O ministro do STF, Gilmar Mendes.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, relator do “processo paradigma” que definirá jurisprudência sobre predominância ou não do negociado sobre legislado nas relações trabalhistas.| Foto: Nelson Jr./STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta quarta-feira (1) julgamento cuja decisão deve criar jurisprudência para milhares de processos relacionados à mecânica de acordos e convenções coletivas de trabalho, definindo sobre a prevalência ou não do negociado sobre o legislado. É o tema 1.046 da repercussão geral. A expressão significa que, pelo caráter da análise, o que for decidido pelo STF terá impacto em todas as demais decisões do Poder Judiciário sobre validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restrinja direito trabalhista não assegurado na Constituição.

O caso concreto trata de recurso extraordinário ajuizado por uma empresa em face de decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST). A Corte negou a validade de uma cláusula aprovada em negociação coletiva e, na prática, substituiu o pagamento pelas chamadas horas in itinere, o tempo gasto pelo empregado no deslocamento entre sua casa e o local de trabalho, pelo fornecimento de transporte. No recurso, a Mineração Serra Grande S.A., de Goiás, afirma que a decisão do TST ultrapassou o princípio constitucional da prevalência da negociação coletiva.

Segundo informado durante a sessão pela ministra Rosa Weber, que presidiu parte da sessão desta quarta, existem mais de 66 mil processos sobrestados na origem (ou seja, paralisados) a espera da decisão do STF sobre o tema. A suspensão foi ordenada pelo relator, ministro Gilmar Mendes.

Nesta quarta (1) foram ouvidos os representantes das partes e o procurador-geral da República, Augusto Aras. Em sua manifestação, afirmou que o resultado das negociações coletivas é preponderante sobre a legislação trabalhista, ainda que os instrumentos, segundo ele, devam observar o princípio da transparência e da lealdade. O julgamento foi suspenso e será retomado nesta quinta-feira (2) com o voto do relator.

Também nesta quarta, o STF concluiu outro julgamento relacionado ao tema. Em Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) ajuizada pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT), a Corte entendeu, por maioria apertada (de 6 a 5), pela não prevalência do negociado sobre o legislado.

A decisão diverge do posicionamento do ministro relator, também Gilmar Mendes, e mantém decisões da Justiça Trabalhista que condenaram empresas do setor ao pagamento de horas extras. Para a maioria dos ministros, as decisões em questão examinaram casos concretos, sem invalidar as cláusulas pactuadas em convenções coletivas entre transportadoras e motoristas.

O resultado proclamado da ADPF pode não se repetir no julgamento do Recurso Extraordinário, com chance de decisão contrária na repercussão geral. Dias Toffoli, por exemplo, aderiu à argumentação de Gilmar Mendes, tendo divergido quanto à possibilidade de aplicação da tese de modo "abstrato e genérico" na arguição julgada. Assim, o placar pode virar, prevalecendo entendimentos em prol do negociado.