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Então o bloqueio Bunning acabou. Por vários dias, o senador Jim Bunning, do Kentucky, explorou as regras do Senado para impedir que os benefícios de seguro-desemprego fossem estendidos por mais um mês. No final, ele acabou desistindo, apesar de não ter sido antes de conseguir causar uma interrupção nos pagamentos de cerca de 100 mil trabalhadores.

Apesar de o bloqueio ter terminado, as lições que aprendemos com ele permanecem. Algumas destas lições envolvem os defeitos do Senado. O assunto no qual quero me concentrar no momento, entretanto, é o vão inacreditável que se abriu entre os partidos. Atualmente, tanto os democratas quanto os republicanos vivem em universos diferentes, intelectual e moralmente.

Veja a questão do auxílio aos desempregados durante uma grande recessão. Os democratas acreditam no que a economia convencional prega: de que quando a economia está realmente em recessão, estender o benefício de seguro-desemprego não ajuda apenas quem precisa dele, como também consegue diminuir o próprio desemprego. Isso ocorre porque a economia sofre hoje como uma falta de demanda, e os trabalhadores que perderam seus empregos irão seguramente gastar seus benefícios. Na verdade, o Comitê de Orçamento do Congresso diz que o auxílio aos desempregados é uma das maneiras mais eficientes de se estimular a economia, e pode ser mensurado pelo número de empregos criados por cada dólar pago como seguro-desemprego.

Mas não é assim que os republicanos enxergam a coisa. Veja o que disse o senador republicano Jon Kyl, do estado do Arizona, quando foi defender a posição de Bunning (apesar de não ter se juntado ao bloqueio): "O seguro-desemprego não cria novos empregos. Na verdade, se é que ele faz alguma coisa, é continuar a pagar salários às pessoas como um desincentivo para que elas procurem um novo emprego".

No ponto de vista de Kyl, então, o que realmente deve nos preocupar atualmente (mesmo com a taxa de desemprego de longo prazo mais alta desde a Grande Depressão, com cinco trabalhadores desempregados para cada nova vaga de emprego aberta) é se estamos reduzindo os estímulos para que os trabalhadores desempregados procurem um emprego. Para mim, este é um ponto de vista bizarro, mas, vale lembrar que eu não vivo no universo de Kyl. A diferença entre os dois universos não é apenas intelectual, é também moral.

Bill Clinton uma vez disse a um aflito eleitor: "Sinto sua dor". E a questão é, ele sentia mesmo e ainda sente, enquanto muitos outros políticos claramente não. Ou talvez seria justo dizer que os partidos sentem as dores de pessoas diferentes.

Durante o debate sobre os benefícios de seguro-desemprego, o senador democrata Jeff Merkley, do Oregon, fez um apelo para medidas em favor dos necessitados. Em resposta, Bunning fez uma expletiva. Isso foi indigno, mas não é muito diferente, em substância, da posição dos líderes republicanos.

Considere, em especial, a posição tomada por Kyl sobre uma proposta de lei para estender o seguro-desemprego e subsídios de seguro saúde para os desempregados pelo resto do ano. Os republicanos irão vetar a lei, conforme Kyl, a não ser que eles consigam "progredir em breve" na questão dos impostos estaduais. Agora, a Câmara já aprovou uma lei que, ao isentar as propriedades de casais com valor até 7 milhões de dólares, deixaria 99,75% dos estados isentos de impostos. Mas isso não parece ser suficiente para Kyl: ele está querendo bloquear a ajuda necessária aos desempregados por causa dos 0,25% restantes. Isso deixa as prioridades realmente claras.

Então, como eu disse, os partidos vivem hoje em universos diferentes, tanto intelectual quanto moralmente. Podemos nos perguntar como isso aconteceu: como os partidos migraram para universos distintos. Os republicanos diriam que os democratas ficaram um pouco esquerdistas: um plano para levantar fundos chamado de Comitê Nacional Republicano sugere que os doadores sejam motivados com a promessa de "salvar o país de caminhar rumo ao socialismo". Eu diria que isto se deve aos republicanos terem migrado para a direita, rejeitando furiosamente as ideias que antigamente apoiavam. Na verdade, o plano de assistência a saúde de Obama se parece muito com os antigos planos republicanos. Mas, repito, não vivo no universo deles.

O mais importante, entretanto, é saber: quais são as implicações desta completa divergência de pontos de vista?

A resposta, obviamente, é que o bipartidarismo é hoje um sonho tolo. Como os partidos podem concordar na política quando possuem visões completamente diferentes sobre o funcionamento da economia, quando um partido se compadece dos desempregados, e o outro chora as vítimas do "imposto da morte"?

Isto nos traz ao principal problema político da atualidade: a reforma do sistema de saúde. Se o Congresso aprovar a re­­forma nas próximas semanas (e as chances para que isto aconteça não param de aumentar), isto irá acontecer sem votos republicanos. Algumas pessoas irão condenar isso, insistindo que Obama deveria ter tentado com mais afinco obter o apoio de ambos os partidos. Mas isso não vai acontecer, com o sistema de saúde ou qualquer outro assunto, durante os próximos anos. Algum dia, de alguma maneira, nós, como nação, iremos mais uma vez nos encontrarmos vivendo no mesmo planeta. Todavia, por enquanto, não estamos. E é assim que as coi­­­sas são.

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