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O Congresso visto a partir do Palácio do Planalto, sede do governo federal: se parlamentares não aprovarem pelo menos a LDO, máquina pública pode parar no começo de 2021.
O Congresso visto a partir do Palácio do Planalto, sede do governo federal: se parlamentares não aprovarem pelo menos a LDO, máquina pública pode parar no começo de 2021.| Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

A pouco mais de um mês do início do recesso legislativo, permanece a indefinição sobre o Orçamento de 2021. O Congresso não instalou a Comissão Mista de Orçamento (CMO) e nem bateu o martelo se levará os dois projetos que regulam os gastos públicos para o próximo ano – a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) – para serem apreciados diretamente no plenário. Esse cenário deixa cada vez mais próxima a possibilidade de uma paralisia inédita da máquina pública.

O alerta é do Ministério da Economia e da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados. Ambos os órgãos afirmam que, sem a aprovação ao menos da LDO, a máquina pública para. Ou seja, o governo não vai mais poder pagar despesas como salários, aposentadorias, pensões e benefícios sociais, muito menos fazer investimentos e manter os órgãos públicos funcionando. É algo que nunca aconteceu desde a Constituição de 1998, mas que pode virar realidade em 2021 se os parlamentares não aprovarem a LDO.

A LDO é uma espécie de prévia do Orçamento. Ela precisa ser aprovada primeiro, pois estabelece regras básicas para a execução do Orçamento do ano seguinte e previsões de receitas e despesas. Ela foi enviada em abril pelo governo para o Congresso, conforme manda a lei, mas até o momento não foi apreciada pelos parlamentares. Depois de aprovada a LDO, os congressistas analisam a LOA, que é o Orçamento de fato, com os gastos pormenorizados por área.

Caso a LDO seja aprovada a tempo, o Congresso evita a completa paralisia da máquina pública. O artigo 55 da PLDO, enviada pelo governo ao Legislativo, prevê que, enquanto o Orçamento em si (a LOA) não for aprovado, o governo opera em modo de “execução provisória” e só pode gastar:

  • um doze avos (1/12) por mês do valor previsto no PLOA para o custeio da máquina pública;
  • despesas com obrigações constitucionais ou legais da União;
  • ações de prevenção a desastres classificadas na subfunção Defesa Civil ou relativas a operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO);
  • concessão de financiamento ao estudante; e
  • dotações destinadas à aplicação mínima em ações e serviços públicos de saúde.

Sem LDO, até a execução provisória do Orçamento fica ameaçada

Uma vez aprovado o Orçamento e sancionado pelo presidente da República, ele entra em vigor e o governo pode executar todos os gastos previstos normalmente. Agora, se nem a LDO for aprovada, falta respaldo legal até para essa “execução provisória”, no entendimento do governo e de consultores da Câmara.

“Importante destacar que sem a aprovação do PLDO e do PLOA não poderá haver execução orçamentária em 2021. Nem mesmo a execução provisória, cuja autorização e regulamentação constam no texto do PLDO. Isso provocará um prejuízo para o funcionamento dos serviços públicos e desgaste das instituições. Ou seja, haverá uma paralisação da máquina pública”, diz nota técnica assinada pelos consultores de Orçamento da Câmara Eugênio Greggianin, Mário Luís Gurgel de Souza e Túlio Cambraia.

O alerta já tinha sido feito pelo secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, em duas oportunidades. No dia 21 de outubro, ele confirmou que o governo tem de suspender todos os gastos no ano que vem se a LDO não for aprovada até o fim deste ano. “O Congresso vai ter que votar pelo menos a LDO. Tem que votar, não tem jeito”, disse.

No dia 29 do mesmo mês, o secretário foi questionado por jornalistas se haveria a possibilidade de o governo fazer um plano de contingência para caso a LDO não seja votada. “Como que a gente vai fazer um plano de contingência se a gente precisa de uma lei definindo as diretrizes? A gente precisa da lei”, afirmou Funchal. A possibilidade do plano foi mencionada pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

O secretário-adjunto do Tesouro Nacional, Otávio Ladeira, explicou que a regra da execução provisória do Orçamento é prevista todos os anos na LDO. Ela não está na Constituição. Ladeira ponderou que seria melhor se a regra estivesse prevista numa lei que não é renovada todo ano, mas como essa não é a realidade, o governo fica sem ter como executar nenhum gasto gastos públicos sem aprovação da LDO.

