Exibição de documentário na 13ª CineBH, festival internacional de curtas de Belo Horizonte: arranjos locais foram alternativas importantes em 2019 para fomentar a produção audiovisual.| Foto: Jackson Romanelli/Universo Produ

Euforia de um lado, incerteza do outro. Para o setor audiovisual brasileiro, o ano de 2019 está chegando ao fim marcado por sentimentos opostos. Nas telas, uma produção intensa, que levou um grande público às salas de cinema, ganhou destaque na televisão e nos serviços de streaming, e conquistou prêmios importantes. Fora delas, a mudança de governo fez com que as políticas de fomento ao setor passassem o ano praticamente estagnadas, congelando recursos e paralisando vários projetos.

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Debater tanto os avanços quanto os entraves para o setor foi um dos objetivos da quarta edição da MAX – Minas Gerais Audiovisual Expo, evento que aconteceu nos dias 28 e 29 de novembro, em Belo Horizonte. Participaram do encontro profissionais de todo o país e representantes das principais plataformas de conteúdo, que realizaram uma série de painéis de debate e rodadas de negócio.

Segundo a Brasil Audiovisual Independente (Bravi), associação que reúne produtores de conteúdo, existem atualmente no país mais de 12 mil empresas de conteúdo audiovisual, que geram mais de 300 mil empregos diretos. O setor, que vem crescendo 8,8% ao ano, movimentou R$ 2,5 bilhões no ano passado, segundo a entidade. Apesar das dificuldades, representantes do setor se mostram otimistas para 2020 e apostam no incremento desses números. Para isso, trabalham em várias frentes junto ao poder público, ao Legislativo e com os próprios produtores.

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A seguir, elencamos as principais demandas do audiovisual brasileiro debatidas durante os dois dias da MAX.

Políticas de fomento

O principal impasse no mercado audiovisual atualmente está na Agência Nacional de Cinema (Ancine), órgão responsável, entre outras atribuições, por analisar projetos que pleiteiam recursos e estabelecer normas para produção, exibição e difusão. Em abril, as atividades da agência foram paralisadas após o Tribunal de Contas da União (TCU) identificar problemas nas análises de prestação de contas de projetos. Somente no dia 12 de novembro o TCU aprovou os relatórios e arquivou o processo.

Dos quatro cargos de direção da Ancine, apenas um se encontra ocupado. Com isso, a análise de aproximadamente 4 mil projetos de filmes e séries está parada. Com a Ancine paralisada, também não foi aprovada a liberação do Fundo Setorial do Audiovisual, cuja previsão para 2019 era destinar R$ 724 milhões para financiamento de projetos. A expectativa do setor é de que a liberação seja aprovada nos próximos dias, sob o risco de os recursos serem perdidos.

Para Breno Nogueira, diretor do Sindicato da Indústria Audiovisual de Minas Gerais (Sindav), o fomento direto ainda é fundamental para a produção brasileira. “As políticas de fomento ainda são muito recentes, começaram há dez anos e começamos a colher os frutos agora. Estamos avançando e precisamos continuar, por isso ainda é muito importante que haja esse fomento”, afirma.

O governo federal foi representado na MAX por Luiz Maurício Navarro, coordenador geral de competitividade e produtividade do Ministério da Economia. De acordo com ele, a atual gestão encara o setor como uma indústria e, para isso, está empenhada em criar um ambiente de negócios favorável. “Sabemos que é um setor que gera muitos empregos com valor agregado. Nosso objetivo é criar condições para que essa indústria se desenvolva e tenha condições de competir”, diz.

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Arranjos regionais de produção audiovisual

Nem só do apoio do governo federal vive a indústria do audiovisual. Estados e municípios têm investido cada vez mais no setor, através de editais de financiamento que utilizam recursos do Fundo Setorial e abatimento de impostos. Em Minas Gerais, os recursos destinados a projetos audiovisuais em 2019 está próximo de R$ 15 milhões. No Paraná, foram mais de 300 projetos inscritos em editais que financiaram R$ 10 milhões. São os chamados arranjos regionais, que unem as esferas municipal, estadual e federal.

