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Antonio José Lino, proprietario do Lino’s Rock Bar
Antonio José Lino, proprietario do Lino’s Rock Bar| Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo/Arquivo

Figura central da música e da cultura underground de Curitiba, o empresário Antônio José Lino, dono do Lino’s Bar, morreu aos 82 anos nesta sexta-feira (30).

Lino teve quadro de pneumonia no último fim de semana e estava internado na UTI do Hospital São Lucas, em Campo Largo, na região de Curitiba, desde segunda (26).

Ex-pescador, ex-soldado Boina Azul da missão da ONU no Egito nos anos 1950, ex-caixeiro-viajante e ex-cantor sertanejo, Lino se converteu em dono de bar em 1980.

Em torno de sua figura e de seu bar se formou a maior cena underground de música e literatura em Curitiba nos últimos 40 anos.

Tudo começou em 1982, quando se tornou dono do Lino’s Bar, na esquina das ruas Alameda Cabral e Augusto Stellfeld, no Centro de Curitiba. Lino foi abordado por um vizinho, o músico Rodrigo Barros Del Rey, o Rodrigão, vocalista da banda Beijo AA Força, uma das primeiras bandas punks da cidade.

A banda buscava um local para ensaiar. Lino cedeu o domingo, dia de menor movimento da casa.  Do encontro, resultou boa parte da música underground produzida em Curitiba nas décadas seguintes. Punk, metal ou psychobilly e outras vertentes.

| Hugo Harada/Gazeta do Povo/Arquivo

Os ensaios abertos do BAAF viraram shows. Logo, bandas ocuparam o palco improvisado entre os engradados e a mesa de sinuca. “Aquilo nasceu do nada. Começou a juntar gente. Eu disse tudo bem e eles nunca mais foram embora”, disse Lino em entrevista à Gazeta do Povo, em 2017.

Além da música, parte importante da literatura produzida na cidade também passou pelo balcão do Lino’s.

Escritores como Marcos Prado (1961–1996), Paulo Leminski (1941-1989) Thadeu Wojchiechowski e Sérgio Viralobos também frequentavam o bar. Em entrevista à Gazeta, ele lembrou de como eram aqueles tempos.

A frequência de tipos estranhos tornou o bar “o inimigo numero 1” da polícia nos anos 1980 e 1990. “Não precisava nem a polícia mandar a moçada por a mão na parede, tudo mundo conhecia o procedimento”, disse Lino.

Ele diz que quase se arrepende de sua atitude à época. “Eu era muito atacado pela sociedade e fiquei contra a sociedade por um tempo. Comecei a me preocupar mais em defender a molecada, que era minha clientela, do que com a sociedade”.

O padrinho do punk concluiu, porém, que valeu a pena. “A maioria ali virou engenheiro, advogado, médico, juiz, escritor, jornalista...”

Em 2005, o imóvel do Centro foi vendido. Lino tentou renovar o contrato na Justiça - sem sucesso. Em 2008, o bar se mudou para uma rua meio escondida, na margem do trilho do trem, entre os bairros da Boa Vista e Barreirinha, nos fundos da casa do dono.

Biografia

| Hugo Harada/Gazeta do Povo/Arquivo

Lino nasceu de uma família de 13 irmãos na cidade de Imaruí, no litoral catarinense – perto da famosa Praia do Rosa – então uma vila de pescadores de camarão.

Ele contou que viveu como “caiçara” até os 16 anos. “Foi só nessa idade que eu comecei a usar sapato”. “O meu pai era “picareta de camarão” e eu ajudava ele. Comprava o camarão dos pescadores e trazia pra Curitiba e Florianópolis”.

Aos 18 anos, foi convocado para servir o Exército no Rio de Janeiro. Após o serviço cumprido com louvor, surgiu a oportunidade de se juntar às Forças de Manutenção da Paz das Nações Unidas, convocada para garantir a nacionalização do Canal de Suez pelo Egito em 1956.

Lino vestiu a boina azul e foi para a faixa de Gaza onde ficou por 13 meses. “Foi um sofrimento do cão. Os americanos mandavam em tudo lá. A gente era meio escravo deles”.

Ele conta que se manteve firme por causa do soldo de quatro mil dólares que ajudava a sustentar toda a família. “Era complicado, mas o que vale é a experiência que a gente consegue na vida”. Daquela época, só sobrou o hábito de usar óculos ray-ban, modelo aviador.

No ano seguinte veio morar em Curitiba. Casou, teve quatro filhos e nunca mais saiu. Foi vendedor e gerente de loja dos Tapetes Pedroso.

Depois, viveu os “11 anos mais felizes da vida” como representante da marca para a região Sul. “Saía na segunda-feira e voltava só na sexta à noite”, lembra. “Foi o melhor tempo. A empresa pagava tudo e o Pedroso não aceitava que seus empregados ficassem em hotel barato”.

Como as viagens ficaram caras demais, a empresa as cortou. Lino não aguentou voltar para o serviço burocrático, no balcão da loja. Fez um “acerto” com a firma e comprou um bar.

“Acostumei com a liberdade. Quando eu viajava sempre olhava os botecos e pensava que um dia eu abriria o meu. Mas nunca imaginei que seria tudo isso”.

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