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É impressionante o espaço ocupado na imprensa e nas redes sociais brasileiras pela cobertura do segundo mandato do Presidente Donald Trump. Arrisco-me a dizer que o espaço é equivalente ao reservado ao noticiário político nacional.
Diga-se o que quiser de Donald Trump, mas tanto os admiradores como os detratores precisam reconhecer que é impossível ignorá-lo. Não só por ocupar a presidência do país mais poderoso e influente do mundo, mas também por sua impulsividade e a sua falta de receio de desagradar a comunidade internacional ou quem pensa diferente dele.
Aqui no Brasil a sua vitória eleitoral e o seu mandato estão sendo comemorados pela direita política. Há motivos para tanto. Ideologicamente, há um fortalecimento do conservadorismo e a guerra cultural promovida pela esquerda contra os valores tradicionais, inclusive contra a família e a religião, que sofreu um baque considerável. Os excessos da política identitária e do movimento woke estão na defensiva. Nada mais emblemático do que a revisão espontânea por grandes corporações empresariais de suas políticas de diversidade. Assistimos também a um movimento contrário aos excessos regulatórios, inclusive das grandes plataformas digitais, o que beneficiará indiretamente a liberdade de expressão nas redes sociais.
Suspeito que, no Brasil, a esquerda política não vê com olhos tão negativos o novo mandato de Trump. Apesar das ideias antagônicas, a esquerda brasileira ganhou um inimigo externo e poderá renovar o seu culto irracional ao antiamericanismo. Doravante, todas as mazelas do mundo e do Brasil passarão a ser atribuídas ao novo imperialismo norte-americano.
A eleição de Trump não traz ganhos econômicos óbvios para o nosso país, mas na prática somos beneficiados politicamente pois ela revela para onde o vento sopra e não é a favor do PT
Já tivemos uma amostra na recente exploração política relacionada aos brasileiros deportados. Os imigrantes brasileiros chegaram deportados dos Estados Unidos em aviões militares com algemas nas mãos e nos pés. Foi o que bastou para episódio ser explorado à exaustão pelo Governo e por seus aliados, com a reclamação de que os brasileiros estariam sendo tratados como criminosos. No entanto, o transporte de imigrantes ilegais com algemas, embora ofereça cenas lamentáveis, é um procedimento padrão de segurança que é adotado nesses voos há anos. Foi assim durante o Governo Biden, com 32 voos e 3.660 brasileiros deportados, sem que houvesse qualquer reclamação do Governo Lula.
Da minha parte, entendo que não devemos nos iludir. Trump, como anunciou em seu discurso de inauguração, irá trabalhar, como é natural, pelos interesses dos Estados Unidos: America first. Ele não foi eleito para ajudar o Brasil e, infelizmente, após 16 anos de governos petistas e suas gestões desastradas, o nosso país perdeu relevância econômica e política na comunidade internacional. O Brasil não é uma prioridade para Trump sequer na América Latina.
O melhor cenário é não sermos alvos de elevações de impostos de importação. Trump elevou tarifas até mesmo contra importações de países tradicionalmente aliados, como o Canadá e o México, embora, enquanto escrevo este artigo, leio notícias de que acabou de suspender as medidas contra o último país. Se o Brasil não for alvo da guerra comercial de Trump, ele pode até se beneficiar indiretamente já que os países prejudicados terão que procurar novos parceiros comerciais. Ainda assim, tudo é muito incerto, pois o refluxo da globalização e um cenário de incertezas podem afetar o crescimento econômico global e aí o Brasil será inevitavelmente afetado. A ver.
Deixando de lado as questões econômicas, entendo que, no plano político, os benefícios superam as perdas. A esquerda brasileira ganha um vilão – é certo, mas perde o discurso e suas bandeiras. Já há algum tempo, a esquerda está sem rumo, sendo sua única aposta a política identitária e a assim denominada defesa da democracia. Com o arrefecimento da primeira, ela, por ora, fica só com a última. Passados dois anos do início do governo, sem qualquer ameaça real à democracia no horizonte e com as contradições do apoio do Governo Lula aos ditadores na Venezuela e em Cuba, não me parece que a defesa da democracia seja suficiente para sustentar politicamente a esquerda. Há um contraste ainda entre o dinamismo do novo Governo norte-americano e a apatia do Governo Lula, sem projeto para o país. O contraste já existia com os sucessos econômicos do Governo Milei, aqui do lado, na Argentina, e irá agora se aprofundar.
No fundo, a eleição de Trump não traz ganhos econômicos óbvios para o nosso país, mas na prática somos beneficiados politicamente pois ela revela para onde o vento sopra e não é a favor do PT e de Lula.