Palavras perigosas

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–Mãe, porque o pipi do pai é pra fora e o teu é pra dentro?

– Ora, filha, porque homem é assim e assim é mulher.

– Eu queria ser que nem o pai, mãe, pra fazer pipi em pé.

A mãe pensa ensaboando a menina.

– Pois é, filha, mas homem também tem aquele saco pendurado... e qualquer pancada ali dóóóóiiii!

A filha pensa enquanto a mãe enxágua.

– Pra que serve aquilo, mãe?

– Pergunta pro teu pai, filha.

– Eu perguntei, ele disse pra perguntar pra você.

A mãe agacha para enxugar a menina.

– Bem, filha, então vou te explicar tudo. O pipi do papai é pra fora porque é como a pá que a mamãe usa pra plantar flor nos vasos. E o pipi da mamãe é pra dentro porque é como um vaso, onde o papai enfia a pá pra plantar sementinha. Aquele saco dele é a fábrica de sementinhas, e você é a flor que nasceu!

A menina corrige séria: – Planta não nasce, mãe, planta ger-mi-na!

– Claro, filha, parece que a escolinha está valendo cada tostão, né. E claro que você vai me perguntar o que é tostão...

– Não, mãe, isso eu sei, o vô vive falando. Mas o que é tosto-terona?

A mãe para de pentear a filha.

– Onde você ouviu isso, menina?!

– Na tevê, mãe, e o pai prestou tanta atenção!

– Pois é, isso é a sementinha do pai. É o sêmen, tá, e pronto, você está linda!

– Mas porque dão tanto nome pra essa sementinha, mãe?

– Ah, filha, pergunta pro teu pai.

A menina vai procurar o pai, a mãe rala cenoura na pia.

– Pai, porque a tototerona, a tua sementinha e o tal sêmen têm tanto nome se são a mesma coisa?

O pai até desliga a tevê.

– Mas porque você quer saber isso, filha?

– Pra ficar igual o Noca, pai, ele sabe tanto nome! Ele diz que pipi pode ser pau, pica, piroca, vara e mais um monte de nomes, mas porque tanto nome?

– Você e o Noca falam disso, filha?!

– É, pai, o Noca é campeão das palavras. Xoxota pode ser...

– Deixa pra lá, filha! – a mãe quase grita, o pai lhe sussurra:

– Eu te falei! Essa escolinha não será avançada demais?

A mãe masca o toco da cenoura, o pai pergunta que mais o Noca falou: xoxota, por exemplo, pode ser...?

– Ih, pai, tanta coisa. Aranha, né, que nem no "Rock das Aranhas"...

– Vocês ouvem isso na escolinha?!

– Não, pai, ouvi no teu MP3, e o Noca falou que aranha é o mesmo que...

– Boceta?!

– Não, pai, isso é bolsinha de couro de guardar fumo.

O pai se benze – Aleluia! – e a filha emenda:

– E aranha é o mesmo que gruta de Vênus.

– Que chique! – a mãe tempera a salada.

– E a vara de Adônis – a filha mordisca azeitona – um dia entra na gruta de Vênus.

O pai e a mãe se olham, a mãe olha nos olhos da menina:

– Filha, enquanto eu não conversar com tua professora, melhor você esquecer esse... esse mundo das palavras, tá?

– Mas você mesma falou que é bom aprender palavras, mãe!

– Mas não todas, filha, certas palavras são... são perigosas!

A menina olha desconfiada a mãe, o pai, e sibila:

– Poooorqueeeee?