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Estudo comprova: radicais de direita e esquerda são a mesma coisa
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Não foram poucos a notar a correlação entre o espírito autoritário de militantes políticos da extrema-direita e esquerda. São mesmas a ausência de empatia e a vontade de mandar e impor sua visão de mundo. A tendência ao uso da violência como instrumento de punição aos “impuros” é outra característica marcante em ambos, fazendo com que o observador externo, por vezes, não saiba reconhecer quem é quem no jogo de autoritarismo.

Algumas teses, popularizadas em redes sociais, buscavam explicar o fenômeno de forma gráfica, quase anedótica. É o caso da teoria da ferradura, de Jean-Pierre Faye, que redesenha a linha unidimensional esquerda-direita na forma de um “U” invertido, onde os extremos de cada lado, ainda que não se toquem, são mais próximos um do outro do que do centro da representação política.

Para Faye, tal diagrama explica as diversas similaridades entre regimes comunistas e fascistas, que aplicam violência e autoritarismo em escala industrial, praticam o culto personalista ao líder de ocasião e tratam o adversário político — o “capitalista’ para os comunistas, o “judeu” para nazistas  — como razão central de sua concentração de poder e barbárie.

A tese é bacana mas limitada; restringe-se a regimes políticos muito particulares de um momento histórico — o começo do século XX — que já passou. Mais: ambas as pontas da ferradura, fascismo e comunismo, foram derrotadas pelas democracias liberais ainda no século que se passou, tornando-se sombra que turva a análise dos recentes fenômenos de radicalismo que assolam este começo de século XXI.

A ascensão de expressões violentas do politicamente correto — mais notadamente o fenômeno Black Lives Matter —, que espalharam caos e destruição pelos Estados Unidos, traz luz para uma nova roupa do extremismo político, profundamente identitária, anárquica e autoritária. Mais: em contraposição a ele, temos a ascensão, nos últimos anos, de expressões políticas radicais no campo da direita, tendo como destaque os jovens antissociais da alt-right. Estes operam violência política em menor escala, mas trabalham com a dessensibilização e a destruição de reputações em redes sociais num ritmo sem precedentes nas democracias modernas.

Como enquadrar fenômenos tão novos dentro de classificações e categorias tão velhas? As variáveis são muitas, impedindo análises simplórias de se estabelecer. Mas com base em algumas pistas óbvias, como o comportamento antissocial das militâncias e certa dose de psicopatia de suas lideranças, alguns pesquisadores conseguiram chegar a resultados assustadores sobre radicais de esquerda e direita. É o que mostra um estudo conduzido por Jordan Moss e Peter J. O’Connor, da Queensland University of Technology, em Brisbane, na Austrália.

No estudo, os pesquisadores adotaram uma metodologia diferente. Analisaram militantes políticos de três vertentes radicais — PCA, ou “politicamente corretos autoritários”; PCL, ou “politicamente corretos liberais”; e WI, ou White Identitarians (brancos identitários), figuras presentes na escalada de autoritarismo no debate público norte-americano. Na pesquisa, ao invés de analisar a natureza de suas posições, os pesquisadores trouxeram outro enfoque: resolveram avaliar os traços da “Dark Triad” (tríade negra) de comportamentos antissociais nos entrevistados pelo estudo. E o que seria tal tríade? Em tradução livre, na palavra dos pesquisadores:

Dada a natureza extrema destas atitudes políticas e seu possível papel em comportamentos agressivos em protestos, nós exploramos sua associação com os traços de personalidade da 'Tríade Negra’. Tal tríade inclui três dimensões sombrias da personalidade (maquiavelismo, narcisismo e psicopatia) que não são capturadas com com eficácia pelos esquemas mainstream de taxonomia de personalidade como o conhecido ‘Big Five.

O estudo observou, com validação estatística e metodológica, que tanto os “politicamente-corretos autoritários” quanto os “brancos identitários” da alt-right possuem traços significativos de narcisismo, maquiavelismo e psicopatia, tendendo a naturalizar o controle autoritário sobre o comportamento social alheio e expressar de forma excessiva seus impulsos personalistas. Tais traços não foram observados com a mesma intensidade nos “politicamente corretos liberais”, mais focados na questão das desigualdades per se do que em ações autoritárias para corrigi-las.

A novidade do estudo é que, pela primeira vez, a impressão natural que todos temos sobre radicais políticos serem “a mesma coisa”, não importa a linha ideológica, encontra base científica para se estabelecer. Isso ajuda a entender os mecanismos internos que fazem com que indivíduos com traços de perversidade se identifiquem tanto com causas extremas e lideranças psicopáticas, que tem a incrível habilidade de ativar o que há de pior na psique de seus seguidores.

Creio ser possível inferir que fenômeno similar ocorrido no Brasil — os canceladores de esquerda e os bolsominions de direita — pode ser explicado pela mesma lógica. Os traços da tríade negra, em análise preliminar, podem ser encontrados no presidente da república e seus arroubos narcisísticos, em sua militância dançando com caixões em praça pública, na negligência com que a pandemia é tratada e na ausência completa de urbanidade no trato com a oposição. Para ilustrar o absurdo, ao longo de uma semana, sua militância foi capaz de criar montagens sugerindo que o youtuber Felipe Neto era pedófilo e insinuações no Twitter dando a entender que este que vos fala — e o MBL — tentaram assassinar uma delegada.

A incrível habilidade de mentir e destruir é acompanhada pela turma da esquerda radical, que entre uma manifestação violenta e outra, conduz rituais públicos de expiação através dos já famosos cancelamentos, em que personalidades que pisam fora da ortodoxia politicamente correta são publicamente destruídas, tendo suas personalidades (e posições) aprioristicamente negadas perante o “clero” da nova religião laica. Percebam os trejeitos, o olhar vazio, a retórica apocalíptica: muito pouco separa a filosofa lulista Márcia Tiburi do jornalista bolsominion Allan dos Santos. Na guerra de autoritários, suas posições são mero detalhe.

Resta-nos a triste conclusão: as redes sociais, ao invés de promover o senso comum no debate público, trouxeram luz para o que há de pior no comportamento antissocial. Somos governados, hoje, pela polarização entre extremos, que discordam no conteúdo mas se igualam na forma. Eis aí nossa tragédia. Não importa o lado que vença, mantendo-se o debate radical, seremos sempre governados por psicopatas e seu exército de homens-massa. Parece distopia mas é só o mundo em que vivemos.

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