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Ronald Reagan: o conservadorismo na presidência americana
Ronald Reagan: o conservadorismo na presidência americana| Foto: Divulgação

Em cinco décadas o conservadorismo americano passou da oposição para o protagonismo na política dos Estados Unidos. O movimento baseado em liberdades individuais, livre mercado e valores cristãos, porém, tem origem na própria formação do país e passa por um processo de retomada na esfera pública.

“O conservadorismo é uma herança, não uma ideologia”, afirma Ted McAllister, professor de Políticas Públicas na Pepperdine University e autor do livro “Coming Home: Reclaiming America’s Conservative Soul” (“Voltando para casa: retomando a alma conservadora da América”, em tradução livre).

“Somos um povo conservador em nossos ossos, em nosso DNA social”, acrescenta McAllister. “Os americanos são conservadores porque confiam nas lições da experiência e amam o mundo cultural, social e intelectual que herdaram, mesmo com todas as suas falhas.”

Origens 

O conservadorismo atual começou a se consolidar a partir da década de 1970, quando o crescimento econômico do pós-guerra começou a estagnar nos EUA. O cenário se desenhou após um período de políticas progressistas que não mantiveram resultados positivos para a economia norte-americana. Como resposta, um novo movimento surgiu para argumentar que altos níveis de tributação e a regulamentação intrusiva do governo em empresas privadas estavam prejudicando o crescimento econômico.

Esse movimento se posicionou como defensor dos valores da classe média, como economia, trabalho e liberdade individual, os quais consideravam estar sob ataque na revolução cultural da década de 1960, vista como hedonista pelos setores conservadores. Ao mesmo tempo, o contexto da Guerra Fria acendeu a necessidade de combater a ameaça comunista nos Estados Unidos e no mundo ocidental, uma das bandeiras principais do conservadorismo no seu renascimento.

“Embora o conservadorismo como o conhecemos hoje seja um movimento relativamente novo — surgiu após a Segunda Guerra Mundial e só se tornou uma força política na década de 1960 — ele se baseia em ideias tão antigas quanto a própria civilização ocidental”, diz Alfred S. Regnery, que atuou no  Departamento de Justiça durante o governo Reagan.

“Os fundamentos intelectuais sobre os quais esse movimento foi construído remontam à antiguidade, foram desenvolvidos durante a Idade Média e na Inglaterra dos séculos XVIII e XIX e foram finalmente formulados em uma filosofia política coerente na época da fundação dos Estados Unidos”, conta.

Alicerces 

O conservadorismo americano é baseado em quatro pilares que sustentam tanto a política quanto os valores sociais: liberdade, tradição, crença em Deus e Estado de Direito. O primeiro deles, a liberdade aplica-se a todos os âmbitos das liberdades individuais: liberdade de expressão, religiosa, econômica e livre mercado.

“Isso significa a capacidade de seguir seus próprios sonhos, de fazer o que você deseja (desde que não prejudique os outros) e colher os frutos (ou enfrentar as penalidades). Acima de tudo, significa liberdade da opressão por parte do governo”, afirma Regnery.

Paralelo a isso, o conservadorismo também busca preservar valores que foram estabelecidos ao longo dos séculos para a organização da sociedade. Simultaneamente, o movimento adere aos conceitos amplos da fé religiosa como justiça, virtude, caridade e comunidade — e esses conceitos que são resumidos como a fé em Deus lançam as bases para a filosofia conservadora e definem um padrão para a política.

“Os conservadores acreditam que deve haver uma ordem moral que sustenta a ordem política. Esse pilar do conservadorismo não significa misturar fé e política, e certamente não significa resolver disputas religiosas politicamente. Também não significa que os conservadores tenham o monopólio da fé, ou mesmo que todos os conservadores sejam necessariamente crentes”, explica Regnery.

Já o Estado de Direito é defendido como um modelo que promove a prosperidade e protege a liberdade. O aspecto fundamental é um sistema legal previsível, que permita às pessoas saber quais são as regras e aplicá-las igualmente para todos. O objetivo é evitar que o governo tenha mais poder sobre os indivíduos: tanto os governantes quanto os governados estão sujeitos ao mesmo sistema legal.

Consolidação 

Os valores centrais do conservadorismo foram incorporados pelos presidentes republicanos Ronald Reagan (1981-89) e George W. Bush (2001-09). Primeiro presidente conservador moderno, Reagan representa a consolidação do conservadorismo como movimento de governo nos Estados Unidos.

Durante a Era Reagan, o presidente americano solidificou a força conservadora na política nacional com cortes de impostos, aumento dos gastos com defesa, desregulamentação, fortalecimento das forças armadas e apelo aos valores da família e à moral cristã. Sua influência sobre o conservadorismo americano é tão grande que a Era Reagan continua sendo o padrão conservador para questões sociais, econômicas e de política externa.

“Não é exagero dizer que a maioria dos conservadores de destaque de hoje — políticos, acadêmicos, ativistas, doadores ou escritores — começou, de uma maneira ou de outra, trabalhando para Ronald Reagan”, diz Regnery.

Já o novo conservadorismo rompeu com o antigo na política externa, adotando uma postura intervencionista que os separava das tendências isolacionistas de conservadores anteriores. Segundo esse novo movimento, os Estados Unidos, enquanto potência mundial, tem o dever de intervir nos assuntos de outras nações, a fim de promover os interesses de liberdade e livre mercado.

Essa abordagem foi mais evidente durante o governo de George W. Bush: sua presidência foi marcada pela política externa decorrente dos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, que acabaram resultando em ataques ao Iraque e Afeganistão. Sua participação em questões internacionais, porém, não se limitou a guerras: Bush lançou um programa de ajuda externa para combater a Aids na África, que pode ser considerado uma das iniciativas no âmbito das relações internacionais que mais salvou vidas em toda a história humana.

No cenário interno, Bush sancionou cortes de US$ 1,35 trilhão em impostos em 10 anos. Um relatório do Comitê de Finanças do Senado dos Estados Unidos estimou que, com se todas as reduções planejadas fossem totalmente implementadas, a família americana média de quatro pessoas que ganhava US$ 50.000 por ano economizaria US$ 1.825 anuais.

Desafios contemporâneos 

Nos últimos anos, questões sociais como aborto, controle de armas e casamento gay passaram a ocupar o centro dos debates conservadores. Desde 2009, o movimento Tea Party mobilizou os conservadores contra as políticas adotadas por Barack Obama, levando a ganhos de espaço em 2010 e em 2014, até a eleição do presidente republicano Donald Trump em 2016.

“Hoje, os conservadores sociais trabalham para fortalecer os valores da família. Eles se opõem ao aborto, casamento entre pessoas do mesmo sexo e permissividade sexual. Eles também defendem o fortalecimento dos padrões tradicionais em educação e um papel maior para a fé religiosa na vida pública”, afirma Alfred Regnery.

Ao mesmo tempo, o retorno ao passado do conservadorismo americano está focado em preservar os ideais de fundação da nação: direitos naturais, governo limitado e separação de poderes.

“As pessoas pensam que os conservadores só querem conservar o passado”, afirma George Will, analista político e ex-membro do Partido Republicano. Segundo ele, o atual conservadorismo americano tem uma premissa clara: preservar uma sociedade aberta à mudança dinâmica constante.

“O que conservadorismo conservou? Conservou a vida, a liberdade e a prosperidade. Isso faz com que seja um dos mais importantes e bem-sucedidos movimentos da história norte-americana, a despeito de quaisquer alegações de seus detratores”, afirma o veterano de guerra David French.

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