• Carregando...
Para chegar ao valor de R$ 1,4 trilhão, a Uneafro multiplicou 30% do lucro líquido do banco em 2023 (R$ 10,68 bilhões) por 136 anos, tempo decorrido desde a abolição.
Para chegar ao valor de R$ 1,4 trilhão, a Uneafro multiplicou 30% do lucro líquido do banco em 2023 (R$ 10,68 bilhões) por 136 anos, tempo decorrido desde a abolição.| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

A Uneafro Brasil, organização ligada ao movimento negro, enviou um relatório ao Ministério Público Federal (MPF) propondo a inclusão de alguns pontos na ação movida pelo MPF contra o Banco do Brasil por suposto envolvimento da instituição com o tráfico de escravos no século 19.

Entre os tópicos, a Uneafro propõe que o banco crie um fundo de R$ 1,4 trilhão destinado à reparação histórica da população negra.

O Banco do Brasil foi notificado pelo MPF sobre a ação inédita em setembro do ano passado. Para justificar a ação, os proponentes relatam, por exemplo, que o banco tinha entre seus acionistas e fundadores o negociante de escravos José Bernardino de Sá, acusado pelos historiadores de ter sido um dos maiores contrabandistas de africanos na época.

“Não há democracia em um país que não olhe para trás, reconheça seus erros e repare todos que ainda são atingidos pelas barbaridades cometidas no passado. A história do Brasil é a história da escravização. E as sequelas desse período respingam em toda a população, principalmente naqueles que descendem daqueles que foram sequestrados no continente africano”, diz um trecho do relatório da Uneafro enviado ao MPF.

Para chegar ao valor de R$ 1,4 trilhão, a Uneafro multiplicou 30% do lucro líquido do banco em 2023 (R$ 10,68 bilhões) por 136 anos, tempo decorrido desde a abolição.

Além do fundo, a Uneafro pede que se “estabeleça um prazo máximo de 20 anos para as transferências desses valores aos fundos de reparação” e que os fundos “sejam geridos em regime compartilhado pelo próprio Banco do Brasil, pelo MPF, pelo Governo Federal e pela sociedade civil através de organizações negras de notório reconhecimento, com garantia de auditoria externa independente e total transparência em suas operações”.

A Uneafro também pede que os recursos sejam utilizados para atender 6 eixos: quilombos; educação; territórios; famílias negras em risco; fomento à religiosidade e cultura africana e afro-brasileira; e desenvolvimento econômico da população negra.

O pedido da Uneafro foi confirmado à Gazeta do Povo pelo Ministério Público Federal (MPF). O jornal também entrou em contato com a Uneafro, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria.

De acordo com o site da organização, “a Uneafro Brasil foi fundada em 2009, a partir da experiência acumulada durante 12 anos por seus fundadores em outras organizações como movimento estudantil, MST, partidos políticos de esquerda, Movimento de Cursinhos Comunitários, Movimento Negro e Movimento Sindical”.

Procurado pela Gazeta do Povo, o Banco do Brasil disse que “se mantém aberto ao debate com a sociedade brasileira” e que “integra o grupo de trabalho coordenado pelo Ministério da Igualdade Racial para implementar iniciativas de combate ao racismo".

O banco também enviou ao jornal uma “carta aberta” direcionada aos movimentos negros em que pede “perdão ao povo negro pelas suas versões predecessoras” e diz que “toda a sociedade brasileira deveria pedir desculpas ao povo negro por aquele momento triste da nossa história (a escravidão)”.

Confira a íntegra da carta do Banco do Brasil

Carta aberta do BB aos movimentos negros

 Momentos como este, em que lideranças negras das mais diversas origens e campos sociais reúnem-se em torno do debate sobre temas ligados à escravidão e suas consequências, demonstram o quão urgente precisamos avançar no combate ao racismo estrutural de nossa sociedade.

As sequelas de um processo histórico perverso, que atingiu as comunidades negras e seus descendentes, ainda esperam novas medidas estruturais de todas as esferas sociais que tenham a capacidade de enfrentar e transformar esse triste cenário.

Direta ou indiretamente, toda a sociedade brasileira deveria pedir desculpas ao povo negro por aquele momento triste da nossa história. Neste contexto, o Banco do Brasil de hoje pede perdão ao povo negro pelas suas versões predecessoras e trabalha intensamente para enfrentar o racismo estrutural no país.

O BB não se furta a aprofundar o conhecimento e encarar a real história das versões anteriores da empresa. Mas o que define nosso compromisso com o combate à desigualdade étnico-racial é o fato de ser uma instituição da atualidade, que, como as demais instituições públicas e privadas, tem o dever de desenvolver ações no âmbito de uma sociedade que guarda sequelas da escravidão.

Estamos aqui porque queremos colocar o Banco do Brasil, de forma permanente, nesse processo de conscientização da sociedade brasileira pela causa da igualdade racial.

