Ao romper um acordo internacional unilateralmente os EUA comprometem a percepção internacional de sua confiabilidade e responsabilidade| Foto: SAUL LOEB/AFP

A decisão inconsequente de Trump de retirar os EUA do acordo nuclear com o Irã não vai forçar o país asiático a voltar para a mesa de negociações, nem abordará as sérias preocupações com seu comportamento na região, mas deixará seu programa nuclear livre de restrições e os norte-americanos, com a pecha de inconstantes, isolados de seus aliados e muito menos seguros.  

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O acordo está funcionando como deve. Segundo a Agência Internacional de Energia Atômica, a comunidade de inteligência e o Conselho de Segurança dos EUA, além dos principais assessores presidenciais, o Irã vem cumprindo fielmente suas obrigações. Como exigido, abdicou de 97% de seus estoques de urânio enriquecido, desmontou mais de 60% de suas centrífugas e a instalação de enriquecimento de plutônio, admitiu a inspeção internacional e o regime de monitoramento mais intrusivos da história e renunciou à produção de armas nucleares.  

A questão desse tratado nunca foi confiança, mas sim uma verificação rigorosa – e permanente. Ele efetivamente obstrui todos os meios possíveis de aquisição de armas nucleares por parte do Irã.  

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Agora Trump não só cede à superioridade moral como livra os iranianos de quaisquer restrições. Com isso, eles poderão retomar suas atividades nucleares sem serem acusados de violar o acordo.  

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De fato, os EUA é que estão prestes a violar unilateralmente aquele mesmo pacto que negociou, reimpondo sanções, quando, na verdade, o Irã continua obedecendo às regras. Trump ignorou os pedidos de aliados europeus mais próximos, os mesmos que passaram meses se dedicando a sanar suas objeções. Em vez de chegar a um meio-termo com os aliados, Trump simplesmente os ignorou e agora quer penalizar as empresas europeias por seguirem um acordo que está funcionando. Para a relação americana com a Europa, as consequências políticas e econômicas serão, no mínimo, um desastre.  

O preço da liderança global norte-americana é alto. Ao romper um acordo internacional unilateralmente, sem que haja nenhuma violação a ele, os EUA comprometem a percepção internacional de confiabilidade e responsabilidade americama – que foi exatamente o que foi feito com o Acordo de Paris, sobre o meio ambiente, e a Parceria Transpacífico. Violar o tratado do Irã é muito mais perigoso.  

Perigos

Os iranianos podem permanecer no acordo por enquanto, se os outros signatários garantirem benefícios comerciais e de investimentos que valham a pena; entretanto, essa opção está longe de se garantir e talvez seja insustentável, dada a capacidade dos norte-americanos de impor sanções pesadas a quaisquer entidades estrangeiras que fizerem negócio com o Irã.

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Alternativamente, o país poderia retomar suas atividades nucleares sem restrições, gradual ou automaticamente, e até se retirar do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, tornando-o um elemento muito mais perigoso em uma região já tão volátil.  

O acordo nunca teve a intenção, e nem poderia, de abordar o comportamento pernicioso do Irã – seu apoio ao terrorismo, a influência maligna sobre os países vizinhos e o programa de mísseis balísticos –, mas sempre fez sentido porque sua atitude nefasta seria muito mais perigosa se contasse com uma capacidade nuclear. Ao nos retirarmos dele, diminuímos consideravelmente nossa capacidade de fazer algo em relação a esses temores.  

Com o Irã livre de amarras, a Arábia Saudita e outras nações do Oriente Médio podem passar a querer obter capacidade nuclear. Os linhas-duras iranianos, que nunca concordaram com o pacto, podem reforçar sua intenção de desestabilizar a região, marginalizando os relativamente moderados como o presidente Hassan Rouhani.

Com a revogação do compromisso norte-americano, a posição da Rússia e da China na área se consolidará às custas americanas. Israel pode agora forçar a mão em um confronto com o Irã, apostando que pode nos arrastar consigo. Qualquer que seja o cenário, os EUA estarão menos seguros – e, na pior das hipóteses, teremos que escolher entre entrar em guerra ou aceitar os iranianos com armas nucleares.  

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Trump, invejoso do sucesso de Obama, há tempos decidiu destruir esse acordo, ainda que sirva aos interesses dos Estados Unidos e tenha conquistado o apoio até dos críticos mais ferrenhos. O presidente se retirou dele por pura inveja e despeito, sem oferecer uma alternativa viável. Afirma que, exercendo mais pressão, terá condições de negociar um tratado melhor – mas só alguém que não sabe nada sobre política externa pode assumir que vale mais a pena aplicar mais força a um país para obter exatamente a mesma coisa que foi prometida há três anos.  

E se com isso Trump acha que está mandando um recado de força à Coreia do Norte, está errado também. Na verdade, apenas demonstra a um adversário muito mais avançado e imprevisível, às vésperas de uma rodada de negociações, que os EUA não são confiáveis. Está apenas corroborando provas de que, quaisquer acordos que seu país faça, mesmo os que derem certo, podem ser desacreditados pelo capricho deste ou daquele presidente.

Os parceiros americanos de negociação, incluindo Japão, Coreia do Sul e China, duvidarão de nossa credibilidade quando mais necessitamos demonstrar confiança coletiva. Por que Kim Jong-un haverá de abrir mão de sua capacidade nuclear quando os EUA acabam de demonstrar que, uma vez que concordar em ceder, podem renegar sua parte na barganha?  

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O presidente acaba de tomar a decisão mais tola e irresponsável em termos de segurança nacional de seu governo. Não se sabe exatamente o que virá a seguir, mas sem dúvida os Estados Unidos enfrentará uma situação muito pior que a atual. E quando o caos se materializar, Trump, como já é de praxe, vai pôr a culpa nos outros: em seus adversários políticos, em seu antecessor, nos europeus, nos iranianos. O fato é, porém, que só há um responsável: o presidente Trump, nossa bola-de-demolição-chefe.  

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(Susan E. Rice (@AmbassadorRice) foi conselheira de segurança nacional de 2013 a 2017, embaixadora dos EUA na ONU e hoje contribui com a coluna de opinião.)  

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