• Carregando...
Fachada da Suprema Corte dos Estados Unidos. | Beatrice Murch/Flickr/Reprodução
Fachada da Suprema Corte dos Estados Unidos.| Foto: Beatrice Murch/Flickr/Reprodução

O presidente Donald Trump deve anunciar, no dia 9 de julho, seu candidato para substituir o ministro Anthony Kennedy na Suprema Corte dos EUA. Em 2016, durante sua campanha presidencial, Trump fez uma lista de potenciais candidatos à vaga no Supremo Tribunal, e já alterou a lista duas vezes — aumentando para 25 o número de juízes conservadores que considera altamente qualificados. Veja a lista completa.

Embora a relação esteja repleta de indivíduos do mais alto calibre, alguns nomes parecem ganhar destaque. Uma breve análise dos registros judiciais e sentenças desses homens e mulheres revela suas ideias e perspectivas em relação a uma ampla gama de questões. Estes são os destaques das carreiras e as sentenças desses juízes:

1. Amy Coney Barrett 

Juíza do Tribunal de Apelação do 7.° Circuito dos EUA

Idade: 46 anos

Formação: Rhodes College; Escola de Direito de Notre Dame 

Assessorou: Laurence Silberman, do Tribunal de Washington D.C., e ministro Antonin Scalia, da Suprema Corte, falecido em 2016.

Amy Barrett é juíza do Tribunal do 7.º Circuito, órgão de segundo grau para os estados de Illinois, Indiana e Wisconsin. Trump indicou a magistrada para seu atual cargo no 1.º semestre de 2017, e sua nomeação foi confirmada em outubro do mesmo ano, por 55 votos a favor e 43 contra, sendo que os senadores do partido democrata Joe Donnelly (de Indiana), Tim Kaine (da Virginia) e Joe Manchin (de West Virginia) votaram a favor de sua indicação. 

Na audiência de nomeação, os senadores democratas repreenderam Barrett por alguns artigos publicados quando ela ainda era estudante de Direito, em 1998, e fizeram perguntas inapropriadas sobre sua fé católica. Ela respondeu que “nunca é apropriado para um juiz impor sobre a lei suas convicções pessoais, sejam elas derivadas da fé ou qualquer outra crença”. 

Barrett teve presença de espírito durante sua controversa sabatina de confirmação, e recebeu forte apoio da comunidade jurídica de ambos os partidos, inclusive de Neal Katyal, um proeminente progressista que atuou como procurador-geral interino na presidência de Barack Obama.

Confira: Aborto deve ser questão fundamental na indicação de Trump à Suprema Corte

A maior parte de sua carreira foi trilhada no meio acadêmico, mas depois de dois estágios com juízes, Barrett trabalhou em uma firma de advocacia, onde fez parte da equipe que defendeu George W. Bush no caso Bush vs. Gore, a respeito da recontagem de votos das eleições presidenciais de 2000.

Como professora, teve rápida passagem pela Universidade George Washington e pela Universidade da Virgínia, antes de ser contratada Faculdade de Direito da Universidade de Notre Dame em 2002. Barrett também atuou por seis anos no Comitê Consultivo das Normas Federais de Procedimentos de Apelação. 

Ela é uma escritora prolífica, tendo publicado artigos em importantes revistas jurídicas dos EUA sobre tópicos como originalismo, jurisdição do tribunal federal e o poder de supervisão da Suprema Corte. Em um artigo onde discute jurisprudência e precedentes processuais, ela explicou que “a resposta pública a casos controversos como Roe [v. Wade] reflete a rejeição pública da proposição de que stare decisis possa declarar um vencedor permanente em uma luta constitucional ferrenha, em vez de desejar que o precedente permaneça para sempre imutável”.

Em outro artigo, Barrett examinou o conflito entre a lei e as opiniões religiosas de um juiz católico sobre a pena capital. Ela e o coautor da pesquisa concluíram que “os juízes não podem – nem devem tentar – alinhar nosso sistema legal com o ensino moral da Igreja, sempre que houver divergência. Eles devem, no entanto, conformar seu próprio comportamento ao padrão da Igreja”.

