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Homem vê seu smartphone. Ao fundo, anúncio do 5G.
Anúncio da tecnologia 5G no aeroporto de Xangai, na China.| Foto: Hector Retamal/AFP

A 5ª geração da internet, conhecida como 5G, promete revolucionar a relação entre as pessoas e a tecnologia. E não só porque a conexão será muito mais veloz: além de possibilitar a transmissão mais rápida de dados, o 5G deve permitir que a chamada internet das coisas se torne mais presente na vida das pessoas.

Mas, para sair da promessa e virar realidade no Brasil, a tecnologia precisa superar entraves de regulação e infraestrutura. Na metade de julho, o processo começou, com a ativação de linhas pelas operadoras Claro e Vivo em capitais do país. A TIM, por sua vez, promete colocar linhas em funcionamento fora de capitais em setembro.

Esses casos são apenas as primeiras experiências das operadoras. Para que o 5G deixe de ser exceção e se torne regra na conexão via internet pelo país, a nova tecnologia terá de superar dois desafios principais: o marco regulatório precisa sair do papel e investimento em infraestrutura para permitir a massificação do modelo no país.

Os avanços do 5G no Brasil são pequenos em relação ao deslumbrante mundo de possibilidades que ele abre. O tempo de resposta mais ágil deve viabilizar os carros autômatos. No campo e na indústria, a promessa é de aumento da produtividade e mecanização de processos que ainda precisam da interferência humana.

Em lavouras, a tecnologia permitirá comandar máquinas agrícolas à distância e monitorar as condições da plantação em tempo real. A rede deve permitir, ainda, que vários dispositivos fiquem conectados à internet ao mesmo tempo, com qualidade do serviço. Seria o fim da conexão ruim em shows ou grandes aglomerações.

Leilão para explorar o 5G só em 2021

O primeiro desafio para a implantação da tecnologia no país é regulatório: a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) prepara, para 2021, um leilão que irá definir como as operadoras de telefonia poderão explorar as faixas de frequência destinadas ao 5G.

Rafael Pistono, sócio do escritório CTA e especialista da área de Tecnologia, Mídia e Telecomunicações, explica que dois aspectos devem ser levados pela Anatel na formulação do edital para o leilão do  5G: o arrecadatório, isto é, quanto o poder público vai cobrar das operadoras para a venda da frequência; e o de fomento à infraestrutura.

“Não existe 5G se não houver a ampliação da infraestrutura. Aqueles que vão participar do leilão deverão assumir compromissos de investimentos em infraestrutura ao longo dos anos. A grande questão é a medida entre esses dois aspectos”, explica.

A Anatel já fez uma consulta pública a respeito do leilão, mas o edital da concorrência ainda não foi divulgado.

Instalação da estrutura para o 5G terá de superar barreiras burocráticas

Na instalação dos equipamentos do 5G está o segundo desafio: não são poucos os investimentos necessários para que a tecnologia possa ser massificada. Como transmitem uma grande quantidade de dados, além disso, as antenas de 5G precisam estar mais próximas umas das outras – o que esbarra em restrições que hoje existem em várias cidades do país.

“Precisamos desburocratizar os procedimentos necessários para que as empresas possam instalar suas estruturas no Brasil. Com a legislação atual, muitas cidades proíbem a instalação de antenas, o que dificulta a introdução do 5G”, explicou Vitor Elisio Menezes, secretário de Telecomunicações do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTIC), em um vídeo produzido pelo Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel).

O presidente da Anatel, Leonardo Euler de Morais, também critica as restrições municipais à instalação da infraestrutura de telecomunicações. Em artigo publicado no jornal Valor Econômico no final de junho, Morais classifica a dificuldade em obter licenças municipais para a instalação de torres e antenas como “barreiras descabidas” que “prejudicam sobremaneira a expansão da cobertura das redes e a qualidade dos serviços nas grandes cidades brasileiras”.

“O caso da cidade de São Paulo é emblemático. Poucas licenças foram expedidas nos últimos dois anos e milhares de solicitações paralisadas. Os pedidos pendentes representam aproximadamente 23% da capacidade atualmente instalada. O custo de oportunidade da morosidade, apenas em termos de investimentos que deixam de ser realizados, é da ordem de muitas centenas de milhões de reais”, completa o presidente da Anatel.

Ele aponta, ainda, que a Lei das Antenas – legislação federal que, em tese, facilitaria a ampliação das redes com a dispensa de exigências burocráticas e a garantia de mais agilidade aos processos – ainda não foi implementada na maior parte dos municípios.

Em quanto tempo as inovações do 5G estarão disponíveis para os brasileiros?

Quando as definições a respeito da regulação da nova tecnologia forem concretizadas, as inovações devem chegar em etapas aos brasileiros. O primeiro efeito deve ser o do aumento da velocidade da conexão. Depois, a perspectiva é de que as redes móveis possam ser utilizadas em sistemas de controle industrial. Só então deve começar a implementação da chamada internet das coisas.

