É fundamental que as mulheres se sintam à vontade para procurar ajuda para lidar com os múltiplos desafios da maternidade.| Foto: Divulgação
  • Por Dra. Ivete Contieri Ferraz
  • 23/06/2021 13:11
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Uma das características da espécie humana é que sua prole necessita de proteção constante, algo que se estende por um bom tempo da infância. Prova disso é a demora considerável para que um bebê comece a ter sua independência, se comparado às outras espécies da natureza. E a primeira a dar essa atenção aos filhos é a mãe, desde o início da gestação.

A maternidade é um momento de transformação na vida de uma mulher. A chegada de uma criança acende na mãe instintos de proteção que irão acompanhá-la por toda a vida, não importando a idade que o filho tenha. A relação com os filhos passará por diversos ciclos, com momentos de aproximação e separação, além de  muitos conflitos.

“Quando a mulher engravida, começa a desenvolver uma relação simbiótica com seu bebê, nutrindo-o dentro do próprio corpo. Isso traz uma percepção de maternidade de uma forma profunda e também muito primitiva. É da natureza humana esse envolvimento complexo com a criança. Quando nasce, a mãe percebe a dependência total que o bebê tem por ela. Ela o amamenta e passa a ter uma relação de extremo vínculo, de apego”, destaca a Dra. Ivete Contieri Ferraz, psiquiatra especialista na área de relações familiares.

Os primeiros momentos de separação começam ainda durante o crescimento da criança, com a mãe aprendendo a dar liberdade a ela. Quando está com 9 ou 10 meses, o bebê já não passa tanto tempo no colo da mãe e começa a dar os primeiros passos. Ao mesmo tempo que a mãe cede, o bebê vai buscando o seu espaço. “E assim acontece em todas as fases da vida. Não se deixa de ser mãe e nunca se deixa de ser filho ou filha”, lembra a médica.

A partir da fase da adolescência, é muito comum a mãe ainda não se dar conta da necessidade de liberdade dos filhos. Como a linha é muito tênue, são comuns os conflitos, pois ela ainda quer proteger e cuidar, enquanto eles estão buscando liberdade e autonomia. Nessa fase, ainda pode existir uma conexão muito rica e especial, mas também há conflitos.

“O adulto jovem quer sua autonomia, sente-se pleno e rechaça a relação mãe e filho. Ele esquece um pouco a mãe, que se sente abandonada, como uma rejeição. Ele quer construir a própria família e carreira do seu jeito e a mãe se sente sem espaço nessa situação”, diz a Dra. Ivete Ferraz. Nesses momentos, o ideal é que a mãe consiga compreender e, principalmente, lidar com os conflitos externos, mas também com todas as questões internas que possam surgir. Dentro desse panorama, a área da psiquiatria pode ser bastante relevante para o entendimento de alguns pontos.

Por exemplo, por enxergar o papel de mãe como um cargo vitalício, a mulher pode apresentar dificuldade para identificar a sua função durante a passagem de seus filhos para a fase adulta, quando eles assumem maior autonomia. A médica reitera a importância do entendimento das complexas relações de famílias a partir do olhar da mãe. É ela quem geralmente pode incentivar os filhos e o parceiro a procurarem qualquer tipo de ajuda, mas também precisa ser apoiada quando necessitar de auxílio.

Principais conflitos para as mães se iniciam quando filhos entram na fase da adolescência.| Foto: Crédito: Divulgação

Inversão de cuidados

O cenário de cuidados passa a se inverter quando a mãe chega à fase idosa. Na meia-idade dos filhos, a mãe geralmente está no início da velhice, para algumas na fase da senilidade, e ela é que passa a demandar cuidados. E, nessa inversão, muitas vezes os filhos são pegos de surpresa. “Desavisados, muitos não tiveram a noção que seria preciso cuidar da mãe, que ela precisaria de tanta atenção. Esse despreparo é muito comum na sociedade brasileira, que vem envelhecendo recentemente. A meia-idade está muito despreparada para cuidar dos seres parentais, seja financeiramente ou afetivamente”, avalia a Dra. Ivete Ferraz.

Como essa relação é muito rica, é necessária muita atenção de todos os envolvidos para lidar com os seus diversos aspectos. Segundo a médica, a psiquiatria pode oferecer uma visão geral para compreender e lidar com todos os conflitos dessa relação entre mãe e filhos. “É importante oferecer apoio e empatia aos desafios da mãe, pois muitas vezes não há uma sincronia nos ciclos de vida com os momentos de vida de seus filhos”, pontua.