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Paris – A China nos habituou aos "grandes saltos para frente." O primeiro data de 1958, com Mao Tsé-tung, para forjar as bases da economia comunista.

Depois, a China conservou esse bom hábito de "saltar", mas , pouco a pouco, os "saltos" mudaram de direção. Hoje, em vez de forjar "o comunismo", eles pretendem antes dissolver o socialismo em estruturas cada vez menos estatais, cada vez mais liberais. A China deu um salto para a economia de mercado.

Assim foi a sessão que encerrou da 9.ª Assembléia Nacional Popular (ANP) chinesa, em Pequim. Os deputados adotaram um projeto de lei garantindo a propriedade privada. Esse projeto tem uma história atribulada: há 13 anos que ele é debatido. Ele já foi rejeitado sete vezes de tanto que chocava os velhos comunistas. Para eles, essa lei sobre a propriedade privada ia desfazer toda a economia "estatal", um pouco como um pulôver se desmancha se uma de suas malhas fundamentais afrouxar.

Na internet, onde pululam os protestos da velha guarda marxista, uma petição denuncia uma "traição do ideal socialista" e acrescenta: "Os corruptos que se apropriaram dos bens de maneira fraudulenta vão legalizar suas aquisições." O vice-presidente do Comitê Permanente da ANP, Wang Zhaoguo, replica: "O desenvolvimento trazido pela política de reformas e de abertura engendrou uma melhoria geral e convinha proteger os direitos dos cidadãos, especialmente o de possuir os bens acumulados legalmente ao preço de trabalho duro, e o direito de explorar as terras de que eles dispõem."

Contudo, o governo do primeiro-ministro Wen Jiabao não pôde ignorar completamente as queixas dos veteranos do comunismo. Artigos foram acrescentados ao projeto de lei votado para assegurar também a proteção das propriedades do Estado e das coletividades. Mas ninguém se ilude: a propriedade privada é a verdadeira "jóia" da China. Quanto ao setor estatal, ele se torna o "primo pobre" porque, como diz o Boxun, um site de informação, "a propriedade do Estado foi esfacelada por 20 anos de reestruturação e ela hoje representa apenas uma parte ínfima da riqueza chinesa."

Um segundo projeto de lei dá uma idéia do dinamismo da China. Outrora, os investimentos estrangeiros pagavam impostos da ordem de 15% do lucros nos dois primeiros anos, enquanto as empresas chinesas eram taxadas em 33%. No futuro, as empresas estrangeiras terão de arcar com impostos de 25% dos lucros – sinal que a República Popular não precisa mais conceder vantagens exorbitantes para atrair investidores estrangeiros.

Um último sinal a decodificar nessa longa sessão (10 dias) da ANP chinesa: o primeiro-ministro Wen Jiabao publicou uma coluna no Diário do Povo para dizer que não há incompatibilidade entre um sistema socialista e a democracia. Inquirido, Wen precisou: "A democracia, o estado de direito, os direitos humanos, a igualdade, a fraternidade não são o apanágio do capitalismo." Ora, ora! Eis uma bela novidade! Um novo salto para frente se prepara, mas desta vez na direção da democracia. Já se pode imaginar que brilha no horizonte chinês o respeito aos "direitos humanos" e que a China deixará de executar milhares de condenados, respeitará o Tibete, aceitará que os opositores se oponham e que a imprensa diga o que tenha vontade de dizer. Sim, mas em quantos "saltos?"

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