Desde sua entrada na magistratura ela foi autora de oito pareceres, incluindo os de casos relacionados a responsabilidade de consumo, cumprimento de acordos de arbitragem, preempção federal, diretrizes de condenação, reivindicação de benefícios por invalidez e cobrança de dívidas.

No caso Schmidt v. Foster, que envolvia a aplicação da 6.ª Emenda da Constituição dos EUA* a advogados em processos não contenciosos, Barrett escreveu um voto divergente. Ela explicou: 

A Sexta Emenda foi concebida ‘para minimizar o desequilíbrio no contraditório que, de outra forma, resultaria na criação de um oficial de promotoria profissional’. Embora a proteção da Emenda não se limite ao julgamento formal, ‘a Corte vem reiteradamente aplicando uma interpretação histórica dessa garantia, tendo estendido o Direito Constitucional a um advogado somente quando surgem novos contextos apresentando os mesmos perigos que deram origem inicialmente ao direito em si’. Os “novos contextos” aos quais a Corte estendeu o direito invariavelmente envolvem um confronto entre o réu e a outra parte, seja um promotor, a polícia ou um de seus agentes. 

As opiniões judiciais restritas e os artigos acadêmicos de Barrett indicam um compromisso com o originalismo* e o legalismo, na linha de seu antigo chefe, Antonin Scalia.

2. Tom Hardiman 

Juiz do Tribunal de Apelação do 3.° Circuito Regional (Pensilvânia) 

Idade: 53 anos

Formação: Universidade de Notre Dame; Escola de Direito da Universidade de Georgetown 

Tom Hardiman é juiz do 3.º Circuito, que tem jurisdição sobre Delaware, Nova Jersey, Pensilvânia e Ilhas Virgens. 

Antes de se tornar juiz, trabalhou por vários anos em escritórios de advocacia de prestígio em Pittsburgh e Washington, D.C. Como advogado, defendeu com sucesso (trabalhando pro bono) o Condado de Allegheny, na Pensilvânia, contra uma ação movida por um grupo de ateus que se opuseram à exibição de uma placa dos Dez Mandamentos ao lado do fórum do condado.

Em 2003, o presidente George W. Bush indicou Hardiman para uma vaga no Tribunal Distrital dos EUA em Pittsburgh, e em setembro de 2006 Bush o indicou para o Tribunal do 3.º Circuito. Ele foi confirmado pelo Senado por 95 votos a 0, um feito raro para indicados durante a presidência de Bush, considerando que a Casa era controlada pelos democratas.

Leia: Trump já entrevistou sete candidatos para a Suprema Corte

Hardiman era unanimemente considerado a “próxima opção” de Trump para a Suprema Corte, após Neil Gorsuch, que assumiu a vaga aberta com a morte de Scalia. Isso se deve, em parte, à estreita relação de Hardiman com a irmã do presidente, a juíza Maryanne Trump Barry, que também atua no 3.º Circuito. 

O juiz atuou em centenas de casos de apelação e escreveu sentenças notáveis sobre a 2.ª Emenda, direitos do presidiário e liberdade religiosa.

Em 2013, em Drake v. Filko, Hardiman discordou da decisão do tribunal onde atua em confirmar uma lei de Nova Jersey que exige que aqueles que buscam uma licença de porte de arma demonstrem uma “necessidade justificável”. Hardiman argumentou que, sob parecer de 2008 da Suprema Corte acerca do caso Distrito de Columbia v. Heller, a 2.ª Emenda se estende para além do lar e abrange o direito inerente de legítima defesa.

Além disso, em 2016, no caso Binderup v. Procurador Geral, no qual o tribunal decidiu que duas pessoas condenadas por crimes não violentos não deveriam perder seu direito de portar armas, previsto na 2.ª Emenda, Hardiman concordou com a decisão, escrevendo que “uma lei que coloca o ônus sobre pessoas, armas ou condutas protegidas pela 2.ª Emenda, e que o faz de forma que a essência do direito seja dilacerada, é inconstitucional”.

O voto de Hardiman no caso Florence v. Board of Chosen Freeholders, de 2010, defendeu a constitucionalidade da política prisional da Pensilvânia de revistar todos os presos, independentemente do crime pelo qual eles foram condenados, o que foi confirmado pela Suprema Corte. No entanto, no caso no caso Robinson vs. Superintendente, de 2016, Hardiman decidiu a favor de uma impugnação apresentada por um presidiário. 