Nosso compromisso é, e continuará sendo, o de implementar medidas que promovam uma nova realidade para as comunidades negras. Governos, partidos, empresas, associações de classe e demais atores sociais precisam fazer ainda mais nessa articulação que responda a um anseio uníssono por um país melhor.

Somos uma instituição que já passou por diversas organizações e composições societárias. Como sistema empresarial, já ressurgimos algumas vezes ao longo da história do nosso país. Ao longo do tempo, fomos evoluindo nas medidas de combate ao racismo estrutural, culminando neste ano com a atuação ainda mais intensa com práticas de estímulo à igualdade racial com maior efetividade.

Avançamos. Temos buscado parcerias que potencializem nossa atuação. Ressaltamos a parceria com o Ministério da Igualdade Racial com quem, em julho deste ano, celebramos protocolo de intenções para combate e superação do racismo e promoção da diversidade e equidade, com diretrizes para ampliar ações afirmativas de raça e gênero.

Também em julho deste ano, renovamos a parceria, iniciada em 2018, com a Universidade Zumbi dos Palmares, aderindo à Carta da Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial, movimento formado por empresas comprometidas com a promoção da inclusão racial e a superação do racismo no ambiente corporativo.

Em agosto, o BB tornou-se embaixador de movimentos do Pacto Global da ONU no Brasil, relacionados à igualdade social, a gênero e a trabalho decente, com destaque para o movimento “Raça é Prioridade”, num chamamento de diversos interlocutores para debates e avanços nestas áreas.

Além disso, o BB lançou novos compromissos públicos em seu planejamento de sustentabilidade. Dentre eles, destaque para um avanço na meta de chegar, até 2025, a, pelo menos, 30% de pretos, pardos, indígenas e outras etnias sub-representadas em cargos de liderança.

O BB tem promovido eventos sobre diversidade, dentre eles Conselhos Consultivos, que reúnem representantes do Banco e especialistas da sociedade civil, para abordar temas sobre raça e etnias, gênero, gerações, LGBTQIAPN+, pessoas com deficiência e neurodivergências. Conforme agenda aprovada no primeiro semestre, neste exato momento, o Conselho está reunido em Salvador debatendo o tema raça e etnias.

E um marco histórico neste contexto: no início de 2023, houve a posse da primeira mulher negra como presidenta do BB, Tarciana Medeiros, que nomeou 3 mulheres para as vice-presidências de Varejo, Negócios Digitais e Corporativa. Pela primeira vez na história, temos no Conselho Diretor 45% de mulheres, 22% de pessoas autodeclaradas negras e dois membros autodeclarados do grupo LGBTQIAPN+.

Nosso Conselho de Administração está entre os mais diversos do mercado, com posição destacada no índice IDiversa na Bolsa de Valores (B3), por atuar como referência em diversidade em nossa sociedade contemporânea.

Consideramos que esses avanços são conquistas que contribuem nas mudanças estruturais necessárias no combate efetivo à discriminação.

O Banco do Brasil avalia que o combate ao racismo estrutural requer agir sempre, somar esforços e adotar novas iniciativas. Nesse sentido, o BB anunciou novas medidas em prol da igualdade de raça:

Passamos a exigir que nossos fornecedores adotem políticas de estímulo à diversidade, equidade e inclusão.

A disponibilização de 150 vagas para o curso de Certificado de Estudos Afro-Latino-Americanos em parceria com o Ministério da Igualdade Racial.

Edital para promover e financiar o empreendedorismo de mulheres negras em diversos setores da economia por meio da Fundação Banco do Brasil.

E, pela primeira vez, lançamos um programa exclusivo para a promoção de pessoas negras em cargos de alta liderança na empresa. É uma medida para garantir o acesso de todos aos maiores níveis hierárquicos da organização.

Para que toda a sociedade tome conhecimento do conjunto de iniciativas em andamento no BB, disponibilizamos uma página em nosso site: bb.com.br/diversidade

A nossa atuação concilia objetivos comerciais e compromisso com políticas públicas. Coloca o BB em posição importante no sistema financeiro como empresa que disponibiliza empréstimos em linhas para pessoas menos favorecidas economicamente e contribui para que a renda circule pela base de nossa pirâmide social. Ainda existe muito a ser feito pela melhoria da qualidade de vida das pessoas, mas é concreto o empenho do BB nesse sentido.

Assim como hoje, nesta audiência, esperamos sempre contribuir para o debate e enxergamos o espaço como oportunidade de colocarmos nosso posicionamento sobre o assunto. Nossa presença aqui, além de simbolizar uma disposição ao diálogo, também significa a consciência de que precisamos ampliar a discussão sobre medidas de combate ao racismo e promoção da igualdade para toda a sociedade brasileira. É uma demonstração da disposição de implementar iniciativas que melhorem a qualidade de vida dos brasileiros, independente de raça, etnia ou grupo social.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]