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Lula e Dino
Quatro ministros do governo de Lula foram exonerados “a pedido” para voltarem ao Senado e participarem da votação da sabatina.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

“Pela primeira vez na história desse país nós conseguimos colocar na Suprema Corte desse país um ministro comunista, um companheiro da qualidade do Flávio Dino”, disse Lula comemorando a aprovação de seu indicado ao STF durante a última Conferência Nacional da Juventude do Partido dos Trabalhadores. A declaração serviu para incendiar as redes sociais, gerando enorme comoção, principalmente entre o público suscetível às conspiracionices. “Viu só! Todos sabíamos”, certamente disse o cidadão encaminhando a o vídeo do presidente a todos os integrantes de seus grupos no zap profundo. Por certo alguém dirá que a Justiça brasileira agora se vergará aos interesses do Foro de São Paulo, e que o processo de venezuelização tornou-se irreversível.

O tom de Lula não deixa margem para dúvida. Estava fazendo galhofa com bolsonaristas. Ainda assim, foi pouco prudente. Forneceu munição aos adversários, colocou um alvo em Dino e provocou um debate ideológico estéril, mesmo que limitado a uma bolha que só reverbera pela estridência. No mundo real trata-se de um não assunto, como é de costume uma indicação ao STF, seja de que presidente for. As preocupações objetivas da população são outras, e tratam de temas menos dogmáticos e mais práticos.

Dino, é verdade, foi filiado ao Partido Comunista do Brasil, mas isso é insuficiente para defini-lo como um militante ativo das teses de Karl Marx.

Ainda assim, é impossível fugir à polêmica. Dino tem inequívoca formação de esquerda, mas está longe de ser comunista. A sabatina a que foi submetido no Senado Federal, aquela em que passou sobre parte da oposição como um verdadeiro Godzilla, foi reveladora de uma postura bastante conservadora do ponto de vista da aplicação do direito. Voltou a defender que o aborto é matéria de competência legislativa, como já havia adiantado no podcast Recoversa, do jornalista Reinaldo Azevedo. Também ressaltou a importância da autocontenção do ativismo judicial dizendo que “não há terceira Casa do Congresso” e chegou a defender as restrições aos poderes monocráticos de ministros do STF.

Dino, é verdade, foi filiado ao Partido Comunista do Brasil, mas isso é insuficiente para defini-lo como um militante ativo das teses de Karl Marx. Do contrário, teríamos de considerar Valdemar da Costa Neto um discípulo de John Locke apenas por ele ser o presidente do Partido Liberal. Para além da teoria, na prática também não há qualquer vínculo ideológico além da retórica de defesa da “justiça social”. Certo que é que defender “justiça social” não significa defender ditadura do proletariado.

Devoto de São Francisco, Dino foi responsável pela aprovação da Reforma da Previdência no Maranhão, aumentando a contribuição descontada em folha de 11 para 14%, podendo chegar até a 22% a depender da categoria. Para tanto, contou com votos do PSL e do DEM. No mesmo ano também aprovou a privatização da Companhia Maranhense de Gás (Gasmar), vendendo o controle da distribuidora que correspondia a 51% de participação. É o primeiro caso de comunista crente e privatista da história.

Para além disso, vale lembrar que o primeiro comunista no STF (e esse sim com formação), foi Eros Grau. Um magistrado, aliás, que reiteradas vezes demonstrou em seus votos enorme equidistância entre sua eventual visão de mundo e a aplicação do direito. “Mas Lula disse que Dino é comunista e pronto”, objetará alguém. Continuará sendo um chiste que só repercute como “pauta” porque o debate público brasileiro foi emporcalhado por arrivistas dispostos a faturar fabricando polêmicas.

Conteúdo editado por:Jocelaine Santos
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