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O presidente Lula em sessão solene do Congresso que promulgou a reforma tributária: 16% de seus eleitores estão descontentes, e 15% dos que votaram em Bolsonaro aprovam o petista.
O presidente Lula em sessão solene do Congresso que promulgou a reforma tributária.| Foto: André Borges/EFE

O primeiro ano do governo Lula 3 termina como previsto em muitos aspectos – infelizmente, já que, quando o petismo consegue fazer valer suas convicções, é praticamente certo que o Brasil sairá perdendo. Aquilo que não foi cumprido muito provavelmente não o foi simplesmente porque se tratava de promessas feitas para iludir aquela parcela da população que escolheu Lula em outubro do ano passado muito mais por aversão a seu adversário que por qualquer outro motivo, já que o candidato de 2022 não fez muita questão de esconder a que vinha.

A promessa de um governo que curasse as feridas causadas pela polarização política – inaugurada, aliás, por Lula e pelo PT muitos anos atrás – não durou praticamente nada. A “frente ampla” que ajudou a eleger o petista foi rapidamente descartada já durante a montagem do governo, restando alguns prêmios de consolação aos aliados de ocasião e pastas secundárias distribuídas em nome da montagem de uma base aliada no Congresso. De resto, Lula governou segundo a máxima atribuída ao argentino Juan Perón: “aos amigos, tudo; aos inimigos, nem mesmo a justiça”: antagonizou em todas as ocasiões possíveis a metade da nação que não o apoiou em 2022 e se empenhou no plano de vingança contra todos os que expuseram as falcatruas do petismo na Petrobras e levantaram o enorme conjunto probatório que ajudou a colocar Lula na prisão em 2018.

O Brasil de 2023 sob Lula é o país de um governo movido a ressentimento e a slogans vazios, cujo presidente, em vez de olhar para o futuro, se prende ao passado, seja na busca de vingança pessoal, seja na reciclagem de marcas fracassadas como o PAC

A omissão completa de seu ministro dos Direitos Humanos na defesa do devido processo legal, abolido no caso dos presos e réus do 8 de janeiro, é demonstração prática de que para Lula as garantias democráticas só valem para quem adere ao lulopetismo; os demais são “animais selvagens”, “gente que (...) tem de ser extirpada”, como Lula se referiu às pessoas que teriam hostilizado o ministro do STF Alexandre de Moraes em um aeroporto italiano, caso que até hoje está muito mal explicado. Aliás, o presidente deu sua colaboração para tornar o Supremo ainda mais liberticida ao nomear para a corte seu ministro da Justiça, Flávio Dino, usando a segunda indicação a que teve direito neste ano – com a primeira, recompensou seu advogado pessoal, Cristiano Zanin, por seu trabalho para tirar Lula da cadeia e fazer dele um ficha-limpa capaz de disputar e vencer a eleição presidencial.

Na política externa, Lula se empenhou em alinhar o Brasil ao que há de pior no mundo, seja pela omissão cúmplice disfarçada de “neutralidade”, seja pelo apoio descarado. As honras de Estado concedidas ao carniceiro Nicolás Maduro em Brasília certamente figurarão entre as cenas mais abjetas deste primeiro ano do terceiro mandato lulista. Assim como também desperta repulsa o recurso frequente à falsa equivalência moral para atenuar as atrocidades dos parceiros ideológicos do petismo, que vão do autocrata Vladimir Putin aos terroristas do Hamas. Ainda por cima, Lula viu o peso do Brasil nos Brics ser diminuído com a entrada de novos membros, que tornarão o bloco um apêndice da China, e falhou em conseguir levar adiante o acordo entre Mercosul e União Europeia, acordo este que ele desprezou por um bom tempo antes de despertar subitamente para sua importância.

É esse descalabro em tantas outras áreas que tem feito o trabalho do ministro Fernando Haddad, da Fazenda, ser ressaltado como exceção. No entanto, em qualquer país normal, uma política econômica expansionista, sem limites decentes à elevação do gasto público e que recorre única e exclusivamente ao aumento de impostos como forma de fechar as contas seria tratada como o que é: irresponsabilidade pura. Que Haddad esteja sendo saudado como a ilha de sensatez no Poder Executivo diz mais sobre a desqualificação do governo como um todo que sobre qualquer suposta racionalidade de suas políticas. Mesmo os bons indicadores não têm como ser atribuídos a Lula ou Haddad: o dólar se mantém perto dos R$ 5 devido ao bom desempenho das commodities – inclusive as do agronegócio, tão demonizado por Lula –, que trazem moeda estrangeira ao país, e a inflação voltou para o limite de tolerância da meta graças à política monetária do Banco Central, que Lula tanto criticou. Mas a incerteza fiscal já cobra seu preço, por exemplo, na queda do investimento estrangeiro direto nos primeiros nove meses deste ano – o segundo pior desempenho dos últimos 14 anos.

O Brasil de 2023 sob Lula, portanto, é o país de um governo movido a ressentimento e a slogans vazios – afinal, se “o Brasil voltou” a fazer algo, foi a paparicar ditadores mundo afora; e não pode haver “união e reconstrução” quando o governo se empenha em hostilizar metade do país e dinamitar a economia, e enquanto as liberdades democráticas continuam a ser erodidas. Um país cujo presidente, em vez de olhar para o futuro, se prende ao passado, seja na busca de vingança pessoal, seja na reciclagem de marcas fracassadas como o PAC. Felizmente, do outro lado houve alguns poucos atores institucionais pautados pela responsabilidade e milhões de brasileiros que seguiram empenhados em produzir, a despeito de todas as dificuldades a eles impostas. Que eles mantenham sua força em 2024.

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