Já em 2009, no caso Busch v. Distrito Escolar de Marple Newtown, o juiz apresentou um voto divergente, argumentando que não deveria ter sido negada a uma mãe cristã evangélica a oportunidade de ler a Bíblia durante uma apresentação na sala de aula de seu filho, aluno do jardim da infância. 

No caso Kelly v. Distrito de Carlisle, em 2010, Hardiman foi o relator do voto, seguido pela maioria do tribunal, a favor de um policial, argumentando que ele não poderia ser processado civilmente porque no momento da conduta em questão não havia sido claramente estabelecido o direito, baseado na 1.ª Emenda, de filmar policiais durante paradas de trânsito.

Além de um sólido histórico de serviço judicial, Hardiman também tem uma história pessoal interessante: ele foi o primeiro de sua família a entrar na faculdade e trabalhou como taxista para se sustentar e pagar seus estudos.

3. Brett Kavanaugh 

Juiz do Tribunal de Apelação do Circuito de Washington D.C. 

Idade: 53 anos

Formação: Universidade de Yale; Faculdade de Direito da Universidade de Yale 

Assessorou:  Walter Stapleton, do 3.° Circuito; Alex Kozinski, do 9.º Circuito e o ministro Anthony Kennedy, da Suprema Corte.

Brett Kavanaugh atuou por 12 anos no poderoso Circuito de Washington D.C., considerado o principal trampolim para a Suprema Corte. Antes de ingressar na magistratura, trabalhou como advogado sênior e assistente do presidente George W. Bush. Também atuou junto do advogado independente Ken Starr - e foi o principal autor do relatório Starr apresentado ao Congresso sobre o escândalo de Monica Lewinsky. Bush indicou Kavanaugh para o Circuito de D.C. em 2003, mas sua nomeação só foi confirmada em 2006, por uma votação de 57 a 36.

Kavanaugh escreveu uma grande quantidade de artigos sobre a separação dos Poderes e interpretação estatutária, além de ser coautor de um livro sobre precedentes judiciais (juntamente com Bryan Garner e 11 juízes de apelação, incluindo o então juiz Neil Gorsuch). 

Com base em sua experiência de trabalho com Bush, Kavanaugh argumentou, em artigo, que o Congresso deveria considerar a promulgação de uma lei que proteja um presidente em exercício contra eventuais investigações criminais, acusações ou processos judiciais, enquanto estiver no cargo.

Ele explicou que ‘a acusação e o julgamento de um presidente em exercício (...) enfraqueceriam o governo federal, tornando-o incapaz de funcionar com credibilidade em âmbito nacional e internacional. Isso não atenderia ao interesse público, especialmente em tempos de crise financeira ou segurança nacional’.

Em 2017, ele fez a célebre palestra “Joseph Story Distinguished Lecture”, na Heritage Foundation – seguindo os passos do Ministro Clarence Thomas e muitos outros renomados juízes federais. Na ocasião, falou com eloquência sobre a função essencial do Judiciário para a manutenção da separação dos poderes.

Como juiz, Kavanaugh foi autor de inúmeros votos judiciais, incluindo o caso PHH Corp. v. Agência de Proteção Financeira do Consumidor, de 2016, em que concluiu que a estrutura da Agência de Proteção Financeira do Consumidor é inconstitucional (decisão que foi posteriormente revertida pelo Circuito de D.C.).

No caso envolvendo a coalizão para o caso Regulamentação Responsável v. EPA (2012), discordou da decisão de seu tribunal de que a Agência de Proteção Ambiental poderia descartar a análise de custo-benefício ao considerar uma norma proposta. A Suprema Corte reverteu essa decisão posteriormente, citando o voto dissidente de Kavanaugh.

Em Loving v. IRS (2013), Kavanaugh determinou que o IRS (serviço de receita do Governo Federal dos EUA) excedeu sua autoridade estatutária ao tentar regular os preparadores de impostos. 

E no caso al-Bahlul v. EUA (2015), Kavanaugh acompanhou o voto do tribunal (que não identifica o juiz relator), que confirmou a condenação de Ali Hamza al-Bahlul por uma comissão militar por conspiração para cometer crimes de guerra. 

