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Filme reconstrói o cenário do início dos anos 1980 para tratar o conhecimento escasso da medicina sobre a síndrome de Down. | Rosano Mauro Jr./Divulgação
Filme reconstrói o cenário do início dos anos 1980 para tratar o conhecimento escasso da medicina sobre a síndrome de Down.| Foto: Rosano Mauro Jr./Divulgação

Adaptação do livro homônimo de Cristovão Tezza que ganhou um Jabuti em 2008, “O Filho Eterno” é um filme que evidencia os desafios e frustações de um pai de primeira viagem. Programado para estrear no dia 1°. de dezembro, a produção tem o comediante Marcos Veras interpretando o protagonista Roberto, alter ego ficcional do autor. (Veja o trailer)

O longa é um recorte da complexa relação do escritor com o filho, esmiuçada nas 224 páginas da obra original. No filme, a narrativa se concentra no conflito de um pai em aceitar e amar o primogênito, diagnosticado com Down logo após o nascimento, e nos desafios diários de se manter uma família (leia uma entrevista com o escritor abaixo).

“O filme fala de um pai que projeta todas as expectativas de mudança de vida no nascimento do filho. E quando o filho nasce é uma grande decepção”, explica o diretor Paulo Machline à Gazeta do Povo.

Obra original

“O Filho Eterno” foi publicado em 2007. O escritor catarinense radicado em Curitiba ganhou o Prêmio Jabuti de Literatura em 2008 pela obra na categoria romance . É uma autobiografia ficcional, contada em terceira pessoa, que exprime de modo corajoso a relação entre um pai inexperiente e um filho com síndrome de Down. O livro também fala da trajetória de Cristovão Tezza como escritor.

Para Marcos Veras, o filme “é, sobretudo, uma história de paternidade, que poderia ser contada da mesma forma se a criança não tivesse alguma deficiência”.

Em seu primeiro papel dramático para o grande público, o ator diz que a oportunidade do filme veio na hora certa e que é “um cara de sorte”.

“Não fiz teste de elenco. Contudo, este trabalho foi desafiador pela proposta sensível e pela complexidade desse personagem”, explica.

Débora Falabella e Marcos Veras vieram a Curitiba para o lançamento do filme no dia 19.Daniel Castellano/Gazeta do Povo

1982

No processo de reconstruir o ano de 1982, a trama foi gravada quase toda em Curitiba. Os curitibanos vão identificar, por exemplo, o tradicional bar Ao Distinto Cavalheiro.

“Utilizamos instalações que contribuíram para recriar esse universo antigo, porque a época que queremos passar é uma referência temporal também do escasso conhecimento da medicina sobre o assunto”, disse o diretor.

Ele explicou que em 1982 havia muita desinformação sobre a alteração genética – então chamada de mongolismo –, e tratamentos experimentais eram constantemente realizados com o intuito de reverter a síndrome.

Adaptação

Quem leu o livro vai notar uma grande diferença no filme. Para tornar a história “universal”, o roteirista Leonardo Levis transformou a paixão do filho pelo Atlético Paranaense retratada no livro pelos jogos da seleção brasileira na Copa do Mundo.

As copas de 1982, 1986 e 1990, por sinal, marcam a mudança da relação entre pai e filho.

Outra mudança foi dar voz à mãe, que tem uma presença inexpressiva no livro. A personagem Claudia, interpretada por Débora Falabella, se contrapõe ao protagonista.

“A Claudia é uma personagem que se faz presente não pelas palavras. Ela é a figura da mãe de verdade”, diz a atriz.

“O Filho Eterno” é um livro muito difícil para ser adaptado, diz Cristovão Tezza

Hugo Harada/Gaezta do Povo

O autor de “O Filho Eterno” falou, por email, à Gazeta do Povo sobre o livro. Leia a entrevista:

Assim que anunciaram que o livro ganhou o prêmio Jabuti, o senhor disse em uma entrevista que até gostaria que uma de suas obras virasse filme, mas que seria muito difícil de acontecer. O processo para a produção deste filme foi mais fácil que o senhor imaginava?

Literatura e cinema são artes bastante próximas, e sofrem influência recíproca. Meus livros, particularmente, são muito “visuais” – costumo dizer que só escrevo o que posso “ver”. Assim, naturalmente, me agrada a ideia de vê-los adaptados, para cinema ou teatro. Eu dizia que é difícil de acontecer porque o cinema é uma arte muito cara, de produção complexa e difícil, ainda mais no Brasil. Bem, “O Filho Eterno” foi vendido para a RT Features em 2010 — foram seis anos de espera. A filmagem mesmo foi rápida, mas a preparação da produção é um processo lento.

Por se tratar de uma adaptação, muitas histórias do livro ficaram de fora do filme. O que você acha das escolhas do diretor e do roteirista para contar a sua história?

“O Filho Eterno” é um livro muito difícil para ser adaptado, porque ele é mais reflexivo que narrativo – o livro inteiro se passa na cabeça do narrador, e extrair uma narrativa daí não é uma tarefa fácil. Eu gostei das opções do roteiro – era mesmo preciso criar a personagem da mãe (que está quase ausente no livro, por tratar fundamentalmente da relação pai e filho) e estabelecer uma moldura narrativa mais “visível”. A escolha das copas do mundo, pegando o mote do futebol, foi uma boa solução. O filme centrou-se no drama familiar – todas as passagens sobre a percepção da história brasileira, dos anos 80 até nossos dias, assim como o passado do pai, acabaram ficando de fora, mas era preciso mesmo um recorte. Outra coisa que eu gostei foi o foco na crise paterna, e não propriamente na criança, como uma curiosidade especial (que é sempre um risco, por cair no piegas ou no excesso sentimental).

O senhor gosta de adaptações de livros para o cinema? O que uma história perde ou ganha quando é reproduzida na grande tela?

Gosto muito de filmes derivados de livros – é sempre uma atração especial para mim, que sou apaixonado pela literatura. Não para “brigar” com a adaptação, mas para pensar nas possibilidades de passagem de uma linguagem a outra. É preciso mudar o foco quando se vê um filme adaptado – quem procura ver fielmente o livro na tela sempre sairá frustrado, porque as linguagens são substancialmente distintas. O que me interessa é a leitura que o diretor e o roteiro fazem, que aspecto central do livro foi captado para se transformar em imagem. Um filme sempre perde a dimensão estritamente literária de uma obra, mas ganha outra dimensão narrativa, potencializando ideias ou conceitos e colocando-as à luz da imagem, por assim dizer.

De que forma escrever este livro, e agora vê-lo nos cinemas, alterou a relação entre o senhor e seu filho?

Não alterou nada. Apenas acrescentou uma boa alegria.

Como ele recebe isso?

O Felipe não tem a abstração da leitura — para ele, o livro é uma espécie de talismã pessoal. Frequentemente ele diz aos amigos: “O Filho Eterno” sou eu!

Por qual motivo o senhor não quis ver o roteiro?

A literatura já me consome o suficiente. Acho que, ao ceder o direitos sobre o livro, o autor passa ao diretor do filme o monopólio da leitura, digamos assim. Um filme é obra de um diretor, do seu olhar, e isso deve ser respeitado. Quanto ao roteiro, é um técnica que eu não conheço e não domino – e sei o quanto ela é fundamental para um bom filme.

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