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As peculiaridades da vida em condomínio podem gerar dúvidas na hora de decidir se mudar para uma propriedade em que os vizinhos, além de estarem a uma porta de distância, dividem áreas comuns. Como proceder quando há barulho em excesso? O que acontece se alguma taxa deixar de ser paga? Inquilino pode votar em assembleia? Pensando nisso, o Justiça preparou um guia com os principais aspectos legais que envolvem esse tipo de moradia.

Como resolver confusões 

Quando o assunto é condomínio, dois direitos fundamentais, previstos na Constituição brasileira, são levantados: o direito de propriedade e o direito à privacidade. Eles não são, contudo, ilimitados, e exigem bom senso em sua aplicação. “As pessoas fecham a porta do apartamento e acham que podem fazer o que bem entendem, mas existem limites à propriedade, que estão onde começam os direitos do próximo”, afirmou à Gazeta do Povo em ocasião anterior o advogado Alexandre Marques, vice-presidente da Comissão de Direito Condominial da OAB de São Paulo. 

Para resolver imbróglios no local, é fundamental que os condomínios disponham de uma convenção própria, exigida pela Lei n. 4.591/1964, e de um regimento interno. Enquanto o primeiro instrumento é uma espécie de “Constituição Federal” do condomínio – com a definição de como o síndico é eleito e de quanto tempo são os mandatos, como funciona o pagamento das contas, o que pode ou não ser feito pelos moradores, etc. –, o segundo regula o convívio social dos moradores e o uso das áreas comuns.

Esses documentos também dão informações a respeito das vagas de garagem, como o número de vagas por apartamento, se há vagas para visitantes e para portadores de necessidades especiais. É importante, então, que o condomínio dê publicidade a esse tipo de informação, muitas vezes crucial para decidir sobre a compra ou aluguel de um imóvel. Recomenda-se, portanto, que o síndico afixe essas regras em áreas comuns e esteja disponível para esclarecer dúvidas com moradores e interessados. 

Confira: 12 pontos para saber sobre aluguel antes de fechar um contrato

Só em último caso as brigas de vizinhos devem ser levadas à Justiça. O mais recomendado é procurar a outra parte para tentar resolver a questão amigavelmente. Se a primeira tentativa falhar, deve-se recorrer à administração do condomínio, responsável por aplicar advertências e multas. Ainda, o Código Civil prevê, em seus artigos 1.336 e 1.337, que uma assembleia específica pode ser convocada para compelir o morador que está desobedecendo as regras a pagar uma multa de até cinco cotas condominiais. A lei também autoriza a convocação de uma assembleia para enquadrá-lo como “condômino antissocial” e obrigá-lo a pagar multa de até 10 cotas. 

Se nada adiantar e o vizinho continuar a desrespeitar as regras de convivência de forma grave, a ponto de colocar em risco a segurança patrimonial ou dos outros moradores, a Justiça pode obrigá-lo a se afastar do convívio condominial, sem perder a propriedade. Nesses casos, ele poderia alugar ou ceder o apartamento ou a casa a outra pessoa.

Barulho 

Problemas com barulho com certeza são dos mais comuns em condomínio. É comum que prédios estipulem um horário limite – geralmente 22h –, mas também é preciso contar com o bom senso. Segundo norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), os níveis de ruído aceitáveis equivalem a 55 decibéis no período diurno e 35 no noturno. É a essa regra que o Judiciário recorre quando é preciso analisar casos do gênero. Atualmente, existem diversos aplicativos para smartphone que realizam a medição do ruído. 

Pode proibir cachorro? 

Em tese, um condomínio pode proibir a presença de animais domésticos. Ocorre que se um morador entrar com uma ação judicial questionando a validade da regra, é quase certo que ela será derrubada. 

única maneira de um animal ser realmente proibido ou afastado do convívio dos condôminos é se ele resultar em prejuízo ao sossego, à salubridade e à segurança dos moradores. Isso porque, ainda que seja garantido o direito à posse de animais em sua casa ou apartamento, eles não podem apresentar incômodos ou ameaças às outras pessoas. Aqui, vale a máxima de que “seu direito termina quando começa o do outro”.

Instalação de câmeras 

A jurisprudência brasileira entende que a administração do condomínio pode instalar câmeras nas áreas comuns, excluídas piscinas, saunas e áreas comuns dos andares, visto que a atitude violaria o direito à privacidade. Em tese, a situação só seria aceita se houvesse a anuência, confirmada em assembleia, de todos os condôminos.

Sou inquilino, posso votar em assembleia? 

