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Prédio do Ministério da Educação, em Brasília.
Prédio do Ministério da Educação, em Brasília.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Nenhum órgão do Executivo tem uma folha de pagamento maior do que o Ministério da Educação (MEC). Em 2020, a pasta gastou R$ 29,2 bilhões apenas para pagar os seus mais de 375 mil funcionários. O Ministério da Saúde, por exemplo, tem um número muito inferior de servidores: 65,2 mil. Somente a Defesa, que engloba o Exército, a Marinha e a Aeronáutica, emprega mais pessoas no Brasil.

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Acontece que a função da Defesa é, por definição, nacional: proteger as fronteiras e assegurar a soberania do território brasileiro. A do Ministério da Educação não necessariamente é. Por isso, há quem questione a necessidade de uma estrutura centralizada para gerir o ensino no país.

Embora ainda sejam uma corrente minoritária, os defensores da abolição do Ministério da Educação fazem cada vez mais barulho - especialmente entre organizações de perfil liberal. O argumento é o de que a gestão das escolas e universidades não precisa de um comando em Brasília encarregado, dentre outras coisas, de estabelecer currículos para o ensino básico, nomear reitores de universidades e distribuir recursos entre prefeituras e governos estaduais.

Anamaria Camargo, mestre em Educação e presidente do Instituto Livre pra Escolher, não tem dúvidas: “Os estudantes e a produção científica do Brasil estariam muito melhor sem o MEC”, afirma ela, que atua pela redução do papel do Estado na educação brasileira. Segundo Anamaria, o ministério tem fracassado em suas funções mais básicas. Citando um estudo do Instituto Paulo Montenegro, Anamaria afirma que um grande número dos universitários brasileiros mal sabe ler. "Temos 29% de universitários chancelados pelo MEC que são semialfabetizados. Ou seja, a chancela do MEC não significa absolutamente nada em termos de garantia de qualidade de aprendizado", diz ela.

"O que acontece na prática é uma padronização de más práticas, de má gestão, de um excesso de gastos e recursos em estruturas, folhas de pagamento, coisas que não são necessariamente o objetivo final da educação", afirma Giuliano Miotto, presidente do Instituto Liberdade e Justiça. Com sede em Goiânia, a organização busca aplicar princípios liberais na educação, dentre outras áreas.

Uma eventual abolição da pasta não significaria o fim dos recursos públicos para a educação, é claro. A arrecadação, que se origina sobretudo nos estados, continuaria existindo. Os gastos é que seriam menores porque a redução de custos com a burocracia seria considerável.

Outra vantagem apontada pelos que defendem o fim do MEC seria a possibilidade de que as diferentes unidades da federação adotassem soluções mais adequadas às suas realidades e às necessidades dos alunos. “Como o Brasil é um país gigante, o fato de ter um órgão centralizador das direções na área de educação cria muitas distorções. O MEC acaba sendo o propagador de uma educação de péssima qualidade”, diz Miotto.

Os críticos do MEC reconhecem, entretanto, que o fim do Ministério da Educação é uma bandeira inviável no curto prazo, já que o tema nem mesmo faz parte da agenda do governo ou do Congresso. Mas eles enxergam possíveis avanços com uma possível redução do escopo da pasta.

Outros países, inclusive muitos dos que têm um bom desempenho nos testes internacionais, não possuem uma estrutura centralizada com amplos poderes. Os Estados Unidos alcançaram um nível de excelência em educação graças sobretudo ao protagonismo da iniciativa privada, das organizações religiosas e das autoridades locais. Somente em 1979 é que o governo resolveu criar o atual Departamento de Educação.

“O 'MEC' dos Estados Unidos foi criado apenas para cumprir uma promessa de campanha que Jimmy Carter tinha feito ao National Education Association (NEA), o maior sindicato do país. Não foi pela educação. Foi pela eleição. Foi pelo corporativismo sindical”, afirma Anamaria Camargo.

Nos Estados Unidos, o executivo federal praticamente não mantém instituições de ensino, com a exceção das academias das forças armadas. O Departamento de Educação tem atribuições bem delimitadas e, não por acaso, possui uma estrutura enxuta quando comparada à do Ministério da Educação do Brasil: o órgão americano tem 4,4 mil funcionários.

A situação é semelhante na Alemanha. É o que diz João Batista de Oliveira, doutor em Educação pela Universidade do Estado da Flórida e presidente do Instituto Alfa e Beto. “Lá também existe um ministério, mas desde o pós-guerra e até recentemente era algo praticamente simbólico. A responsabilidade estava com os estados”, afirma. Em anos mais recentes, diz ele, o ministério ganhou atribuições, mas os estados continuam com autonomia para definir seus modelos educacionais.

Embora acredite que o fim do Ministério da Educação seria uma boa ideia, Oliveira afirma que mudanças menos bruscas nessa direção já teriam um efeito positivo. “Um passo preliminar iria exigir tornar a Constituição mais clara no que diz respeito às responsabilidades da União, Estados e Municípios. E retirar dela a maioria do que nela está sobre educação – inclusive a obtusa ideia de que toda universidade precisa ter ensino, pesquisa e extensão”, defende Oliveira.

O fim do Ministério da Educação também não significa que todas as normas nacionais para a educação serão abolidas, nem que os estados mais pobres ficariam em uma situação orçamentária ainda pior. Nada impede que os entes da federação formem parcerias entre si, de forma horizontal. "O currículo nacional poderia ser feito mediante concordância entre os estados - como é o caso dos Estados Unidos", exemplifica Oliveira.

Para o presidente do Instituto Alfa e Beto, um regime sem ministério poderia funcionar muito bem, desde que fossem mantidos alguns parâmetros legais básicos para a educação brasileira. “Não precisa existir um Ministério de Educação. Mas precisa haver uma unidade mínima para coordenar informações e estimular as inovações. Se o MEC atual deixar de existir, faria muito pouca diferença na educação. E a diferença poderia ser até positiva”, afirma.

MEC tem papel importante, diz especialista

Para a professora Neide Noffs, da Faculdade de Pedagogia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, o problema essencial do Ministério da Educação é a sua má administração, o que pode ser corrigido sem medidas mais drásticas como o fechamento da pasta. “A Educação tinha de ter um plano nacional, seguido por planos estaduais, com o objetivo de reduzir as desigualdades regionais. O papel do ministério nisso seria muito importante porque caberia a ele ter um plano nacional de fato”, afirma ela. “Este plano poderia ser de aplicação voluntária, mas ofereceria uma variedade de cursos não obrigatórios tratando de temas como a Base Nacional Comum Curricular, o atendimento à primeira infância e o Plano Nacional de Alfabetização, para articular as propostas”, afirma. A exigência de um currículo mínimo nacional, por exemplo, ajuda os estados mais vulneráveis na batalha por cobrir as matérias essenciais.

Na avaliação da professora, o ministério tem funcionado de forma pouco eficaz porque atribui para si funções em excesso. Ainda assim, ela admite que a pasta tem uma função importante a cumprir no sistema educacional - especialmente no que diz respeito aos estados com piores índices educacionais.

Apesar de sua posição crítica quanto à missão da pasta, João Batista Oliveira também não acredita que o Ministério da Educação seja inerentemente mal. “O grande problema não é o MEC, é cultural: temos um país habituado à tutela, uma viúva cujos cofres encerram tesouros infinitos para satisfazer as mais variadas demandas, corporações bem articuladas que utilizam a lei para assegurar seus ‘direitos’, e políticos ‘pragmáticos’ que cedem às pressões por dever de ofício”, critica.


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