O secretário adjunto de Cultura de Belo Horizonte, Gabriel Portela, defende que estados e municípios sejam mais autônomos no apoio a projetos audiovisuais. Hoje, muitos processos ainda estão atrelados à Ancine. “É importante que se construam políticas para o audiovisual ajustadas com a realidade local. Quando se dá maior autonomia aos agentes locais, há um impacto maior na relação entre poder público e produtores”, acredita.

Um exemplo de indústria audiovisual regionalizada está na cidade mineira de Cataguazes, na Zona da Mata. Em 2002, foi iniciado um projeto de incentivo à produção de filmes e séries na região, que somente entre 2018 e 2019 movimentou R$ 42,5 milhões. “Apostamos na formação e na qualificação dos profissionais locais. Nossa estratégia é manter o dinheiro circulando na região, retendo os impostos e obtendo o compromisso da iniciativa privada em apoiar os projetos. É um impacto geracional”, explica César Piva, diretor-presidente da Agência de Desenvolvimento do Polo Audiovisual da Zona da Mata.

Regulação do streaming

Mais do que uma realidade, o streaming é uma tendência crescente, ocupando cada vez mais o lugar da televisão convencional. Mas por ser relativamente novo, o Video On Demand (VOD), serviço desempenhado por plataformas como Netflix e Amazon Prime, ainda não tem regulamentação no Brasil. Um projeto de lei para regulação, de autoria do deputado Paulo Teixeira (PT-RJ), tramita no Congresso Nacional desde 2017 e sua aprovação é tida como essencial pelo setor audiovisual.

No fim de novembro, a Comissão de Cultura da Câmara Federal aprovou um substitutivo apresentado pela deputada Benedita da Silva (PT-RJ), resultado de debate entre parlamentares, produtores e representantes das empresas de VOD. Entre os dispositivos previstos na proposta estão a tributação em até 4% da receita das empresas, investimento de 10% do faturamento em produções nacionais e destaque obrigatório a essas produções nas plataformas.

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A advogada Ana Paula Bialer, que atua na regulação do audiovisual no Brasil, destaca como um dos principais pontos do projeto a substituição das cotas (percentual obrigatório de conteúdo nacional) pelo fomento à produção. “Uma regulação focada no incentivo é mais eficaz. Ao propor que se invista na produção e distribuição de conteúdo, ela fortalece o mercado como um todo”, avalia.

Para o presidente executivo da Bravi, Mauro Garcia, a regulação é necessária diante do desequilíbrio entre produção brasileira e estrangeira. “A competição do conteúdo brasileiro com o estrangeiro é desigual, é preciso criar regras de mercado para manter o equilíbrio na relação com o consumidor”.

União entre produtores

Seja pelas mudanças nas políticas para o audiovisual, ou aquelas geradas pelo próprio mercado, com o ingresso de novos atores, é consenso entre os representantes do setor de que é preciso se adaptar. Mais do que esperar do poder público, produtores estão buscando novas formas de trabalhar para que a indústria continue crescendo.

Diane Maia é uma das articuladoras da Frente dos Produtores do Audiovisual, organização que reúne mais de 100 produtores de todo o Brasil, com o intuito de debater e propor soluções para o setor. Ela conta que uma das ações do grupo foi promover a união de produtores independentes em torno de determinados projetos. “Não é o momento de ficar concorrendo, é o momento de nos ajudarmos. A partir de alguns grupos de trabalhos que formamos, já nasceram algumas coproduções”, revela.

A união de forças também é defendida por Geórgia Costa Araújo, que há 15 anos comanda a produtora Coração da Selva. “É uma nova etapa que estamos vivendo. Se trabalharmos em parceria, dividindo os riscos e as responsabilidades, teremos a possibilidade de produzir mais projetos e de forma melhor.”

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A ampliação do mercado de streaming, com novas plataformas entrando no mercado, é vista como uma oportunidade para o setor crescer ainda mais. Maurício Magalhães, produtor da Giros Filmes, acredita que é possível chegar ainda mais longe e desbravar o mercado internacional. Sua produtora foi responsável pelo documentário Menino 23, que em 2016, ficou entre pré-finalistas do Oscar de melhor documentário. “A diferença entre uma história regional e uma global é a forma como se conta a história. A pergunta que devemos fazer é: onde queremos chegar com nossas produções? Se você tem uma boa história e uma estratégia de mercado, pode ir longe.”

O jornalista viajou a convite da organização do Minas Audiovisual Expo.