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É, o blog ficou um pouco desatualizado, mas tem explicação: semana passada saí em viagem pelo jornal, e quando voltei, além de tomar pé do que havia ocorrido enquanto estive fora, ainda descobri que, por causa da licença de um colega, estava com novas responsabilidades. Fora o vestibular da UFPR que se aproxima… mas vamos fazer um pequeno recap das coisas que foram notícia nos últimos dias e que são de interesse. Algumas até eu já tinha visto antes da viagem, mas não havia tido tempo de comentar.

CARREGANDO :)

Quando noticiei aquela mesa-redonda sobre a obsolescência (ou não) da crença em Deus, descobri o site da Skeptics Society e a sua newsletter, a eSkeptic. Fiz meu cadastro e, na edição de 22 de outubro, veio uma interessante resenha de um livro chamado Thank God for Evolution – nome sugestivo, não é mesmo? Quem faz a crítica é o filósofo Michael Booker, que já começa entrando de sola e comparando o livro à cama de Procusto: para promover a conciliação entre ciência e religião, a religião teria praticamente de abandonar tudo o que tem de sobrenatural. E o autor faria a ciência dizer mais do que ela realmente diz. Vale a pena ler a resenha toda, ainda mais porque a eSkeptic permitiu que o autor, Michael Dowd, escrevesse uma réplica. Confesso que achei a resposta de Dowd bem “mais ou menos”, inclusive porque ele não tentou rebater a acusação de usar uma “cama de Procusto”.

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E Dowd encerra sua réplica com a seguinte afirmação: “enquanto a maioria das igrejas na América não coneçar a ensinar entusiasticamente a evolução nas aulas de educação religiosa, e pregar com convicção os benefícios práticos da visão de mundo evolucionista, a guerra entre ciência e religião nunca terá fim”. Bom, para dizer isso ele parte do pressuposto de que exista uma guerra entre ciência e religião. Como vocês sabem, não acredito nisso. O que eu vejo é o uso da ciência e da religião como armas em outros tipos de guerra: aquela movida pelos ateus militantes, e a movida pelos fundamentalistas (aqui no “mau” sentido da palavra) religiosos que na verdade parecem entender bem pouco de religião.

Além disso, qual a necessidade de ensinar “entusiasticamente” a evolução nas aulas de catecismo? Sinceramente, existe muita coisa mais importante para ensinar na catequese. Como se já não bastassem os teólogos da libertação querendo ensinar os católicos a fazer a revolução socialista em vez de passar a doutrina correta da Igreja, Dowd ainda quer que a catequese vire aula de ciência também. Assim não vai sobrar tempo para ensinar quem foi Jesus, o que ele pregou, essas coisas… a verdade é que, pelo menos do ponto de vista da fé católica, é pouco relevante defender evolução, criação literal, design inteligente ou uso e desuso. É possível ser católico e aceitar qualquer uma dessas teses – a Igreja exige a crença em certos pressupostos mínimos, como o de que Deus tirou o universo do nada. Fora desses pressupostos, há a liberdade e a ciência. Eu poderia aparecer em uma rodinha de biólogos católicos defendendo o lamarckismo e eles ririam da minha cara. Mas porque eu estaria defendendo uma teoria cientificamente obsoleta, e não porque eu estaria em desacordo com a doutrina da Igreja.

Aliás, falando em evolução, minha colega Sandra diz que na exposição sobre Charles Darwin que está na Universidade Positivo há alguns painéis sobre ciência e religião. Já estava curioso para ir, mas depois desta informação estou ainda mais interessado.

Mudando de assunto, dia 12 a Folha de S.Paulo publicou uma matéria muito interessante chamado Idéia reemergente, que havia saído antes na New Scientist (o link do UOL é só para assinantes, então vocês podem ler aqui). Resumindo muito resumido, poderíamos dizer que há cientistas descobrindo que “o todo é mais que a soma das partes”. Isso tem implicações filosóficas, como diz na reportagem John Barrow, de Cambridge. A própria reportagem diz que este é um golpe no reducionismo, por exemplo: essa visão de que basta entender as partes para se compreender o universo em sua totalidade. Levando às últimas conseqüências, poderia ser uma admissão de que a ciência não tem, e talvez não terá, todas as respostas.

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No mesmo dia em que a Folha publicava Idéia reemergente, na concorrência Daniel Piza comentava Do que É Feito o Pensamento, de Steven Pinker. O articulista do Estadão começa lembrando que a era Bush está no fim. Piza espera que, junto com GWB, caia no esquecimento também “a reação do conservadorismo religioso à ciência”. Bom, isso já é uma generalização perigosa, mas o pior vem depois. Segundo Piza, uma das manifestações desse conservadorismo é a “resistência às pesquisas com células-tronco”. Assim mesmo, células-tronco, ponto. Não distingue entre adultas e embrionárias. Essa tem sido a minha maior birra quando leio sobre esse assunto: a insistência dos meus colegas jornalistas em não fazer a distinção – fica parecendo que a Igreja é contra qualquer pesquisa com células-tronco, mesmo as adultas – e não procurar expor corretamente os argumentos contrários ao uso de embriões em pesquisa. E olha que, no texto do Piza, ter feito essa ressalva teria custado apenas 12 caracteres a mais…