Dentre as várias missões que a engenheira e funcionária de carreira da Petrobras Magda Chambriard assumiu ao aceitar o cargo de presidente da estatal, acelerar – ou ao menos destravar – a exploração da Margem Equatorial é uma das prioridades.
A busca de petróleo na região depende de autorização do Ibama, que até agora se negou a emitir as licenças ambientais. A executiva diz que o Brasil já perdeu dez anos nessa discussão, e a esta altura ela já não vê espaço para uma discussão técnica. Por isso, mostra disposição para resolvê-la na arena política.
Chambriard conta com o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ele já deu demonstrações de que pretende arbitrar a disputa – e a favor da petroleira.
A Margem Equatorial compreende a área costeira que vai do Rio Grande do Norte ao Amapá. Blocos na região foram arrematados em 2013 por várias empresas nacionais e internacionais. Mas, ao longo dos 11 anos, a dificuldade de obter licença ambiental fez com que boa parte delas desistisse das concessões.
Principal interessada na região, a Petrobras se vê num impasse com o Ibama. O órgão fez novas exigências à empresa, que por sua vez argumenta que só poderá atendê-las se o instituto responder a um pedido de reconsideração feito há mais de um ano.
Na prática, a Margem Equatorial virou uma questão política, que opõe a Petrobras à área ambiental do governo. Um embate que põe de um lado os interessados nos royalties, impostos e empregos gerados pelo petróleo e, de outro, os que defendem que o Brasil deve seguir o que prega em fóruns internacionais e acelerar a transição energética, abandonando a busca por novas jazidas de combustíveis fósseis.
“A Margem foi licitada em 2013. Todo estudo foi feito. A Total estudou e desistiu, assim como a BP. A Petrobras está lá agora com todos os esforços. Não é crível que três grandes petroleiras estejam desempenhando mal seu papel em termos de licenciamento”, disse no Rio de Janeiro, em evento do governo da Arábia Saudita.
A Petrobras tem interesse especial em um bloco da Bacia da Foz do Amazonas (FZA-M-59), onde acredita estar o maior volume em petróleo, cerca de 5,6 bilhões de barris de óleo, segundo estudos da empresa. Localizado no mar territorial brasileiro, o bloco fica defronte à Floresta Amazônica, com sua fauna, flora e populações ribeirinhas e indígenas.
Na Margem Equatorial total estima-se existir ao menos 10 bilhões de barris de petróleo, quantia que justifica o apelido de “novo pré-sal”. O governo estima que o retorno para os cofres públicos pode passar de R$ 1 trilhão.
Antes de assumir Petrobras, Magda Chambriard já cobrava intervenção de Lula na Margem Equatorial
Em uma década, o embate já passou nas mãos de vários governos e presidentes da Petrobras. Chambriard se mostra determinada a resolver a escrever o capítulo final da novela munindo-se de apoio político, já que a questão, segundo ela pontuou, vai além da técnica.
“O que não se resolveu em dez anos dificilmente será resolvido tecnicamente. Eu acho que essa questão transcende a discussão técnica”, disse recentemente, segundo relato do site EPBR.
Para dar celeridade à exploração na Margem Equatorial, a ideia é submeter a decisão de exploração ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), presidido pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, favorável à causa, e trazer o presidente Lula para o centro da questão. “E toda deliberação do CNPE sai assinada pelo presidente da República”, lembrou Chambriard.
Antes de ser presidente da Petrobras, a executiva já defendia uma intervenção do presidente na questão. Para ela, o Ministério do Meio Ambiente (MMA), ao qual o Ibama está subordinado, não poderia “usurpar o poder de concessão da Presidência da República” e, nesse contexto, caberia ao chefe do Executivo intervir. “É ele que tem o mandato para estabelecer as prioridades nacionais, em nome do povo, já que essas outorgas têm o aval do CNPE e da Presidência”, escreveu Chambriard em artigo.
O próprio Lula tem dado declarações nesse sentido. Nesta terça-feira (18), por exemplo, ele afirmou que quem decide é o governo: "O problema é que o Ibama tem uma posição, o governo pode ter outra posição. Em algum momento eu vou chamar o Ibama, a Petrobras e o Meio Ambiente na minha sala para tomar uma decisão. Esse país tem governo e esse governo reúne e decide", disse Lula, em entrevista à rádio CBN.
"Se as pessoas podem ter posições técnicas, vamos debater tecnicamente. O que não dá é para a gente dizer a priori que vai abrir mão de explorar uma riqueza que, se for verdade as previsões, é uma riqueza muito grande para o Brasil", completou Lula.
