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Polzonoff

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Transformando em crônica heroica o noticiário de cada dia.

Não é fácil

Triste ou enojado com a condenação de Bolsonaro? Não fique. Agradeça!

CONDENAÇÃO BOLSONARO
Infeliz daquele que se alegra com a desgraça alheia. (Foto: Antonio Augusto/STF + Gemini)

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Na quinta (11), logo depois que Cármen Lúcia anunciou seu voto condenando Bolsonaro, teve início o deprimente, mas inevitável, espetáculo. Políticos, jornalistas, artistas e influencers, alguns dos maiores escroques do Brasil, celebraram o provável destino do ex-presidente: a prisão. Tripudiavam, zombavam, expressavam uma alegria mórbida pela destruição do outro.

Ao ver isso, em mim foi crescendo o que só posso descrever como nojo. Ou seria tristeza? Não, não era tristeza ainda. Era nojo mesmo. Estava quase vomitando. Nojo que aumentou depois que Alexandre de Moraes mandou às favas o rito da farsa jurídica para confessar que estava condenando Jair Bolsonaro porque o ex-presidente o chamou de canalha. Ou seja, para provar que não era, foi. E, em sendo, permitiu que toda uma legião assim também se revelasse em piadas e risadinhas que só faziam aumentar a desgraça do condenado.

Confissão do nosso fracasso

Do nojo à tristeza foi um pulo, mas não é nada disso que você está pensando. Não fiquei triste pelo que acontece no presente: a injustiça, a falta de decoro, a maldade com verniz de legalidade, a mentira que tenta se impor como verdade histórica. Digo, senti uma pontadazinha ao testemunhar tanta perversidade assim, tão às claras; mas me bastou sair das redes sociais por um instante – e pronto. Passou. O que me deixou triste mesmo foi voltar no tempo e me reconhecer semelhante àqueles que, exultantes, agora revelam ao mundo a dimensão real de seu diminuto caráter. Sendo sincero, não lembro; mas provavelmente também comemorei simiescamente a condenação, queda e prisão do Lula.

Ah, mas no caso do Lula era diferente – dirá alguém, antes de me xingar de isentão. Claro que era. Cabia recurso, etc. e tal. Era, mas também não era. Porque, no fundo, as quedas desses líderes populares são todas meio parecidas. São uma derrota pessoal e política para eles, sem dúvida, mas também são uma derrota coletiva. Pode até não parecer e Alexandre de Moraes negará isso até a morte, mas não se engane: a condenação de Bolsonaro, bem como a comemoração dessa gente que vendeu a alma em troca de aceitação e nem se dá conta, é uma confissão do nosso fracasso enquanto povo e país. Enquanto democracia.

Milagre

Aí aconteceu o que vou chamar de milagre. Fiquei feliz. Vem cá, chega mais perto, me ouve. Quero que você preste bem atenção a esta parte do texto. Quem sabe não te contamino? Como ia dizendo, fiquei feliz. Porque já fui do tipo que celebra o mal praticado contra meus inimigos e não sou mais. Fiquei feliz porque me dei conta de que, diferente dos que hoje apedrejam Bolsonaro e ridicularizam os bolsonaristas, não preciso mentir para mim mesmo. Nem preciso ostentar uma supostíssima virtude política, porque não sou escravo de nenhuma ideologia. Não é uma maravilha?!

É e tem mais. Fiquei feliz porque sou livre, porque me sei imperfeito e falho, porque ainda tenho sonhos e esperanças, porque posso trabalhar e não raro trabalho rindo, porque ganho a vida honestamente, porque tenho saúde, porque não me faltam amigos para brindar à mesa, porque amo e sou amado, porque sei que isso tudo é transitório, porque erro, mas estou fazendo o meu melhor, e porque minha alegria não depende do infortúnio de ninguém.

Lavagem do rancor

É bom, bom demais reconhecer a graça de Deus na nossa vida. Por isso recomendo aproveitar esses momentos de trevas, when you're weary and feeling small e quando tudo parece ir contra aquilo em que a gente acredita e deseja, para agradecer a Deus pela oportunidade de hoje, só hoje, fazer o bem aos nossos semelhantes, sem que para isso sejam necessários decretos, leis ou decisões do STF. Basta a nossa vontade. No embalo, agradecer também pela capacidade de nos reconhecermos um pouquinho nesses que hoje dividem com os porcos a lavagem amarga do rancor. Também já fomos assim, mas não precisamos ser. É uma escolha.

Por fim, agradecer pelo desejo sincero de, daqui para frente, ser diferente de todas essas coisas, pessoas e instituições que, ao nosso redor, tanto nos enojam e entristecem com sua alegria sádica. Não é tão difícil, vai. Basta trocar o insulto pelo silêncio; a raiva pela compreensão; a reação instintiva pela reflexão; as certezas alicerçadas na areia da ideologia pela fé sincera; o ódio pela compaixão; e o desejo de vingança pela misericórdia. Não estou dizendo que seja mamão-com-açúcar. Não é. Mas tente. Você vai ver só como vale a pena.

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