Detentor dos “meios de produção”, Pedro Cardoso ignora a história e se vende como proletário em defesa dos “injustiçados”.| Foto: Reprodução/ TV Cultura

"É divertidíssima a esquizofrenia de nossos artistas e intelectuais de esquerda: admiram o socialismo de Fidel Castro, mas adoram também três coisas que só o capitalismo sabe dar - bons cachês em moeda forte; ausência de censura e consumismo burguês", ironizava o escritor e diplomata Roberto Campos. O ator Pedro Cardoso se adequa ao estereótipo criticado.

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O ator lançou recentemente o livro Eu mesmo: Em busca de um diálogo contra o fascismo brasileiro (Ed. Record), que reúne textos publicados em sua conta no Instagram entre setembro de 2016 e março de 2019. Na obra, ele se apresenta como cidadão que busca dialogar com autoritários. Primo de segundo grau de Fernando Henrique Cardoso, ele afirma que nunca votou no tucano por ter considerado à época que “o país precisava de um representante dos pobres no poder, não um intelectual”.

Apesar do histórico de esquerda, a guinada marxista do ator, que discursa contra “relações de dominação econômica”, afirmando que “se não nos libertarmos dessa estrutura de exploração do trabalho pelo capital todas as outras questões [da vida] ficam abaixo disso” é mais recente. Se referindo ao presidente da República Jair Bolsonaro ao falar sobre o “fascismo vigente no Brasil”, Cardoso tem causado polêmica nas entrevistas de divulgação do livro com essas e outras declarações.

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Um exemplo se deu quando o ator foi questionado se enriqueceu ao estrelar Agostinho Carrara no seriado A Grande Família, durante entrevista ao programa Provocações, da TV Cultura, apresentado por Marcelo Tas. Na ocasião, Pedro Cardoso respondeu:

“Nenhuma pessoa fica rica sem explorar a mais-valia imensamente.(...) Estou para encontrar um economista que mostre outra estrutura de ficar rico que não seja você não dividir a riqueza do seu trabalho de maneira justa com as pessoas que produziram esse trabalho para você. (...) Eu era um cara de esquerda, agora sou uma pessoa de extrema esquerda (risos). (...) Quem ficou rico com o Agostinho foi a Rede Globo, o capitalista daquele negócio, que tem possibilidade de ficar rico”.

O ator se refere à Teoria da Exploração idealizada por Karl Marx no século XIX. O sociólogo afirmava que a burguesia detém os meios de produção de riqueza, utilizando de sua supremacia econômica para explorar o proletariado, a classe que só pode viver vendendo sua força de trabalho aos capitalistas.

Porém, já faz tempo que virou consenso acadêmico a ideia de que a relação entre empreendedores e empregados gera ganhos mútuos para os envolvidos, sendo uma relação de cooperação.

Se A Grande Família foi um sucesso, ficando no ar entre 2001 e 2014, o ator apenas teve a oportunidade de atuar na série em virtude de a quarta maior emissora do planeta ter assumido riscos e investido muito dinheiro em direitos autorais, produção, cenário, direção, filmagens, etc. A série contou com dezenas de roteiristas e autores, além de Pedro Cardoso. Para cada produção global de sucesso, há outras que amargam prejuízos. Sem o ator, a série provavelmente não teria o mesmo sucesso; sem a emissora, Pedro não teria obtido os rendimentos e projeção de imagem que passou a ter.

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Ele próprio admitiu, em entrevistas do passado, que ganhou “muito dinheiro na publicidade”. Seus cachês não seriam tão altos se não fossem pelo destaque obtido por interpretar Agostinho Carrara. Isto é, atuar em A Grande Família não lhe rendeu apenas salários diretos, mas renda indireta, com o aumento dos valores em participações publicitárias.

Apesar de provavelmente ter renda e patrimônio superiores aos da maioria dos brasileiros, Pedro Cardoso, que atualmente mora em Portugal, lamenta suas condições financeiras, colocando-se ao lado da classe proletária. “Tenho 57 anos e não tenho uma economia que não me possibilite trabalhar”, lamenta, como se essa não fosse a realidade de quase todos os brasileiros. Ele afirma que não tem uma “estrutura de exploração do trabalho de outras pessoas”, como se não estivesse demonizando justamente a atividade empreendedora. “Não acho isso uma relação justa, acho isso uma relação que produz pobreza, por isso sou de extrema esquerda, sem o aspecto ditatorial da extrema esquerda, mas da convicção da responsabilidade social”, disse. Pedro ignora que o número de pessoas vivendo em extrema pobreza é o menor em 200 anos. Graças ao capitalismo as pessoas estão vivendo mais e melhor.

Apesar disso, Pedro Cardoso tem duas empresas ativas no Brasil: a 4004 Produções de Arte LTDA, fundada em 2001, e a Produções de Arte LTDA. Ambas prestam serviços de produção cinematográfica, filmes para publicidade e artes cênicas. No passado, Pedro também foi sócio da Cosmo Filmes LTDA, que era um estúdio cinematográfico.

Não é a única declaração contraditória feitas pelo ator. Ele afirma que “o homem brasileiro liberta a mulher dele do serviço doméstico ao escravizar as mulheres mais pobres”, quando ele próprio admite ter empregada doméstica. E não, não é escravidão, é contrato de trabalho, como qualquer outro, com ganhos e benefícios mútuos para ambas as partes.

Pedro Cardoso se tornou detentor de patrimônio milionário, mas faz críticas a pessoas que têm muito dinheiro. Em entrevista dada a Leda Nagle em 2018, ele afirmou que “não há nenhum modo de um homem ficar milionário que não seja roubando os outros, entende? Não há”.

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Ele próprio afirma que sua família “tinha dinheiro” e que foi “criado “dentro do Country Club", o clube mais seleto do Rio de Janeiro, frequentado pela elite carioca.

Talvez as críticas anticapitalistas à emissora carioca tenham relação com ressentimento por parte do ator. Pedro Cardoso passou mais de três décadas na Globo, como roteirista e, posteriormente, ator. Após o término da série, seu contrato não foi renovado e o ator passou a criticar a emissora. Dessa forma, diretores da Globo passaram a considerá-lo ingrato e optaram por não trabalhar mais com ele.  "Se o ator não gosta da emissora ou acha que foi injustiçado por ela, deve procurar trabalho em outra freguesia", resumiu o colunista de entretenimento Daniel Castro ao analisar a situação do ator.

Pedro Cardoso é um burguês capitalista que mora em cidade europeia, mas se exibe como proletário para vender preocupação social a favor dos injustiçados. Como bem disse certa vez o ator americano Kevin Spacey, “a opinião de um ator sobre política não importa m&$%# alguma”.

É o caso do ex-intérprete de Agostinho Carrara.

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