Antes da decisão da Suprema Corte no célebre caso Cidadãos Unidos v. FEC, sobre o financiamento de campanhas, a sentença de Kavanaugh no caso Emily's List v. FEC (2009) decidiu que o regulamento da comissão – que restringe a forma como organizações sem fins lucrativos arrecadam e gastam dinheiro – viola a 1.ª Emenda.

Veja também: No Brasil, próximo presidente pode indicar até 5 nomes para o STF; por que o eleitor deve se preocupar

Ele foi o relator do voto no caso do Re In Condado Aiken (2013), que acusava o governo Obama de desrespeitar a lei federal em uma disputa judicial envolvendo o armazenamento de resíduos nucleares em Yucca Mountain, Nevada. 

Kavanaugh desapontou alguns conservadores com um voto divergente em Seven-Sky v. Holder (2011), argumentando que os tribunais federais não tinham jurisdição para decidir a objeção constitucional ao Obamacare. Ele explicou que “há uma inclinação natural e compreensível para decidir essas questões constitucionais pesadas e históricas. Mas, no meu respeitoso julgamento, decidir questões constitucionais, neste caso, neste momento, violaria um importante estatuto federal de longa data, a Lei Anti-Liminar, o que limita cuidadosamente a jurisdição dos tribunais federais sobre assuntos relacionados a impostos”.

No segundo semestre de 2017, discordou da decisão do Circuito de D.C. no caso Garza v. Hargan, que permitiu que uma imigrante ilegal menor de idade fizesse um aborto imediatamente, estando sob custódia federal. 

Kavanaugh tem se destacado como um jurista ponderado, que não tem medo de assumir posições ousadas sobre questões complexas. Por isso nós o incluímos na lista da Heritage Foundation de potenciais candidatos à Suprema Corte.

4. Raymond Kethledge 

Juiz do Tribunal de Apelação do 6.º Circuito (Michigan) 

Idade: 51 anos

Formação: Universidade de Michigan; Escola de Direito da Universidade de Michigan 

Assessorou: Ralph Guy, Jr., do 6.° Circuito, e o ministro Anthony Kennedy, da Suprema Corte.

Raymond Kethledge atua como juiz no Tribunal do 6.º Circuito, que decide recursos de Kentucky, Michigan, Ohio e Tennessee. 

Além de atuar como advogado para o então senador republicano Spencer Abraham, de Michigan, no Comitê do Judiciário, ele trabalhou vários anos em uma firma de advocacia e foi conselheiro interno da Ford Motor Co., além de dedicar boa parte do seu tempo advogando pro bono e apoiando causas e instituições de caridade. 

Em 2006, o presidente George W. Bush o indicou para o 6.º Circuito. Sua confirmação foi adiada por quase dois anos porque os dois senadores democratas de Michigan pressionaram Bush para indicar Helene White (uma candidata indicada por Clinton, antes de Bush) para preencher uma segunda vaga naquele tribunal. Depois que Bush concordou em indicar White, a indicação de Kethledge foi confirmada por votação oral, sem oposição.

Kethledge é um dos coautores do livro Lead Yourself First: Inspiring Leadership Through Solitude (“Seja, Antes, seu Próprio Líder: Liderança Inspiradora Através da Solidão”, em tradução livre), que traça o perfil de líderes como o Papa João Paulo II, Martin Luther King Jr. e o secretário de Defesa James Mattis. Ele escreveu:  

Algumas decisões de liderança trazem consequências que vão além da esfera profissional. Frequentemente, essas consequências tomam a forma de crítica moral, onde os oponentes criticam não apenas a decisão em si, mas a pessoa que ousa tomá-la... [dizendo] que ela é egoísta, irresponsável ou insensível. O objetivo dessas críticas é reforçar a conformidade e, portanto, impedir que o líder tome essas decisões. No entanto, é a coragem moral que fará com que ele as tome. Isso requer não apenas clareza, mas convicção.

