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| Foto: John Phelan

Harvard quer discriminar racialmente seus candidatos. Mas um grupo de americanos descendentes de asiáticos disse "não". O Departamento de Justiça dos Estados Unidos também diz “não”. Podemos argumentar que a Décima Quarta Emenda (que diz respeito à igualdade perante a lei) diz "não", apesar do que algumas cortes têm determinado de tempos em tempos. "Não" é a resposta certa. E tem sido há muito tempo. 

Talvez Harvard receba a mensagem. Ela está, e tem estado há muito tempo, "do lado errado da história", como um de seus famosos alunos gosta de dizer.  

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A Universidade de Hillsdale, um bastião do conservadorismo, aceita mulheres e afro-americanos como estudantes desde sua fundação, em 1844. 

Já a iluminada Ivy League (liga de universidades americanas composta por instituições renomadas, como Harvard, Princeton, Columbia e Yale) não tem uma história tão boa assim.  

Harvard só formou seu primeiro aluno negro 30 anos após sua fundação – e Princeton demorou mais de um século para fazê-lo. Columbia excluía mulheres de suas faculdades de graduação em artes liberais até 1983. Além disso, a Ivy League tratou mal judeus, discriminando-os em relação a católicos. Os gestores dessas instituições, ontem e hoje, argumentam que discriminações eram realizadas em busca de fins sociais benéficos. A revista de Harvard diz:  

Em Agosto de 1912, o presidente emérito de Harvard, Charles William Eliot, falou para o Clube de Harvard em San Francisco sobre uma questão importante para ele: pureza racial. Ela estava sendo ameaçada pela imigração, declarou Charles. Eliot não se opunha a admissão de novos americanos, mas via a mistura de grupos raciais como um perigo grave. "Cada nação deve manter suas ações puras. Não deveria haver uma mistura de raças", disse.  

O aviso de Eliot sobre a miscigenação - que para ele incluía católicos irlandeses se casando com protestantes anglo-saxônicos, judeus casando-se com pagãos, e negros casando-se com brancos - era um dogma da eugenia. O movimento eugênico, que havia se iniciado na Inglaterra e se espalhava rapidamente pelos Estados Unidos, insistia que o progresso humano dependia da reprodução das melhores pessoas nas melhores combinações, e prevenindo indignos de terem filhos. 

O ex-presidente de Harvard era declarado apoiador de outra causa eugênica de seu tempo: esterilização forçada de pessoas declaradas "débeis mentais", inválidas fisicamente, "criminosas" ou defeituosas em algum outro sentido. Em 1907, o estado de Indiana permitiu a primeira lei de esterilização eugênica do país. Quatro anos depois, em um artigo sobre "A Supressão dos Defeitos Morais", Eliot declarou que a lei de Indiana havia "trilhado o caminho que todos estados livres deviam seguir para se proteger da degeneração moral".  

Vale lembrar que a política de esterilização apoiada pelo presidente de Harvard foi reforçada pelo ex-aluno da universidade, Oliver Wendell Holmes, que, após receber a melhor educação que as melhores instituições ofereciam e alcançar um cargo na Suprema Corte, analisou o caso de uma jovem que havia sido enviada a um hospital mental por "promiscuidade", que engravidara após um estupro, concluindo que "três gerações de imbecis são o suficiente."  

Para a mente progressista, a sociedade é uma fábrica cujo maquinário precisa de ajustes de tempos em tempos. Feitos por quem? Pelas melhores pessoas, como Charles William Eliot e Oliver Wendell Holmes. 

Considerando suas práticas e concepções irracionais, essa mente despreza instituições orgânicas e arranjos sociais que evoluem sozinhos com o tempo. Assim como consideram irracional tudo aquilo que não está sob a disciplina de um plano maior. Em uma sociedade complexa e populosa como a nossa, é impossível que esse plano geral considere a diversidade genuína, muito menos casos individuais específicos. Por isso, é inevitável que pessoas como Charles William Eliot forcem pessoas a determinadas categorias "cruas", geralmente baseadas em características demográficas ou variáveis quantificáveis.  

Isso não é sempre ruim: variáveis quantificáveis, como pontuações em testes padronizados, são uma forma útil para se estabelecer padrões (e pelo menos requisitos mínimos). Também servem para determinar limites a processos baseados em demasiada subjetividade, logo suscetíveis a favoritismos, preconceitos e outras formas de abuso. Mas por trás da teoria organizacional está a ideologia, e Harvard insiste no uso da raça por razões ideológicas ao invés de pedagógicas.  

