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Nenhum jogador brasileiro da geração atual esteve tão perto da comparação a Pelé como Robinho. Ele impressionou desde cedo pela semelhança física com o Rei e seu futebol. Com Robinho, o Santos ganhou dois títulos nacionais, foi vice da Libertadores e a saiu de uma longa obscuridade para voltar ao rol dos grandes clubes do país. Ele também foi a maior negociação do futebol brasileiro. O Real Madrid pagou US$ 30 milhões por ele no ano passado. Mas a promessa de gols de Robinho não foi tão valiosa quanto um jovem zagueiro contratado meses depois por US$ 33 milhões.

A "Robinhomania" ainda ganhava corpo na Espanha quando o presidente do Real, Florentino Perez, fez a excentricidade de contratar um atleta espanhol, o primeiro em cinco anos. O zagueiro Sérgio Ramos, de 19 anos (três a menos que Robinho) foi revelado pelo Sevilla e já está na seleção nacional. Como pode um zagueiro que ainda não passa de uma revelação custar 10% mais do que um atacante nascido na pátria dos maiores craques do futebol? A lógica não está na habilidade de cada um. Está nos cofres dos clubes de futebol do Brasil e da Europa.

A diferença está mais no campo da geopolítica do que na habilidade do jogador. Um saiu do Brasil para a Europa, enquanto o outro já estava lá. Essas idiossincrasias são medidas na edição 2006 do estudo Auditoria e Negócios no Futebol, publicado em janeiro pela Casual Auditores Independentes S.A. O estudo compara a realidade financeira do futebol em diversos pontos do mundo. O milagre econômico que transformou a bola emuma máquina de fazer dinheiro na Europa ainda engatinha no país pentacampeão.

Em 2004, os 19 maiores clubes do Brasil (entre eles Atlético e Coritiba) tiveram, juntos, faturamento de R$ 825,7 milhões, ou 0,047% do PIB brasileiro. Média R$ 43 milhões por equipe. Nos cinco principais mercados europeus (Inglaterra, Alemanha, França, Itália e Espanha), a média foi de R$ 372 milhões. O reflexo imediato – e óbvio – dessa relação é percebido nas contratações. Para os clubes daqui, qualquer punhado de milhões de dólares por jogadores fora de série torna-se oferta irrecusável. Com boa saúde financeira, os europeus não hesitam em investir pequenas fortunas nesses atletas.

A gênese dessa disparidade está no fim dos anos 1980, quando o futebol inglês deu o primeiro passo rumo ao profissionalismo. Pressionado pela onda de violência dos hooligans, que matava cada vez mais pessoas e afastava as famílias dos estádios, o governo britânico adotou um pacote de medidas para melhorar a segurança do torcedor e as finanças dos times. Com dinheiro estatal, os clubes puderam transformar os estádios em arenas multiuso. Em troca, teriam de profissionalizar sua gestão, com balanço patrimonial obrigatório, previsão de orçamento e avaliação financeira das administrações.

O passo seguinte foi emprestar dos americanos o modelo de ligas para campeonatos. Assim, os torneios nacionais saíram das mãos das federações para o controle dos clubes. E passaram a valer milhões. Em 1992, quando foi criada a Premier League, responsável pelo Campeonato Inglês, tinham receita de US$ 320 milhões. Doze anos mais tarde, já eram US$ 2,5 bilhões, o mais rico do mundo entre os torneios nacionais de futebol. Só perdia para as gigantes americanas NFL (de futebol americano, com US$ 5,5 bilhões), MLB (beisebol, US$ 4,1 bilhões) e a NBA (basquete, com US$ 3 bilhões).

O enriquecimento das ligas se estende aos clubes. Enquanto os dez maiores times de futebol do Brasil tiveram receita de US$ 233,5 milhões em 2004, os 10 mais da Europa apresentaram ganhos de US$ 2,2 bilhões no mesmo período. Além de contar com uma economia mais forte, os europeus usam o tripé estádio–mídia–marca para encher os cofres. Os estádios transformaram-se em pontos turísticos. Em dias de jogos, são lugares para as famílias – que consomem nas lanchonetes e nas lojas de suvenir. Quando a bola não rola, estão abertos a visitantes de todas as partes do mundo.

Na mídia, os clubes europeus se transformaram em empresas de comunicação. Canais de tevê próprio, revista e serviços noticiosos via celular ou internet são algumas das áreas de atuação de equipes comoManchester United e Real Madrid. Além de estreitar a ligação com torcedores e sócios, a investida serve para ganhar dinheiro compublicidade. Venda de espaços publicitários nas camisas, em setores do estádio – ou até acordos de naming rights, similar ao que o Atlético-PR fez com a Kyocera na Arena – completam as receitas.

Isso tudo ocorre na ordem inversa ao que acontece no Brasil. Ao invés de ser principal fonte de receita depois das contratações, na Europa o patrocínio é responsável pela menor fatia do bolo. Em 2004, o Manchester United teve apenas 21,5% da sua receita de US$ 488 milhões vinda de patrocínios. Mídia (37%) e estádio (38,2%) foram as principais fontes de recursos para o clube mais bem-sucedido fora dos gramados no futebol mundial, um modelo para os clubes brasileiros que quiserem conservar seus ídolos no país.

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