“No médio e longo prazo a gente vai ver os serviços mirabolantes. De fato, isso vai acontecer, mas não vai ser simultaneamente. Em 4 ou 5 anos, quando o 5G estiver completamente consolidado, é que teremos a plenitude dos serviços à população”, explicou o pesquisador Luciano Leonel Mendes, do Inatel, em vídeo produzido pela instituição.

A previsão de Mendes é de que, nas regiões remotas, o acesso demore ainda mais para chegar, e esteja disponível somente em 2027.

Quando o 5G estiver disseminado, a tendência é de que os usuários precisem de novos aparelhos celulares. Os dispositivos que usamos hoje podem ser utilizados em alguns casos, mas não aproveitam toda a velocidade da nova tecnologia.

Atualmente, só há um modelo plenamente compatível com o 5G à venda no Brasil (o Motorola Edge, que custa R$ 5,5 mil). Outras marcas, como a Samsung e a própria Huawei, já têm modelos do tipo, mas ainda não chegaram ao país.

E o que a China tem a ver com tudo isso?

Apesar de todas essas questões, o debate a respeito do 5G parece estar focado em um único aspecto: a participação de empresas chinesas na implementação da infraestrutura da nova tecnologia. Os questionamentos giram em torno da segurança dos aparelhos chineses, isto é, da possibilidade de "espionagem" se houver a utilização desses equipamentos.

O advogado Rafael Pistono explica que a participação da China, por meio da companhia Huawei, está relacionada a uma fase posterior ao leilão que será promovido pela Anatel. Isso porque, na concorrência, as operadoras de telecomunicações vão adquirir o direito de explorar a frequência do 5G. Depois, elas terão que implementar a infraestrutura necessária – e, nessa etapa, poderão, ou não, utilizar equipamentos produzidos pela Huawei.

No edital do leilão a Anatel poderá, por exemplo, limitar a compra dos aparelhos pelas operadoras, fechando o mercado para os chineses.

“Há um conteúdo político e ideológico por trás dessa discussão. A questão toda é se o Brasil vai ceder à pressão dos EUA ou se vai abrir o mercado para os chineses”, opina. “Grande parte dos aparelhos de telecomunicações são chineses. As empresas da China estão muito avançadas em relação às demais. A Nokia e a Ericsson [ambas europeias], por exemplo, não têm o mesmo desenvolvimento”, completa Pistono.

Uma das saídas para a Anatel seria especificar, no edital do leilão, os parâmetros de segurança essenciais para que os equipamentos de 5G possam operar no Brasil.

No fim das contas, trata-se de uma decisão política que o governo brasileiro terá de tomar: se banir a Huawei, cedendo à pressão dos EUA, o Brasil estará desagradando seu maior parceiro comercial. Abrir o mercado para os chineses, por outro lado, significaria deixar de lado a ala mais ideológica da gestão de Jair Bolsonaro – que tende a um alinhamento quase automático com os norte-americanos.

A Huawei já foi banida em alguns países do mundo, como Reino Unido, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Índia e Japão.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o ex-presidente da Anatel e ex-ministro das Comunicações, Juarez Quadros, afirmou que há o risco de espionagem envolvendo “todos os fornecedores”. “A verdade é que temos de proteger as redes de telecomunicações a evitar situações de conflito. Então teríamos que impor salvaguardas que protejam o Brasil desse risco”, destacou Quadros.

A empresa chinesa, por sua vez, se defende dizendo que nunca teve incidentes relacionados a segurança nos seus 30 anos de operação em mais de 170 países. A Huawei atua há 22 anos no Brasil.

Parte do Brasil ainda é desconectado

O Brasil tem um desafio extra: além da instalação da infraestrutura para o próprio 5G, o país ainda luta para levar a tecnologia a regiões sem conexão. “Teremos que trabalhar em duas frentes: no desenvolvimento da tecnologia de 5ª geração e na cobertura das áreas em seguir tentando conectar o Brasil inteiro”, admitiu Menezes, do MCTIC, no vídeo do Inatel.

De acordo com a última edição da pesquisa TIC Domicílios, realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) e divulgada em maio de 2020, 20 milhões de domicílios do país (28%) não possuem acesso à internet. Entre os que possuem acesso, 44% têm conexão por cabo ou fibra ótica; 27% por conexão móvel (modem ou chip 3G/4G); e 6% por DSL (via linha telefônica).

Quando são considerados os indivíduos, a pesquisa aponta que um em cada quatro brasileiros não usa a internet, o que representa 47 milhões de não usuários. Nas áreas urbanas, os usuários são 77% da população, enquanto nas zonas rurais pouco mais da metade das pessoas (53%) têm acesso à rede. Todos os dados têm como referência o ano de 2019.

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