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Precisamos mesmo colocar um adjetivo em "evolução" para dar a entender que vemos propósito nos processos evolutivos? (Foto: kimji/FreeImages.com)
Precisamos mesmo colocar um adjetivo em "evolução" para dar a entender que vemos propósito nos processos evolutivos? (Foto: kimji/FreeImages.com)| Foto:

O debate sobre ciência e religião (assim como, arrisco dizer, inúmeros outros debates) é campo fértil para rótulos que “ajudem” a identificar de que lado as pessoas estão. Alguns desses rótulos são autoimpostos, outros são criados por estudiosos do tema, e há sempre aqueles lançados pelos adversários. “Acomodacionista”, por exemplo, é usado para designar aqueles, religiosos ou não, que defendem a compatibilidade, em maior ou menor grau, entre ciência e fé. Ateus militantes (olha outro rótulo aí) adoram usá-lo como insulto, especialmente contra outros ateus ou agnósticos que não compartilham do seu desprezo pela religião. Os alvos parecem não se incomodar tanto assim, embora eu considere que no termo está embutida a ideia de que seria necessária alguma gambiarra intelectual para “acomodar” ideias opostas entre si.

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Precisamos mesmo colocar um adjetivo em “evolução” para dar a entender que vemos propósito nos processos evolutivos? (Foto: kimji/FreeImages.com)

O rótulo da vez é “evolução teísta”. A expressão serve para designar a adesão à Teoria da Evolução, mas considerando também que todo o processo tem a participação divina, seja no desenho das leis da seleção natural, seja em algum tipo de “direcionamento” para que as coisas tomassem o rumo que tomaram (ou seja, na direção de seres inteligentes e conscientes capazes de um relacionamento pessoal com a divindade).

A professora Stacy Trasancos não gosta do termo, assim como outros católicos que defendem com unhas e dentes a evolução. Para ela, a expressão tem problemas, como ser redundante: “Pense: se você tem fé, já está implícito que você vê todos os processos físicos e biológicos como tendo sido criados e mantidos por Deus”, ela diz. Além disso, o adjetivo deixa implícita a possibilidade de existir uma “evolução ateísta“, ou seja, a ideia de que Deus não esteja envolvido na criação das leis da natureza.

No fim, evolução é evolução e ponto final. “Vamos deixar de fora os adjetivos desnecessários e tratar a ciência evolucionária como uma ciência física e biológica. Recuse-se a tratá-la como algo além disso. Julgue-a pelos seus méritos científicos ou pela falta deles”, diz Stacy. No fim, a discussão foi parar até na Forbes.

Ontem à noite, gravei um podcast com o André Brandalise e o Reinaldo Lopes e acabamos tratando um pouquinho do tema sem entrar nos rótulos. Uma das perguntas que levantamos era a da possibilidade de haver um propósito na evolução. Eu acho que há, mas isso não tem nada a ver com o trabalho dos cientistas que pesquisam os processos evolutivos. Quando eu afirmo que há um propósito na evolução, ou que as leis da seleção natural foram criadas por Deus, estou fazendo afirmações filosóficas e teológicas. Assim como quem nega qualquer propósito na evolução também está entrando no campo da filosofia, por mais que relute em admitir isso. Nesse sentido, acho que Stacy está certa: a evolução deve ser avaliada do ponto de vista puramente científico. Considerações de cunho filosófico ou teológico são pertinentes, mas não “alteram” a ciência da evolução a ponto de justificar que lhe tasquemos um adjetivo.

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