O ambiente de crise da economia brasileira e a falta de perspectiva de curto prazo está levando um número cada vez maior de companhias a cortar proventos aos acionistas para proteger o caixa. Vale, CCR, Marcopolo, em um movimento pouco comum, voltaram atrás em relação ao pagamento de dividendos que já haviam sido anunciados, com objetivo de blindar o balanço de uma crise que pode demorar para ser revertida. A tendência é que mais empresas sigam o exemplo com a piora dos indicadores econômicos no País.

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Os cortes nos dividendos podem aparecer com mais frequência depois da divulgação dos resultados do terceiro trimestre, que começa no próximo dia 15 de outubro, já que eles devem apontar números ainda mais pressionados. “As empresas estão deixando de pagar dividendos para se acomodarem melhor em termos de caixa e alinhar o pagamento de dívidas”, diz Rafael Ohmachi, analista da Guide Investimentos.

Pela Lei das Sociedades Anônimas, a de número 6404/76, que regula o tema, o estatuto social de cada companhia determina a porção dos lucros que será estabelecida como obrigatória para cada empresa. Se houver omissão sobre esse assunto no documento, a empresa deverá pagar 50% do lucro líquido, após alguns ajustes. A lei frisa ainda que, quando o estatuto for omisso e a Assembleia Geral decidir introduzir a regra, o dividendo obrigatório não poderá ser inferior a 25% do lucro líquido ajustado.

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O estrategista chefe da XP Investimentos, Celson Placido, afirma que algumas empresas pagam mais dividendos do que o exigido em estatuto e que a tendência é que, a partir de agora, muitas reduzam os percentuais. Ele destaca, no entanto, que, diante da queda das ações dos bancos, o indicador do setor que calcula o retorno de dividendos está neste momento mais atrativo. “As companhias do setor financeiro, em especial os bancos, devem ampliar a representatividade entre os melhores pagadores de dividendos.”

A decisão por cortar parte desse pagamento que é feito aos acionistas passa pela expectativa de lucros menores e pelo temor de uma restrição de crédito. “As empresas mantêm mais dinheiro em caixa para elevar a liquidez e atenuar os riscos”, diz o professor de Finanças da Fundação Instituto de Administração (FIA), Marcos Piellusch. Além disso, ele pondera que, com a atual taxa de juros, manter dinheiro em caixa acaba se tornando uma estratégia rentável.

Presença comum nas listas de maiores pagadoras de dividendos entre as companhias de capital aberto, a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que busca redução do endividamento, já informou que, por ora, os dividendos estão suspensos. No primeiro semestre do ano a empresa reverteu lucro para prejuízo líquido de R$ 222,8 milhões e viu sua alavancagem, medida pela razão da dívida líquida pelo Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) avançar para 5,6 vezes, refletindo também a queda da geração de caixa da empresa. A delicada situação financeira também levou a Petrobrás a cortar dividendos, até então uma fonte certa de caixa para a União. Além dela, Cemig e Oi alteraram suas políticas de remuneração aos acionistas.

Estratégia

“A evidente necessidade de retenção de liquidez, para enfrentar as tempestades que ainda vêm pela frente no país, obriga as empresas listadas a mexer na sua gestão de capital. Mudar as regras de pagamento de dividendos, cancelar ou suspender os mesmos são estratégias de defesa à retração de crédito e acréscimo no custo de capital de terceiros”, destaca o chefe de Mercado de Capital da Eleven Financial, Adeodato Netto. O especialista observa, por outro lado, que um menor pagamento de dividendos tende a afastar o investidor de longo prazo.

Embora os dividendos sejam os responsáveis por atrair muitos investidores para o mercado de renda variável, a decisão em não realizar esse pagamento em um cenário de crise pode ser a melhor escolha por parte da administração para enfrentar o período, com opção a reforçar o caixa. O corte recente anunciado pela Vale, que reduziu pela metade o valor dos dividendos referentes à segunda parcela do ano, por exemplo, foi bem recebido pelo mercado, que considerou importante a medida no sentido de preservar sua estrutura de capital em um momento mais difícil do mercado.

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