"As oportunidades dos candidatos de conseguir as credenciais necessárias para uma boa aplicação (sistema norte-americano de ingresso no Ensino Superior, diferente do nosso sistema, baseado na prestação de vestibulares) são muito afetadas pela raça", insiste uma declaração de um grupo de estudantes e ex-alunos da instituição. 

Para eles, a discriminação racial seria necessária “devido ao viés racial dos testes padronizados e às injustiças raciais endêmicas”. Mas nada disso é completamente verdade. 

O grupo de afro-americanos que mais cresce é aquele composto por imigrantes da África e do Caribe e de outros lugares, sendo que muitos tiveram todas oportunidades de acumular credenciais educacionais necessárias e cujo progresso na vida não tem sido significativamente impedido pela sua raça.  

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Um estudo de 1999 sobre admissões nas melhores universidades dos Estados Unidos descobriu que mais de 40% dos candidatos admitidos eram ou imigrantes, ou filhos de imigrantes, ou de famílias miscigenadas. A imigração nas duas décadas subsequentes mudou esse cenário ainda mais drasticamente.  

Considerando o histórico lamentável de Harvard e a dificuldade de concluir até que ponto ações afirmativas beneficiam pessoas para quem elas são criadas para ajudar, talvez seja hora de mudar o foco e julgar os candidatos a essa instituição de acordo com critérios da academia. Fazer isso provavelmente significaria mais americanos de origem asiática estudando nas instituições de elite.  

"Harvard não pratica discriminação contra candidatos de nenhum grupo", insiste a administração da faculdade, em nota. 

A afirmação é nitidamente absurda: se Harvard não estivesse engajada em discriminação racial, então eliminar os critérios baseados na raça não teria efeito nenhum na composição étnica do corpo de estudantes.  

Harvard sabe que esse não é o caso. Talvez Lawrence S. Bacow, atual presidente da instituição, gostaria de visitar alguns estudantes asiático-americanos, explicando pra eles e seus pais como, do ponto de vista institucional, ele não quer muitos deles na universidade.  

A discriminação contra afro-americanos continua. Ainda é uma mancha na nossa identidade nacional. E ela não é limitada a alguns indivíduos retrógados. As instituições sociais rotineiramente falham com negros de suas comunidades. Mas estudantes de qualquer raça que se atrevem a adentrar no processo de admissão em Harvard estão entre os habitantes dos Estados Unidos com quem devemos nos preocupar menos. Eles vão ficar bem, mesmo que não sejam aprovados e terminem em Stanford ou Michigan, ou na pobre e ignorada Universidade do Texas.  

Uma das consequências engraçadas do fato de nossa legislação e discurso da imprensa serem dominados pelas elites é que os problemas de interesse das audiências de elite acabam recebendo maior atenção: quem ingressa em Harvard importa muito para algumas pessoas, e não por causa do seu compromisso com a busca da justiça social.  

O que mais atrapalha os negros americanos não é o fato de que é difícil entrar em Harvard. Se fosse esse o problema, eles poderiam ir até Oxford, onde a taxa de abandono de estudantes negros é de 25% (e de 0% para asiáticos).  

É importante considerar um levantamento da Schott Foundation for Higher Education (Fundação Schott pelo Ensino Superior, em tradução livre), que verifica índices de abandonos e raça, produzindo muitos dados preocupantes: em cidades como Nova Iorque, Los Angeles, Chicago, Houston, Miami e Atlanta, a diferença na taxa de abandono entre negros e brancos é de mais de 20 pontos percentuais em todos os casos. Aqueles que abandonam os cursos não são necessariamente o público de Harvard.  

Se preocupar com quem é admitido em Harvard não vai ajudar muito os afro-americanos no mercado corporativo, e os asiático-americanos possuem argumentos convincentes sobre justiça. Eles não devem sofrer discriminação para atingir os desejos sociais de outro grupo. Isso é injusto e, no longo prazo, impossível de defender, mesmo que Harvard tenha boas intenções.  

E sobre a questão de lidar com seres humanos de acordo com suas raças, Harvard deveria seriamente considerar a possibilidade de que está entendendo tudo errado, assim como tem feito há muito tempo.  

©2018 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês

Tradução: Rafael Baltazar.

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