Também escreveu um artigo sobre ambiguidade e deferência a agências para a revista jurídica Vanderbilt Law Review, no qual ele criticou a doutrina Chevron – que demonstra considerável deferência às agências legislativas na interpretação de estados ambíguos – e rejeitou a confiança no histórico legislativo de interpretação de estatutos. No mesmo artigo ele também argumentou que o papel do juiz em casos estatutários e constitucionais é aplicar “o significado que os cidadãos sujeitos à lei teriam atribuído a ela no momento em que foi aprovada”.

Em seus votos, Kethledge imprime um estilo de escrita espirituoso, tendo abordado uma série de questões políticas controversas. Em 2016, foi o relator do voto no caso Estados Unidos v. NorCal Tea Party Patriots, envolvendo uma ação coletiva impetrada por várias organizações conservadoras (Tea Party), que buscavam informações do IRS (Receita Federal) para esclarecer se elas tiveram a prerrogativa de isenção fiscal negada devido às suas crenças políticas. 

Kethledge rejeitou o argumento do IRS e repreendeu os advogados do governo por não defenderem “a longa e célebre tradição do Departamento de Justiça de defender os interesses da nação e aplicar as leis – todas elas, não apenas algumas – de maneira digna do nome do departamento”.

Já em 2014, no caso EEOC v. Kaplan Higher Education Corp., a comissão processou a Kaplan, uma empresa de educação com fins lucrativos, por executar verificações de crédito em potenciais alunos de seus cursos. A EEOC alegou que isso causou um “impacto desigual” sobre afro-americanos e não havia uma justificativa comercial.

Em um voto reproduzido pelo conselho editorial do The Wall Street Journal como a “Opinião do Ano”, Kethledge rejeitou o argumento da EEOC, observando que a verificação de crédito reclamada era precisamente “o mesmo tipo de verificação de antecedentes que a própria EEOC utiliza”. 

Kethledge explicou que o processo de verificação de crédito era “racialmente cego” e que a Kaplan tinha boas razões para realizar verificações de crédito em “candidatos a cargos que terão acesso a informações financeiras de empréstimos dos alunos”, porque no passado alguns funcionários “roubaram pagamentos” e “negociaram em causa própria”.

Confira: Uma suprema oportunidade para Trump

Em 2013, foi o relator do voto da maioria no caso Bailey vs. Callaghan, Kethledge, defendendo a lei de Michigan que proíbe os distritos escolares de cobrar taxas dos sindicatos dos professores através de uma dedução na folha de pagamento. Também em 2013, no caso Bennett v. State Farm Mutual Automobile Insurance Co., Kethledge foi autor de um voto que responsabilizou a State Farm pelas lesões sofridas por uma pedestre quando ela foi atropelada e jogada sobre o capô de um carro cujo motorista era segurado pela State Farm.

A State Farm argumentou que a ação contra ela era “ridícula”, porque sua apólice cobria apenas os “ocupantes” de um veículo. Em uma análise legalista clássica, Kethledge reconheceu que no jargão comum o termo “ocupante” não incluiria alguém temporariamente no capô de um carro. Ele acrescentou, no entanto, que a própria apólice da seguradora definia “ocupar” como estar “dentro, no, entrando ou saindo do veículo”, e, tendo em vista o significado claro dessa frase, portanto, todos os ocupantes cujos ferimentos foram causados “no” carro estariam cobertos.

Recusando com veemência o argumento da State Farm, Kethledge observou que “existem aqui boas razões para não chamar o argumento de um oponente de ‘ridículo’... incluindo civilidade... mas a principal razão é mais simples: ‘O argumento que a State Farm considerou ridículo está correto’”.

Em 2016, no caso Tyler v. Departamento do Xerife do Condado de Hillsdale, Kethledge acompanhou o voto do juiz relator, no qual o tribunal considerou inconstitucional a lei federal que privou permanentemente um indivíduo que havia sido condenado há 28 anos dos direitos previstos na 2.ª Emenda, referente ao porte de armas. 

Em 2013, no caso Estados Unidos v. Hughes, Kethledge escreveu em sua sentença que “os estatutos não são paletas, nas quais a corte pode misturar diferentes cores até obter o efeito desejado. Os estatutos são leis, delimitadas a um significado pelas palavras que o Congresso escolheu ao promulgá-las”. 

O histórico de Kethledge mostra um compromisso com o legalismo e, até mesmo nos casos mais maçantes, suas opiniões são deliciosas de se ler.

