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Sting: sem dom para as rimas | Arquivo Gazeta do Povo
Sting: sem dom para as rimas| Foto: Arquivo Gazeta do Povo

Anne Enright, outra mulher laureada

Londres – Outra mulher do mundo literário ganhou destaque nos últimos dias.

Trata-se da escritora irlandesa Anne Enright, que venceu o prestigiado prêmio Booker, o mais importante da Grã-Bretanha, por sua obra The Gathering.

Anne Enright desbancou favoritos como Ian McEwan e Lloyd Jones e levou o prêmio de 50 mil libras (cerca de R$185 mil).

The Gathering, o quarto romance de Anne, conta a história de uma família durante três gerações e como a memória e os segredos familiares podem afetá-la. "Quando a gente pega um livro quer ler algo alegre. Nesse caso, não deveriam ler meu livro. É o equivalente intelectual de um melodrama hollywoodiano", definiu a própria autora.

Já Howard Davies, presidente do comitê do prêmio Booker, destacou a obra como "um livro poderoso e agressivo que pode chegar a incomodar".

"Acreditamos que é um romance que marcará uma época e do qual se falará muito. O final da obra é muito brilhante. As últimas frases estão entre as melhores que jamais li", acrescentou.

O Prêmio Booker, conhecido em inglês como Man Booker Prize for Fiction, é entregue todos os anos ao melhor romance escrito por um cidadão dos países da Commonwealth ou da República da Irlanda.

Ex-produtora de TV, Anne Enright se torna o segundo nome da Irlanda a ganhar esse prêmio nos últimos três anos, depois que John Banville foi agraciado em 2005 por O Mar.

Doris Lessing acaba de ser aclamada com o mais importante reconhecimento na área da literatura: o prêmio Nobel. A repórter se aventura por uma selva de buquês de flores para perguntar a essa velhinha de gênio difícil o que significa tudo isso. Nesta manhã, entretanto, como se espera de uma senhora com 88 anos que acabou de receber o maior prêmio da literatura mundial, ela é só sorrisos e beijinhos.

Os degraus de sua casa desmantelada em Hampstead, ao norte de Londres, estão ornados com buquês de flores. A sala de estar, localizada no andar superior, tem a mesma aparência de quando a entrevistei pela primeira vez, só que desta vez o brilho é diferente. O melhor, diz ela com uma alegria indisfarçável, foi ter recebido a ligação de seu herói, Gabriel García Márquez. "Fui enormemente tocada com a quantidade de pessoas que ficaram felizes por mim".

O favorito deste ano, Philip Roth, um grande indisciplinado e controverso velho homem da literatura, famoso por escrever sobre masturbação, política e a neurose masculina, foi grandiosamente derrotado por uma "estranha" , também grande indisciplinada e controversa velha mulher da literatura, famosa por escrever sobre menstruação, política e a neurose feminina.

Ela é, como toda a imprensa fez questão de enfatizar, apenas a 11.ª mulher a receber o prêmio em 104 anos. Isso é um triunfo para as escritoras? "Eu odeio falar de literatura usando os termos homem e mulher. Isso não contribui em nada", diz ela.

O pós-colonialismo, comunismo, feminismo, misticismo – existem poucos "ismos" do século 20 que não foram caracterizados por Lessing, propositadamente ou não. "Eles (os críticos) gostam de pôr etiquetas em tudo, fica tudo mais fácil assim".

Então, o que ela acha que a fez ganhar o prêmio 40 anos após ter sido indicada? "Provavelmente, é porque eu escrevi de tantas formas diferentes, sem nunca pensar se realmente tinha permissão para fazer isso. É uma lista memorável." Ela ficaria desapontada se não tivesse ganho? "Não, para falar a verdade isso vem se enrolando por anos a fio, já estava ficando chato. Eu ganhei todos os prêmios da Europa. Este é o mais glorioso deles, com certeza, mas não quer dizer que seja o melhor do ponto de vista literário".

Doris foi convidada a ser nomeada uma "dama" do Império Britânico, mas, de acordo com as más línguas, ela recusou o pedido por achar tudo um "grande teatro".

Ela disse realmente isso? "Sim, eu disse", declara ela, dando pulinhos no sofá. "Bem, veja que não existe mais essa coisa de ‘Império Britânico’, parece que ninguém se dá conta disso. Além disso, me disseram que eu seria uma companheira. Uma companheira para quem ou o quê? Francamente!’"