Com isso, cresce a pressão sobre a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Para a "ala petroleira" do governo, as movimentações políticas são importantes porque o Ibama, embora vinculado ao MMA, tem independência para tomar suas decisões. Em tese, nem o presidente da República pode determinar que o órgão tome esta ou aquela decisão. Com isso, resta o caminho político.
Mesmo com apoio de Lula, "destravar" Margem Equatorial não é simples
Na leitura geral do mercado, embasamento técnico e interesse não faltam à nova presidente da Petrobras, que se fortalece com o apoio de Lula. Além de a nova fronteira ser o bote salva-vidas do setor nas próximas décadas e evitar que o país volte a ser um importador líquido de petróleo, foi Magda Chambriard quem conduziu o leilão da Margem Equatorial na 11.ª Rodada de Licitações de Blocos, em 2013, quando era diretora da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Contudo, especialistas do setor ponderam que vencer a queda de braço não é tarefa tão simples. A briga exige jogo de cintura para articular todas as demandas. E Lula não pretende se indispor com Marina Silva, que é figura respeitada no cenário internacional.
Apesar da força do petróleo, a ala ambientalista já mostrou sua força ao longo dos últimos anos. Tanto que o conflito envolvendo a Margem Equatorial atravessou várias gestões, de diferentes matizes ideológicos.
José Mauro Coelho, ex-presidente da Petrobras e presidente da Aurum Energia, ressalta que um dos entraves é que as licenças são aprovadas por técnicos. Ou seja, quem assume o risco de liberar a exploração de petróleo é a pessoa física, o servidor público, o que torna o processo mais rígido e minucioso.
Ele acredita que se as decisões passassem por comissões, os trâmites seriam mais ágeis e menos conservadores: “Muitos servidores tem visão extremada da questão ambiental. Como a licença é dada por um servidor, ele quer se certificar de toda a segurança”, diz.
Coelho, no entanto, acredita que até o fim deste ano a pauta destrava: “Magda é muito técnica, vai responder a cada pedido do Ibama até conseguir esgotar as justificativas. Ela entra defensora [da exploração da Margem Equatorial] e vem fortalecida pelo governo. É a última grande província petrolífera. Eles vão conseguir, e aí as outras empresas virão a reboque, mas quem vai capitanear é a Petrobras”.
Outros analistas são menos otimistas e consideram que, apesar da incisividade da nova executiva, o meio ambiente não vai dar trégua e a exploração da Margem deve ficar para depois de 2025.
Fato que influencia – e bastante – para essa data é a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP-30), que ocorre no ano que vem em Belém, capital do Pará. A cidade fica na Amazônia e é próxima da região que a Petrobras pretende explorar.
Para o coordenador-geral de mudanças do clima do MMA, Thiago Longo, a decisão do governo só deve ficar para depois do evento. “Não sei se tem timing para isso [decisão sobre explorar a Margem Equatorial[ até a COP-30. Não acho que tenha maturidade até lá”, disse Longo no fim de maio, na saída de um evento do setor, segundo relato do jornal "O Estado de S.Paulo".
Estudo apoiado pelo Greenpeace diz que vazamento na Margem Equatorial atingiria a costa
Um estudo realizado em março pelo Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (IEPA), com apoio do Greenpeace Brasil, concluiu que um eventual derramamento de óleo na região contaminaria centenas de quilômetros do mar brasileiro e de países vizinhos e poderia afetar de “maneira drástica” tanto a vida marinha quanto a população costeira.
O mapeamento foi feito a partir de sete derivadores lançados em pontos estratégicos ao longo da Foz do Amazonas e do Bloco 59, poço de petróleo no litoral do Amapá que a Petrobras pretende perfurar. Esses equipamentos oceanográficos são parecidos com boias e equipados com sensores e antenas que transmitem sua geolocalização e informações em tempo real. O objetivo era acompanhar e simular caminhos e impactos de um possível vazamento de óleo na região.
De acordo com o Greenpeace, o resultado foi que cinco dos sete derivadores atravessaram águas internacionais e chegaram a três países: Guiana Francesa, Suriname e Guiana. Outros dois derivadores, lançados mais próximos à zona costeira e em águas rasas, tocaram a costa do Amapá.
Segundo a organização ativista, os deslocamentos são alertas sobre como a exploração e posterior produção de petróleo na Margem Equatorial brasileira pode trazer consequências graves para a biodiversidade e ecossistema locais e comunidades pesqueiras.
“A Bacia da Foz do Amazonas tem correntes marítimas e costeiras muito fortes, cujas dinâmicas são pouco conhecidas, com um grande carregamento de água do mar para os oceanos. Nessas condições, o que sabemos é que um vazamento de óleo na região causaria uma grande dispersão difícil de ser contida", explica o coordenador da frente de Oceanos do Greenpeace Brasil, Marcelo Laterman.
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