Da santidade alcançável. Não é fácil. Por isso mais fracasso do que tenho sucesso. Ontem mesmo, ah!, ontem. Todos os dias, porém, tento. Exceto por aqueles dias em que esqueço, mas assim que me lembro: tento. Por isso digo que quero ser, não que sou. Não ainda. Nem sei se algum dia. Talvez apenas no leito de morte. Mas tento.
Armadilhas
Ser um homem bom. A paisagem é bela, mas o caminho é difícil. Tem pedrada, tem espinhos, tem corações partidos e tem rasteiras. Para piorar, tem as armadilhas, como a de querer ser reconhecido como um homem bom. Essa é bem perigosa, hein?! Pode te fazer ignorar a consciência em nome de uma admiração que, no mais, é falsa e extremamente frágil. O homem que tenta ser admirado satisfazendo um ideal alheio de bondade com o tempo se torna mau. Se me permite um conselho, tome cuidado.
A outra perversão desse objetivo infantil é esperar que todos sejam tão bons quanto eu acho que sou. É ficar tão cheio de si a ponto de se transformar na medida da bondade que o cerca. Seu tolo! Lembre-se: bomba, tiro, flechadas e xingamentos. E você, com esse seu coração de pedra aí, você quase vira o avesso da bondade. Avisei que a paisagem era bela, mas o caminho era difícil? No entanto, e apesar de saber que alguns lerão esse texto como uma confissão de fraqueza ou a exaltação hipócrita de uma falsa virtude, continuo querendo ser um homem bom. É um desafio e tanto. Tento.
Um abraço do
Paulo.