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Aeroporto Carlos Prates é usado para aulas de aviação e serviços, mas governo municipal quer transformar a área do aeroporto em casas populares.
Aeroporto Carlos Prates é usado para aulas de aviação e serviços, mas governo municipal quer transformar a área do aeroporto em casas populares. Moradores contestam medida.| Foto: Arquivo Estevan Velásques/Voa Prates

Belo Horizonte vive mais um conturbado capítulo da discussão acerca do fechamento do Aeroporto Carlos Prates. Inaugurado em 1944, o quase octogenário aeroporto, que era majoritariamente usado pelas forças de segurança pública e para formação de pilotos, foi desativado em março deste ano.

A área, que foi administrada pela Infraero por quatro décadas, agora é pleiteada pela prefeitura de Belo Horizonte, que pretende construir um novo bairro no local, com pelo menos 2 mil casas populares e equipamentos públicos. As negociações com o governo federal, que controla o aeroporto por meio da Infraero, estão avançadas. Uma cerimônia para a oficialização da cessão da área do aeroporto para o município estava prevista dentro da agenda externa do presidente Lula (PT), nesta semana. A visita de Lula a Belo Horizonte foi adiada por motivo de saúde do presidente.

Porém, há setores da sociedade, incluindo moradores do bairro Carlos Prates, onde fica localizado o aeroporto, contrários à proposta e que defendem o retorno do funcionamento do aeroporto. Carla Brito, que nasceu e morou quase toda a vida na região, é uma dessas pessoas. Como ex-moradora e frequentadora do bairro, já que até hoje vários familiares vivem nas proximidades do Aeroporto Carlos Prates, ela menciona que a ideia de construir um loteamento habitacional no local do aeroporto impactaria a vida de toda a região noroeste da capital mineira.

“Os moradores começaram a se juntar porque, até agora, a prefeitura não nos procurou. Se você atrapalha o trânsito no aeroporto (Carlos Prates), isso atrapalha até na Pampulha. Todas as nossas tentativas, de todas as pessoas, foram frustradas porque ninguém nunca quis ouvir a população”, critica ela.

A região metropolitana de Belo Horizonte possui três aeroportos: o maior deles, Confins, mais usado para voos comerciais de grande porte, sendo também o maior aeroporto de todo o estado. O aeroporto da Pampulha era, até o fechamento do Carlos Prates, o principal aeroporto da região para voos executivos e táxis aéreos. O aeroporto Carlos Prates vinha sendo usado especialmente para cursos de pilotagem e para uso das da polícia militar e dos bombeiros. O discurso pelo fechamento do aeroporto ganhou força em março deste ano, após um acidente envolvendo um Cessna 182, no qual morreram duas pessoas.

Apesar dos acidentes, pessoas ligadas à aviação enfatizam a importância do aeroporto e defendem a manutenção das atividades. Segundo o piloto Pedro Botelho, que voa desde 2014 e trabalha na aviação comercial, o aeroporto Carlos Prates teve importância fundamental na formação dele. “Qualquer piloto que queira voar tem que ir para uma escola de aviação e fazer as horas de voo. E os pilotos buscavam o Carlos Prates, pois as outras opções seriam o aeroporto da Pampulha, que tem pouquíssimas escolas de aviação, ou aeroportos mais distantes como Pará de Minas e Lavras”, afirma ele, que lamenta a situação.

Botelho avalia não fazer sentido dizer que o Aeroporto Carlos Prates não é seguro. “O Carlos Prates é certificado e homologado, e aviação é uma área de níveis altíssimos de padronização de segurança no mundo todo, pois os danos têm proporções catastróficas”.

Ainda sobre a questão de segurança, o vereador Braulio Lara (Novo), presidente da Comissão de Mobilidade Urbana, Indústria, Comércio e Serviços da Câmara Municipal de Belo Horizonte, é categórico: “isso é uma falácia, porque quando você pega as estatísticas de acidente, o aeroporto Carlos Prates tem muito menos incidentes e acidentes do que o aeroporto da Pampulha e, proporcionalmente, é um aeroporto muito mais movimentado”, afirma. Para que o projeto da prefeitura não avance, o vereador propôs um projeto de lei que tem como objetivo classificar a área onde hoje está o Carlos Prates como uma área de grandes equipamentos econômicos.

Questionado sobre a questão das casas populares, o vereador concorda que Belo Horizonte precisa de políticas habitacionais, mas avalia que o aeroporto não será uma "tábua da salvação". De acordo com ele, o assunto não era pautado dessa forma antes de março. "As políticas habitacionais estavam indo para a urbanização de vilas e favelas e áreas distribuídas por toda a cidade. E não colocando como se dependesse do Carlos Prates para atingir o objetivo”, afirma Lara, que anexou ao projeto de lei um abaixo-assinado que conta com mais de 15 mil assinaturas.

O vereador diz que os moradores têm uma percepção dos problemas que seriam causados a partir da mudança do perfil da região e, também, sobre a importância econômica do aeroporto. “A população está percebendo a importância de termos um equipamento econômico tão importante que gera empregos, que tem desenvolvimento tecnológico, que é base de operação para as frotas de segurança e combate a incêndios”.