5. Joan Larsen

Juíza do Tribunal de Apelação do 6.° Circuito (Michigan) 

Idade: 49 anos

Formação: Universidade de Northern Iowa; Faculdade de Direito da Universidade Northwestern 

Assessorou: David Sentelle, do Circuito de Washington D.C., e o ministro Antonin Scalia, da Suprema Corte.

Joan Larsen é juíza do 6.º Circuito. Trump a indicou para o cargo em maio de 2017, quando foi inicialmente vetada pelos senadores Debbie Stabenow e Gary Peters, democratas do estado de Michigan.

Por fim, sua indicação avançou no Senado e ela foi confirmada por 60 votos a 38, sendo que os dois senadores democratas de Michigan e outros de outros estados, como Tom Carper (Delaware), Joe Donnelly (Indiana), Heidi Heitkamp (North Dakota), Joe Manchin (West Virginia), Bill Nelson (Florida) e Mark Warner (Virginia), votaram a seu favor.

No começo de sua carreira, Larsen trabalhou em um escritório de advocacia em Washington. Também atuou como procuradora-geral adjunta no Gabinete de Assessoria Jurídica do Departamento de Justiça, quando os chamados “Memorandos de Tortura” foram redigidos. Ela não contribuiu para esses memorandos, mas foi coautora de um memorando ainda confidencial sobre a capacidade dos detentos de contestar suas condenações.

Leia: Ligar para seu advogado da prisão? Tudo pode ser (e será) usado contra você

Ela passou os 12 anos seguintes lecionando na Faculdade de Direito da Universidade de Michigan, onde deu aulas de Direito Constitucional, Processo Penal e Poder Presidencial. O governador Republicano Rick Snyder a indicou para a Suprema Corte de Michigan em 2015, após a renúncia de um ministro. Larsen concorreu nas eleições no ano seguinte para terminar o restante do mandato do seu antecessor, e venceu com 58% dos votos.

Ela escreveu um artigo jurídico, em 2004, criticando o uso da lei estrangeira e internacional na interpretação da Constituição norte-americana. Foi coautora de um artigo, em 1994, que discute como as tradições não escritas da Cláusula de Incompatibilidade Constitucional fortaleceram o Executivo ao limitar a capacidade dos membros do Congresso e senadores de atuar simultaneamente no Poder Executivo. Em outro texto, de 2010, ela argumenta que júris modernos são incompatíveis com o significado original da Constituição.

Seu histórico judicial é pequeno quando comparado à maioria dos outros potenciais candidatos. Na Suprema Corte de Michigan, foi relatora de seis votos, incluindo no caso In Re Hicks (2017), anulando a decisão de um tribunal distrital que retirou os direitos familiares de uma mulher com deficiência intelectual. 

Ela também foi relatora do voto da maioria em Yono v. Departamento de Transporte (2016), que decidiu que estado de Michigan não poderia ser processado, com base em uma lei de responsabilidade civil, por uma lesão ocorrida em uma pista de estacionamento paralela a uma rodovia.

Desde que entrou na magistratura, Larsen foi autora de 11 votos judiciais não publicados (votos que não aparecem no Federal Reporter e normalmente não têm valor de precedente). Esses votos incluem casos que lidam com as diretrizes de condenação, remoção de estrangeiros pelo Conselho de Apelações de Imigração, alguns envolvendo o cancelamento de benefícios por invalidez, e uma disputa entre inquilino e proprietário. 

Seu histórico como juíza é limitado, mas ela vem demonstrando compromisso com princípios conservadores. Joan Larsen também demonstrou ter a audácia do seu ex-patrão. Quando perguntada “como era ser uma mulher trabalhando para o juiz Scalia”, ela costuma brincar: “muito parecido com ser um homem trabalhando para ele”.

6. Amul Thapar

Juiz do Tribunal de Apelação do 6.° Circuito (Michigan) 

Idade: 49 anos

Formação: Faculdade de Boston; Universidade da Califórnia, Berkeley Law 

Assessorou: Arthur Spiegel, do Distrito Sul de Ohio, e Nathaniel Jones, do 6.° Circuito.

