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Edney Silvestre durante a cobertura dos atentados contra o World Trade Center, em 11 de setembro de 2001: tragédia ao vivo | TV Globo/Divulgação
Edney Silvestre durante a cobertura dos atentados contra o World Trade Center, em 11 de setembro de 2001: tragédia ao vivo| Foto: TV Globo/Divulgação

São Paulo - Edney, embora Silvestre, é um repórter que prefere sair a campo em missões, podemos dizer, menos selvagens. Gosta mesmo é de ter descoberto, no interior do Ceará, um professor de balé cujo ofício transforma filhos de pescadores em bailarinos. Na semana passada, tendo de subir o morro do Borel, no Rio de Janeiro, foi identificado por um menino: "Olha o Caco Barcelos!". Ao que respondeu, contrariado: "Não, meu filho, o Caco é o de olho azul".

Apesar desse seu gosto pessoal, a cobertura de abacaxis é uma das especialidades do cardápio jornalístico de Edney Silvestre, 55 anos, na Globo desde meados dos anos 1980. Vangloria-se, por exemplo, de ter sido um dos primeiros repórteres do Brasil a chegar ao World Trade Center em 11 de setembro de 2001. Não é um desembarque na Normandia, mas de qualquer modo lá estava o Edney.

Com um pouco de boa vontade (talvez muita), seu cabelo lembra o Wolverine do cinema. Assim ele surgiu em reportagens na região serrana do Rio de Ja­­neiro durante a cobertura da tragédia das chuvas. Experiente ("eufemismo para velho", diz), ficou chocado com o que viu. Deu-se conta do horror ao subir numa montanha de lama e escombros, em Nova Friburgo, e perceber que "caminhava sobre dezenas de cadáveres". Pela primeira vez em vários meses, interrompeu a escrita de seu novo romance, A Felicidade é Fácil, que vinha ganhando pelo menos um parágrafo por dia, ainda que obrado num saguão de aeroporto. Em Nova Friburgo "não tinha como entrar no personagem". "Há coisas inimagináveis acontecendo ali, como as cenas dos pais com seus filhos mortos no colo, inchados por causa do afogamento", relata. "Um comandante dos Bombeiros me falou, em off [sob condição de anonimato], que deve haver cerca de mil mortos só em Nova Friburgo. No final, acho que as notícias serão ainda piores."

Edney é hoje essa figura dicotômica: ao mesmo tempo em que chafurda a lama em suas reportagens, esquiva-se para redigir um paragrafinho que seja de seu novo livro, ambientado em São Paulo no início dos anos 90. Está no nono capítulo, planeja ao menos outros seis. Entrega o original à editora Record em junho e espera vê-lo nas livrarias em outubro – mesmas datas em que lançou o sortudo Se Eu Fechar os Olhos Agora (Record). Vencedor no ano passado dos Prêmios São Paulo de Literatura, categoria estreante, e Jabuti de melhor romance, o livro será traduzido em cinco países até 2012 – França, Alemanha, Holanda, Sérvia e Portugal.

Se o Edney Silvestre fechar os olhos, vai achar que está sonhando. Ainda mais depois de ter abandonado um romance em gestação e desistido de outro, recusado por um editor. Tendo posto a mão numa bufunfa considerável – R$ 200 mil pelo Prêmio São Paulo e R$ 3 mil pelo Jabuti –, tratou de reinvestir o dinheiro. Transformou um quarto de hóspedes em escritório, comprou um Macintosh do qual passou a apanhar rotineiramente, refez o assoalho de seu apartamento no Leblon. Sua estreia rendeu, ainda, uma polêmica com relação ao Jabuti – que premiou como livro do ano Leite Derramado, de Chico Buarque, segundo colocado na categoria em que Edney saiu vencedor. Edney nunca cruzou o Chico no Leblon, porque, enquanto ele caminha na areia, Chico prefere o calçadão. Só leu um livro dele, Estorvo, de 1991. Achou "confuso" – um estorvo.

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