De acordo com o vereador, o projeto possui votos suficientes para ser aprovado. Mas esse seria apenas um passo para garantir que o aeroporto retome as atividades. A preocupação com a manutenção do aeroporto mobilizou pessoas ligadas ao Carlos Prates, formando uma associação, a Voa Prates.

Estevan Velásques, presidente e um dos fundadores da associação que representa pilotos, mecânicos, instrutores de voo e cerca de 500 profissionais cujo trabalho depende do aeroporto, defende que o Carlos Prates é indispensável para a capital mineira. “Os três aeroportos de Belo Horizonte são um ecossistema que se completam. Confins é aviação regional, comercial e pronto. Pampulha é aviação executiva de alto nível. E o Carlos Prates, que é um aeroporto de serviço."

Velásques, que é piloto e proprietário de uma escola de pilotagem que até março operava no Carlos Prates, é um dos grandes defensores do trabalho voltado à formação, instrução e treinamento de pilotos, tanto civis quanto militares, no local. Por ano, cerca de mil alunos passavam pelas escolas baseadas no Prates. "Se não tiver formação, como você vai ter piloto? Se não tiver manutenção, como tem avião voando? BH só tem uma escola, a minha, que está sobrevivendo na Pampulha. Se eu não conseguir ficar aqui, (os alunos) vão ter que ir pro interior, para São Paulo ou Rio", afirma.

Velasques afirma que, apesar de uma aeronave de instrução ser muito mais barata que jatos e aviões comerciais, o custo de manutenção é alto e isso se reflete nos preços das aulas, assim, muitos alunos que vem da graduação em ciências aeronáuticas recorrem a financiamentos estudantis para conseguir custear suas aulas de voo. Sair da cidade é um custo a mais, que pode atrasar a entrada de novos profissionais no mercado.

Aeroporto Carlos Prates chegou a ter fábrica de pequenos aviões

A ideia de construir um novo aeroporto em Belo Horizonte nasceu em 1938. Na época, o aeroporto da Pampulha abrigava o Aeroclube de Minas Gerais, que era responsável pela formação de pilotos civis e militares. O coronel Alípio de Melo doou a área – que era parte de uma fazenda da família dele – para o Aeroclube, para que ali fosse construído um espaço destinado a formação dos pilotos.

Os hangares, que estão até hoje no local, foram construídos em madeira, utilizando uma tecnologia francesa e, inicialmente, foram administrado num formato de condomínio pelo aeroclube e as outras escolas e empresas que ali se instalaram. A chegada da Infraero trouxe diversas burocracias que não condiziam com a realidade do aeroporto.

A área do aeroporto ultrapassa os 500 hectares e chegou a ter até uma fábrica de pequenos aviões instalada lá – a Aero Bravo –, além de cinco oficinas de manutenção e mais de 300 aviões estacionados no espaço. Durante os quatro anos de gestão da Infraero, além da fábrica ter saído do local, três oficinas e vários proprietários de aviões buscaram outros estados, fugindo da burocracia que a gestão federal trouxe para quem era usuário frequente do aeroporto.

Novo capítulo sobre destino do Aeroporto Carlos Prates virá em outubro

Dia 3 de outubro pode ser um novo marco na história do Aeroporto Carlos Prates, com uma reunião em Brasília para retomar as conversas sobre o fechamento. O encontro foi agendado pelo novo ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, após reunião com os deputados federais Lafayette de Andrada (Republicanos) e Gilberto Abramo (Republicanos) e com o vereador Fernando Luiz (PSD), que defendem a manutenção das atividades do aeroporto. Velásques também esteve presente na última reunião. Manifestaram apoio à permanência do aeroporto 23 vereadores, 55 deputados estaduais e 38 deputados federais.

Braulio Lara afirma que "será um importante avanço no diálogo com a Prefeitura de Belo Horizonte, que tem informado que a decisão de fechamento foi do governo federal". O parlamentar destaca ainda que "o Aeroporto Carlos Prates cumpre um importante papel ao desenvolvimento econômico de Belo Horizonte e o fechamento desse equipamento de 80 anos será um erro histórico irreparável". Dias antes da notícia do agendamento dessa reunião, Lara havia dito nas redes sociais que o prefeito de Belo Horizonte, Fuad Noman (PSD), seria reconhecido como “o prefeito que fechou um aeroporto de 80 anos”, se mantivesse a decisão.

Em 5 de setembro, no Aeroporto da Pampulha, uma pista foi fechada após um incidente envolvendo um avião Phenom 300, que teve um pneu estourado no momento da decolagem. Apesar de nenhum dos tripulantes ter sofrido ferimentos, o episódio impactou diretamente voos de serviço que agora operam na Pampulha.

No último dia 18, o Instituto Datatempo divulgou uma pesquisa apontando que 41,5% dos moradores da capital mineira aprovam o fechamento do aeroporto, contra 23,8% que demonstraram insatisfação com a medida. O vereador Bráulio Lara contesta os números e argumenta que muitos moradores da região o procuraram alegando que não teriam sido entrevistados. Segundo ele, a população segue mobilizada pela permanência do aeroporto.

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