Amul Thapar foi o segundo candidato apontado por Trump após a indicação de Neil Gorsuch para a Suprema Corte. Em maio passado, por 52 votos a 44, o Senado confirmou a nomeação de Thapar para o 6.º Circuito, em uma votação com clara divisão partidária (quatro democratas se abstiveram). 

Antes de ascender ao Tribunal de Apelação, Thapar passou quase uma década atuando como juiz de primeira instância no Distrito Leste do Kentucky. O presidente George W. Bush indicou Thapar para esse posto em maio de 2007, e ele foi confirmado por uma votação oral em dezembro de 2007, tornando-se o primeiro juiz federal sul-asiático-americano - e um dos mais jovens em todo o judiciário federal.

Ele também se voluntariou para julgar casos de imigração durante uma emergência judicial no Distrito Sul do Texas. 

Antes de ingressar no tribunal federal, Thapar atuou como assistente do procurador dos EUA no Distrito de Columbia e no Distrito Sul de Ohio. Posteriormente, assumiu o posto de procurador dos EUA no Distrito Leste do Kentucky. 

Ele também trabalhou em um escritório de advocacia em Washington, D.C., e em Cincinnati, Ohio, além de ter atuado como Diretor Jurídico da Equalfooting.com.. 

Em um artigo publicado recentemente na revista jurídica Michigan Law Review, Thapar e o advogado Benjamin Beaton analisaram o novo livro do ex-juiz do 7.º Circuito, Richard Posner, em que o autor recomenda abandonar uma abordagem formalista, segundo a qual os juízes confiam em significado histórico, instrumentos interpretativos estabelecidos e precedentes, e adotar uma teoria consequencialista mais abertamente voltada para resultados.

Thapar oferece uma defesa robusta do legalismo, argumentando que a abordagem de Posner se mostraria inviável e imprevisível, e transformaria os juízes em formuladores de políticas, violando assim a separação de Poderes. O artigo é concluído assim:

Justamente porque os juízes são humanos, o formalismo é, de certo modo, desejado. Como admitiu o ministro Scalia, ‘o principal perigo na interpretação judicial da Constituição – ou, aliás, na interpretação judicial de qualquer lei – é que os juízes confundirão suas próprias predileções pela lei’. Evitar esse erro é a parte mais difícil de ser um juiz consciencioso; e talvez nenhum juiz consciencioso seja completamente bem-sucedido nesse sentido. Mas isso significa rejeitar uma abordagem formal para interpretar textos legais; apenas aumenta a necessidade de incorporar limites, em vez de liberdade, no sistema judicial. O fato de o legalismo, por vezes, não conseguir restringir juízes não é razão para se render a outras abordagens interpretativas que, pela sua própria concepção, impõem um número menor e menos eficaz de restrições.

Embora ele esteja Tribunal de Apelação há pouco mais de um ano, Thapar escreveu 36 votos quando atuou nos 6.º e 11.º circuitos por nomeação, e escreveu 10 votos publicados desde sua confirmação para o cargo no ano passado. Como juiz de um tribunal distrital, Thapar publicou 631 sentenças – mas apenas 11 foram reformadas em recurso. Thapar parece ser um legalista comprometido.

No caso Freeland v. Liberty Mut. Fire Ins. Co. (2011), Thapar rebaixou um processo de diversidade para o tribunal estadual porque as custas eram “exatamente um centavo a menos do mínimo jurisdicional dos tribunais federais”. Embora admita que esse resultado foi “dolorosamente ineficiente”, ele disse que “as palavras ‘em litígio’ têm de significar alguma coisa”, e que o texto do estatuto não deixa outra escolha.

Em Duncan v. Muzyn (2018), envolvendo o tempo do aviso prévio dado a membros do plano de Previdência antes de o conselho da Tennessee Valley Authority votar a aprovação de uma emenda ao plano, o conselho argumentou que deveria receber deferência porque as regras são ambíguas.

Ao se recusar a acatar a interpretação do conselho, Thapar escreveu que “simplesmente chamar algo de ambíguo não faz com que esse algo, seja. De fato, determinar o ponto em que a ‘ambiguidade constitui uma ambiguidade’ não é tarefa fácil. A linguagem contratual não é ambígua apenas porque as partes a interpretam de forma diferente... Ao contrário, em casos como este, uma interpretação explica melhor o texto em questão, a linguagem não é ambígua”.

