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O vocalista da banda U2, Bono, durante apresentação em Madri, em 2018
O vocalista da banda U2, Bono, durante apresentação em Madri, em 2018| Foto: EFE

Antes do U2 alcançar o sucesso, com seu álbum War, de 1983, eles incluíram uma música tirada diretamente do Salmo 40 e não se preocuparam em disfarçar: a música se chamava “40”. Era uma “canção assinatura”, e os meninos costumavam encerrar os shows com ela.

No final dos anos 1980, o U2 se tornou a maior banda de rock do mundo – uma posição que eles têm mantido desde então, sem concorrência real, a menos que você conte Bruce Springsteen e seus colegas da E-Street como uma banda. Depois de chegar ao auge com o álbum The Joshua Tree, eles se dirigiram a Jesus Cristo em “With or Without You” de 1987 – “veja o espinho torcido em seu lado” – e em “I Still Haven't Found What I'm Looking For” entregaram o que um pesquisador classificou como a música de maior sucesso das últimas décadas.

O U2 é uma banda “cristã enrustida”, como o New Yorker perguntou uma vez? Não, eles são alegre e orgulhosamente abertos. Seu cristianismo é tão enrustido quanto a sexualidade de Elton John.

As letras do U2 falam claramente de um coração cristão, e a principal razão pela qual tantos ouvintes não fazem a conexão é simplesmente que, como cultura, esquecemos a Bíblia. A majestade grave e imponente contida nos versos da Bíblia King James (N/T: uma conhecida tradução em inglês) costumava ser um elemento tão básico da cultura anglo-americana que não era necessário ser religioso para estar imerso neles.

Os romances cômicos de P. G. Wodehouse, por exemplo, não contêm nenhum indício de dogma religioso e, no entanto, estão absolutamente saturados de referências à King James. Eis um trecho de The Code of the Woosters (1938): “Eu venho sonhando com um invador enfiando pregos na minha cabeça – não apenas pregos comuns, como os usados por Jael, a esposa de Héber, mas incandescentes.” É um corte profundo.

(N/T: Jael é uma personagem bíblica mencionada no Livro dos Juízes, descrita como a esposa de um homem chamado Héber e responsável por matar um importante general que oprimia o povo judeu)

Pulando para 2000, quando Frank Bruni do New York Times — um produto da elite progressista — estava cobrindo a campanha de George W. Bush e não percebeu uma citação quase direta do Sermão da Montanha: “Sr. Bush também ofereceu uma variação interessante do ditado sobre a panela e a chaleira”, escreveu Bruni em 24 de abril de 2000. “'Não tente tirar o cisco do olho do seu vizinho', disse ele à plateia, “quando você tem uma tora no seu”. No século 21, você pode tranquilamente citar Mateus 7:3 e os editores do jornal mais sofisticado do país não só vão ter um “branco” completo, como vão te citar como uma piada.

O principal letrista do U2, Paul Hewson, também conhecido como Bono, cujos pais eram católicos e anglicanos, falou francamente sobre sua fé em entrevistas, e um escritor contou mais de 50 citações bíblicas nas músicas do U2. Elas não estão concentradas em fases, mas distribuídos ao longo da carreira da banda. “Bullet the Blue Sky” de 1987: “Jacob lutou contra o anjo/e o anjo foi vencido”. “Gloria” de 1981: “Gloria, in te domine [in, you, Lord]... oh Senhor, afrouxe meus lábios”. “Vertigo” de 2004: “Seu amor me ensina a ficar de joelhos”. Do mesmo ano, “Yahweh” cita João 10:18 e o Sermão da Montanha.

Com suas referências a “muitas mansões” e “chaves do reino”, “A Primeira Vez” de 1993 cita tanto Mateus quanto João a caminho de uma nova versão da história do Filho Pródigo de Lucas. Em “Ultra Violet (Light Your Way)”, de 1991, Bono implora a Cristo: “Baby, baby, baby, ilumine meu caminho” em um momento de ansiedade sobre a dificuldade de acessar os dons de Deus: “Você enterra seu tesouro onde não pode ser encontrado/Mas seu amor é como um segredo que foi passado de mão em mão.” “In the Name of Love” (1984) traça um paralelo entre os sacrifícios de Jesus Cristo (“Um homem traído com um beijo”) e o do reverendo Martin Luther King Jr.

Possivelmente, a menção mais arrepiante às Escrituras em uma letra do U2 é “Until the End of the World”, de 1991, na qual o orador é Judas, dirigindo-se a Jesus após a Última Ceia: “Nós comemos a comida, bebemos o vinho...No jardim eu te traí, beijei seus lábios e parti seu coração.” A música segue rumo a um verso culminante que relata os últimos pensamentos do traidor quando ele comete suicídio: “Ondas de arrependimento, ondas de alegria, estendi a mão para aquele que tentei destruir”.

Embora sejam mensageiros falhos, o fato de o U2 conseguir encher estádios de pessoas cantando músicas cristãs os torna uma força cultural relevante.

O U2 em geral, e Bono especialmente, provaram estar totalmente sintonizados com o que significa ser um cristão, pesando seus mistérios, êxtases, dores e dúvidas. No entanto, o cristianismo e a cultura que ele construiu estão se dissolvendo tão rapidamente diante de nossos olhos que até mesmo os incrédulos devem se assustar com a perda.

As igrejas supostamente cristãs estão se afastando do rico e complexo legado bíblico e jogando fora todo o Credo, exceto as injunções vagas e aguadas sobre ser bonzinho e eventualmente pensar nos mais pobres. Nos casamentos, ouvimos uma ocasional referência sorridente ao amor conforme descrito na Carta dos Coríntios. Tudo muito insosso. O amor não é orgulhoso, e o cristianismo não é uma coleção de ímãs de cozinha com frases motivacionais.

©2022 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês
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