Créditos extraordinários podem evitar paralisia. Mas solução não é consenso

O consultor-geral adjunto de Orçamento do Senado Federal, Flávio Luz, colocou no debate uma possível saída para evitar a completa paralisia da máquina pública. “Isso ocorrendo [não aprovando a LDO], o Executivo poderia recorrer a créditos extraordinários para execução de despesas básicas e urgentes da administração”, disse em entrevista à TV Senado.

O uso de créditos extraordinários nesse caso ainda não é um consenso. Esse crédito só pode ser usado para despesas consideradas urgentes e imprevisíveis, como as decorridas em cenário de guerra ou calamidade pública. O estado de calamidade pública termina em 31 de dezembro e não está nos planos do governo a sua extensão para 2021.

Votação do Orçamento deve ser feita diretamente no plenário

Para evitar essa situação inédita, de completo limbo jurídico, a cúpula do Congresso considera votar a LDO e a LOA direto no plenário. A LDO seria votada em dezembro deste ano e a LOA em janeiro ou março, a depender se o recesso legislativo será cancelado ou não. As datas, contudo, não foram fechadas oficialmente.

A Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados afirma que é possível votar excepcionalmente os dois projetos diretamente no plenário da Câmara e do Senado, sem passar pela Comissão Mista de Orçamento (CMO). Bastaria a anuência de 3/5 (ou 60%) dos líderes das duas Casas.

Ato Conjunto das mesas diretoras da Câmara e do Senado criou um regime de tramitação excepcional (emergencial) de matérias durante o estado de calamidade pública. Com isso, medidas provisórias e projetos, inclusive orçamentários, podem ser votados diretamente em plenário, desde que urgentes e relacionados à Covid-19. No caso de projetos, um requerimento de urgência precisa ser aprovado pelos congressistas.

“O caráter de urgência das leis do ciclo orçamentário pode ser justificado na medida em que orientam a política fiscal e delimitam os recursos públicos da sociedade para as diferentes políticas públicas. Assim, a falta de aprovação desses projetos de lei até o final do exercício financeiro pode criar enorme embaraço à condução do país e à continuidade das políticas públicas, inclusive para a continuidade do combate dos efeitos da pandemia”, explica a nota técnica dos consultores de Orçamento da Câmara.

Situação não chega a ser inédita

O atraso na análise do Orçamento não chega a ser inédito. A votação das peças orçamentárias diretamente em plenário também não. Mas foram poucas as vezes que o país chegou a essa situação de completa indefinição sobre o futuro das contas públicas.

Desde a Constituição de 1988, a LDO só teve de ser votada diretamente em plenário em duas ocasiões: em 1991 e 1998. Em todos os outros anos, ela passou primeiro pela análise da Comissão Mista de Orçamento e depois foi remetida para votação no plenário do Congresso. A LOA também só foi votada diretamente em plenário nos anos de 1993 e 2009.

Agora, desde a Carta Magna, o país nunca começou o ano sem a aprovação da LDO. Os atrasos até são comuns, mas nunca aconteceu de o projeto não ser votado a tempo.

Em sete vezes nos últimos 20 anos, o Congresso Nacional só aprovou a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) no último trimestre do ano. A situação mais caótica foi verificada nos anos de 2006, 2014, 2015 e 2016, quando a aprovação aconteceu em dezembro, o que pode se repetir agora, em 2020.

No caso da LOA, já aconteceu de ela ser aprovada somente no ano do exercício. Foi o que ocorreu, por exemplo, em 2015, quando o país começou o ano sem um Orçamento aprovado. A "sorte", nesse caso, foi que a LDO já tinha sido aprovada em dezembro de 2014, prevendo como seriam feitos os gastos governamentais essenciais.

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