A questão não está pacificada na jurisprudência nacional, especialmente porque o Código Civil de 2002 não trata sobre a possibilidade de inquilino votar em assembleia de forma expressa. O advogado Alexandre Marques afirmou ao Justiça que “se o inquilino se apresenta como inquilino, paga a cota patrimonial, se o proprietário não está presente ou ninguém que o esteja representando com uma procuração, possa votar nas despesas ordinárias, até porque quem vai pagar por essas despesas ordinárias é ele mesmo, conforme a Lei de Locação”.  A exceção seria se a convenção previsse, explicitamente, que só proprietários pudessem votar. 

O também advogado Bruno Schirati Guimarães, por outro lado, avalia que pelo fato de não haver menção ao locatário no Código Civil, deve-se sustentar que somente este pode votar, independentemente de se tratarem de despesas ordinárias ou extraordinárias. 

Ambos especialistas afirmam, contudo, que se o locatário contar com procuração com firma do dono do imóvel ou se a convenção do condomínio permitir a participação, ele poderá votar. Saiba mais aqui.

Não paguei o condomínio, e agora? 

Assim como nos casos da confusão no condomínio, o melhor caminho é tentar um acordo com o condômino inadimplente sem procedimento judicial. “Não vale a pena propor uma ação de até três ou quatro meses de atraso, até porque acabará com um acordo em juízo e, acordo por acordo, melhor fazer um acordo antes [sem gastos com custas processuais]”, disse ao Justiça Alexandre Marques. Em alguns casos, por exemplo, desemprego ou problemas familiares podem ser a causa do atraso, e pode ser que o proprietário sane rapidamente as dívidas. 

Caso ele insista em não pagar, só resta recorrer à Justiça, sendo que o devedor será citado para quitar a dívida em três dias, sob pena de penhora. Se não ocorrer a quitação do débito, o juiz pode determinar a penhora do dinheiro em contas bancárias ou de bens, o próprio imóvel em questão ou outros. Persistindo a dívida, o imóvel pode ser leiloado.

A dívida, contudo, não autoriza que o condômino inadimplente seja alvo de situações constrangedoras e vexatórias, como violação de correspondências. Esses casos podem gerar indenização ao devedor, vez que o Judiciário entende que ele já está sendo punido pelas consequências da própria dívida.

Fumaça (inclusive de maconha) 

Lei Antifumo, regulamentada em 2014, proíbe o fumo nas áreas comuns do condomínio, inclusive nas áreas abertas. A princípio, os moradores podem fumar na inviolabilidade do lar, garantida pela Constituição, mas a fumaça do cigarro não pode gerar incômodo em outros apartamentos – casos assim devem ser discutidos em assembleia.

Mas e quando o cheiro da maconha do vizinho incomoda? Apesar de a droga ser proibida, seu uso no Brasil é banal. O primeiro passo é acionar o síndico, que pode divulgar um comunicado geral, alertando sobre a proibição do uso de fumígenos em geral. Caso a circular não tenha efeito, pode-se enviar uma carta individual, se o condômino maconheiro for identificado. Por fim, se o problema afetar a coletividade e não um único vizinho, é possível dar uma advertência e aplicar multa, em caso de reincidência.

Chamar a polícia seria efetivo em caso de suspeita de tráfico de droga, lembrando que não é possível entrar numa casa ou apartamento sem mandado, somente para dar flagrante em uso de maconha. Além do mais, porte de drogas é crime de baixo potencial ofensivo, que não comporta prisão, mas penas alternativas – como advertência, prestação de serviços à comunidade ou comparecimento a programa ou curso educativo. De qualquer forma, o usuário pode ser detido e levado à delegacia para prestar esclarecimentos.

Airbnb x Síndicos 

O serviço de “locação para hospedagem” tem sido cada vez mais usado no Brasil, mas ainda gera dúvidas em condôminos e síndicos. Segundo Alexandre Marques, o Airbnb é regulado pela Lei n. 11.771/2008, que trata de hospedagens para turismo, já que a Lei de Locações não permite hospedagem por hora, dia ou parte do imóvel (cômodos) com caráter mercantil claro. O advogado contou ao Justiça que é consenso na Comissão de Direito Condominial da OAB-SP que o Airbnb não deve ser praticado em condomínio residencial, por não comportar tal modalidade de hospedagem. 

Os condôminos até poderiam propor ações na Justiça, com base no direito de propriedade, para tentar garantir a possibilidade de alugar as unidades por curtos períodos pelo Airbnb. Se vão ou não ganhar a causa, é outra história. A jurisprudência tem entendido que o condomínio pode, se constar previsão em convenção, exigir que os moradores só usem as unidades para fins residenciais. 

A plataforma afirmou que destaca a importância do diálogo entre usuários e prédios, para que as regras sejam justas e claras para proprietários e hóspedes. Saiba mais sobre o assunto na matéria: Airbnb causa guerra entre síndicos e moradores de condomínios.

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