Feminismo

Doris Lessing é sem sombra de dúvidas a mais velha feminista da Grã-Bretanha – um "manto" do qual ela vem querendo se despir desde que O Carnê Dourado foi chamado de "a bíblia feminista", em 1962.

Será que ela quer mesmo ver o romance que escreveu como seu "albatroz"? "Este livro tem uma espécie de carga. Eu tenho que admitir. Ele aparece toda hora em um lugar diferente do mundo e não posso parar de dizer ‘Meu Deus, este livro tem alguma coisa’. Ele tem uma qualidade, uma vitalidade".

Além disso, existe algo sobre Lessing que é constantemente ignorado: ela é uma pioneira de uma determinada forma (literária) e também de idéias, sua ficção evolui do realismo-humanista de seus primeiros romances para a sua fase intermediária, voltada para o universo do fantástico. Com a contrariedade característica, ela tem mais orgulho da série de ficção científica Canopus, que desconcertou a crítica. "Eu acho que uma das minhas melhores obras é a série Shikasta. São experimentos. O problema é que não devemos nunca subestimar o conservadorismo dos literatos – quando O Carnê Dourado foi lançado, ninguém percebeu que era uma forma bem interessante que eu estava usando, estavam todos mais preocupados com o fato de que ele era um marco anti-machismo".

A história de vida de Lessing será bem conhecida de todos os leitores não só porque ela passou anos a fio fazendo crônicas sobre ela. Em seu livro de memórias ela descreve, com uma intimidade quase obscena, os sons, as vistas e principalmente os cheiros da vegetação africana onde ela cresceu e se formou.

Sua infância – dividida entre um mundo externo violento e uma vida interior intensa – foi dominada pela mãe dominadora com quem ela brigou "firme, mas relutantemente" até a morte. Apesar de figuras maternas estarem sempre presentes na sua ficção, apenas agora ela conseguiu escrever diretamente sobre a mãe. A escritora conseguiu perdoá-la? "Eu a expliquei, se você considera isso perdão".

O seu último romance – que ela alega ser o último – se chama Alfred and Emily, em homenagem a seus pais. Ela sempre os descreveu como sendo aleijados pela Primeira Guerra Mundial (seu pai fisicamente: ele perdeu uma perna; a mãe: emocionalmente).

Na primeira parte do romance, ela "aboliu a Primeira Guerra deles para que eles pudessem ter vidas bem comuns e decentes". A segunda metade do livro retrata o que aconteceu depois que eles mudaram para a Rodésia (hoje o Zimbábue). "Basicamente, é um livro antiguerra, não era o que eu tinha em mente".

Então, o que a velha escritora acha ter sido sua grande conquista? "O que eu fiz foi continuar a escrever fizesse chuva ou sol. Eu me comprometi com isso. Teve vezes que foi bem difícil. Não se esqueça que eu tive um bebê no começo dessa jornada."

Uma das características mais marcantes da vida de Lessing foi que, juntamente com Muriel Spark, que era desconhecida dela na época em que vivia na Rodésia, ela é uma das "mães desnaturadas" mais famosas da literatura – algo que lhe custou muito no passado, visto ela nunca ter demonstrado remorso. "O bebê de Muriel foi criado pelos avós assim como meus filhos receberam a criação de uma madrasta. Eles não foram abandonados na soleira de nenhuma porta." Ela não se sentiu terrivelmente culpada? "Não, veja bem, é isso que é difícil. Se eu não tivesse partido, eu sei o que teria acontecido comigo. Eu teria me tornado uma pilha de nervos alcoólatra. Apesar de ter sido uma coisa horrível, eu sei que fiz a coisa certa." Entretanto, uma triste ironia reside no fato de que Lessing passou os últimos anos cuidando do seu filho Peter, fruto de seu segundo casamento, que hoje mora no apartamento ao lado da casa dela. Ele anda muito adoentado e é internado em hospitais freqüentemente, o que traz enorme dificuldade para ela achar o tempo e a energia necessários para escrever. Enquanto muitos escritores dizem que dedicaram a vida a si mesmos, pode-se dizer que o mesmo não vale para Lessing. Ela escreve sobre o que lhe interessar no momento e, se os leitores não gostarem, isso é problema deles.

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