Confira: Suprema Corte dos EUA toma decisão histórica sobre monitoramento de dados

Nos termos da 1.ª Emenda, Thapar acompanhou o voto da maioria (junto com Kethledge) no caso Bormuth v. Jackson, sustentando que a prática do conselho de um condado de iniciar suas reuniões públicas com uma oração feita por um comissário não violou a Cláusula de Estabelecimento. 

E em uma de suas decisões mais controversas no tribunal distrital, Winter v. Wolnitzek (2016), Thapar decidiu serem inconstitucionais diversas regras de conduta judicial do Kentucky, que proíbem juízes de fazer contribuições para campanhas, de fazer campanha como membro de uma organização política, e de fazer discursos a favor ou contra organizações políticas.

“Simplesmente não há diferença entre ‘declarar’ apoio a uma organização usando palavras e ‘declarar’ apoio a uma organização doando dinheiro. Em outras palavras, se um candidato pode falar as palavras ‘eu apoio o Partido Democrata’, então ele deve ser autorizado a dar seu dinheiro para quem diz apoiar”, explicou

O 6.º Circuito elogiou a “opinião minuciosa e ponderada” de Thapar, apesar de ter rejeitado a parte de seu acórdão sobre contribuições de campanha. 

Embora tenha passado grande parte de sua carreira como promotor federal, como juiz do tribunal distrital Thapar já decidiu a favor de réus criminais. Por exemplo, em Estados Unidos v. Sydnor (2017), Thapar excluiu declarações autoincriminatórias feitas pelo acusado, que foram obtidas antes que seus direitos fossem lidos, e em Estados Unidos v. Lee (2012) Thapar suprimiu evidências obtidas após a polícia rastrear o réu usando um dispositivo de GPS sem antes obter um mandado.

Atuando como juiz de apelação, ele escreveu um voto para o caso Estados Unidos v. Perkins (2018), ratificando a moção do juiz para suprimir evidências obtidas pela polícia em uma investigação de drogas com base em um mandado antecipatório, em que o evento desencadeante nunca aconteceu. 

Ele escreveu que a interpretação do governo (que tornou o evento desencadeante irrelevante para o mandado) “carece de bom senso”, “entra em conflito com a 4.ª Emenda” e não é simplesmente uma “tecnicidade” que o tribunal deve ignorar. 

Dos juízes que Trump indicou até agora, Thapar tem o mais extenso histórico de atuação judicial, cobrindo uma série de questões – desde o sistema de justiça criminal até a 1.ª Emenda.

Ele também tem um bom relacionamento com o líder da maioria no Senado, Mitch McConnell, republicano de Kentucky, e há rumores de que Trump entrevistou Thapar para a vaga na Suprema Corte que acabou ficando com Gorsuch. 

Na semana passada, Trump disse aos repórteres que “exceto pela guerra e paz... a decisão mais importante a tomar é a escolha de um juiz da Suprema Corte”. Ele está absolutamente certo em levar essa decisão a sério. 

As indicações judiciais são um dos legados mais duradouros de um presidente – já que os juízes cumprirão seu mandato por décadas, além dos quatro ou oito anos do presidente. E a seleção do sucessor de Kennedy pode afetar o equilíbrio da Suprema Corte nos próximos anos. 

Os 25 “candidatos” – incluindo os nomes acima – seriam ótimas adições à Suprema Corte, e saberemos na próxima semana quem Trump escolherá.

-

* Nota da editora [1]: A 6.ª Emenda da Constituição dos EUA prevê que “em todos os processos criminais o acusado terá direito a julgamento rápido e público, por júri imparcial no Estado e distrito onde o crime houver sido cometido, distrito esse que será previamente delimitado por lei; a ser informado da natureza e causa da acusação; a ser acareado com as testemunhas que lhe são adversas; a dispor de meios compulsórios para forçar o comparecimento de testemunhas da defesa e a ser assistido por advogado”.

** Nota da editora [2]: um magistrado originalista é aquele que acredita que a Constituição deve ser interpretada da forma como foi pensada por quem a escreveu.

Tradução: Ana Peregrino

©2018 Daily Signal. Publicado com permissão. Original em inglês.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]