• Carregando...
A burocracia da ONU tem se voltado para o Brasil há algum tempo, emitindo uma série de recomendações para que o país legalize o aborto, mas a intervenção externa no assunto é ilícita
A burocracia da ONU tem se voltado para o Brasil há algum tempo, emitindo uma série de recomendações para que o país legalize o aborto, mas a intervenção externa no assunto é ilícita| Foto: Eli Vieira com Midjourney

Enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) analisa uma contestação constitucional para legalizar amplamente o aborto no Brasil, a pressão internacional pró-aborto se concentra no maior país da América do Sul. Em 3 de outubro, a relatora especial das Nações Unidas para a Saúde, Tlaleng Mofokeng, aproveitou sua posição de “czar” da saúde internacional para se manifestar no Twitter/X. "Espero que o tribunal faça a coisa certa: DESCRIMINALIZE o aborto agora", pede Mofokeng, em clara violação de seu mandato e das proteções internacionais de direitos humanos para a vida do nascituro.

A lei internacional protege firmemente a vida do nascituro, e os governos têm total autoridade para exercer sua soberania nacional restringindo ou proibindo o aborto. De fato, a maioria dos países coloca em prática essa prerrogativa com pesadas restrições ao aborto para proteger o nascituro. Contrariando a lei internacional, a relatora especial da ONU solicitou ao Brasil que suspendesse suas proteções à vida do nascituro "em conformidade com os padrões internacionais de direitos humanos" - uma distorção flagrante da realidade legal.

No momento em que a Suprema Corte do Brasil se debruça sobre essa questão crucial e altamente sensível, é imperativo que os fatos sejam esclarecidos - nenhuma norma internacional obriga os Estados a expandir o acesso ao aborto. Além disso, conforme consagrado na Convenção sobre os Direitos da Criança, "a criança, em razão de sua imaturidade física e mental, necessita de salvaguardas e cuidados especiais, inclusive proteção legal adequada, tanto antes quanto depois do nascimento".

Atualmente, está nas mãos do tribunal brasileiro o desafio de revisão constitucional apresentado pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). A contestação busca legalizar o aborto sob demanda até 12 semanas de idade gestacional, declarando inconstitucionais os artigos 124 e 126 do Código Penal. Em sua petição ao Supremo Tribunal Federal, o PSOL argumentou que a "imposição do parto compulsório compromete a dignidade da pessoa humana e a cidadania das mulheres". Atualmente, as crianças no útero são protegidas no Brasil, com exceção das disposições que permitem o aborto em casos de estupro, quando a vida da mãe está em perigo e para bebês anencéfalos.

Além do Código Penal, a lei civil brasileira garante a proteção dos nascituros. O artigo 2º do Código Civil do país afirma que "a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, mas a lei protege os direitos do nascituro desde a concepção". E a Constituição brasileira garante o direito à vida no artigo 5º.

Até o momento, a contestação constitucional tem sofrido grandes dificuldades, incluindo sérios problemas de transparência e falta de clareza processual. Por um lado, o processo foi apressado nas últimas semanas, com um alarmante desrespeito ao devido processo legal, impróprio para uma decisão dessa gravidade. Por outro lado, em 15 de setembro, a então presidente do STF, Rosa Weber, decidiu realizar uma audiência virtual e anunciar seu voto, apesar do fato de que mais tarde deixaria o cargo. Com razão, várias vozes se levantaram contra essas medidas, argumentando que um processo dessa magnitude deveria ter uma sustentação oral presencial.

No ano passado, em um julgamento extremamente claro, a Suprema Corte dos Estados Unidos afirmou que as determinações relativas ao aborto devem ser tratadas pelo processo democrático, e não impostas por decreto judicial. O caso Dobbs v. Jackson Women's Health reverteu quase cinquenta anos de extremismo em relação ao aborto sob Roe v. Wade. Com o caso Dobbs, o povo americano finalmente tem a autoridade para proteger a vida do nascituro - que lhe foi tirada ilegalmente pela decisão ativista de Roe.

Há uma lição importante a ser aprendida com a trajetória do aborto nos Estados Unidos. Que o Brasil não se precipite em remover salvaguardas cruciais para a vida do nascituro e, ao fazê-lo, desconsidere os milhões de brasileiros que esperam e rezam para que seu país continue valorizando toda a vida humana. A vida é um direito humano e, portanto, o Brasil tem a prerrogativa e o dever de manter sua lei nacional que protege a vida de crianças não nascidas. Agora não é o momento de abrir mão de suas proteções que salvam vidas, muito menos de permitir que um judiciário irresponsável o faça de maneira apressada e não transparente. Em vez disso, o governo do Brasil deve se concentrar nos desafios enfrentados por mães, crianças e famílias, especialmente aquelas em situação de pobreza, e se comprometer a atender a essas necessidades para que todos os bebês brasileiros possam ser recebidos com segurança no mundo.

Mais importante ainda, os brasileiros devem decidir pelo Brasil, rejeitando sem reservas a interferência internacional. É totalmente inadequado e contrário ao direito internacional que os funcionários da ONU (que sequer representam os Estados-membros da Organização) se intrometam nessas determinações. No entanto, esse é um padrão comprovado e verdadeiro de envolvimento por parte da ONU e de outros atores internacionais. É provável que por trás das postagens no Twitter e das declarações públicas também esteja uma enorme variedade de incentivos e punições, em uma tentativa de atrair e coagir o Brasil, indiscutivelmente o país mais influente da América do Sul, a reformular radicalmente sua lei do aborto. A burocracia da ONU tem se voltado para o Brasil há algum tempo, emitindo uma série de recomendações para que o país legalize o aborto. Essas recomendações não têm força de lei e devem ser vistas pelo que são: intervenções ilícitas em um assunto que reside diretamente na jurisdição soberana do país.

Uma decisão sobre o desafio constitucional é esperada a qualquer momento e, em meio a uma contínua falta de transparência, há motivos para temer que a pressão internacional possa levar o tribunal a abandonar as proteções pró-vida do país. Toda vida humana é digna de proteção, e a esperança é que o Brasil resista a essa pressão e preserve sua preciosa identidade nacional como um país que defende a vida.

Julio Pohl atua como consultor jurídico para a América Latina na ADF Internacional, que está fornecendo expertise em direitos humanos internacionais para advogados brasileiros que defendem o direito à vida no Supremo Tribunal Federal do Brasil. 

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]