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Centro da cidade de Lodz, que viu a sua população diminuir de 850 mil para menos de 690 mil após a entrada da Polônia na União Europeia, 20 de fevereiro de 2019. Foto: Laura Boushnak / The New York Times
Centro da cidade de Lodz, que viu a sua população diminuir de 850 mil para menos de 690 mil após a entrada da Polônia na União Europeia, 20 de fevereiro de 2019. Foto: Laura Boushnak / The New York Times| Foto:

O partido Lei e Justiça, de direita, chegou ao poder em 2015, no auge da crise da imigração na Europa, depois de uma campanha movida ao coro de "a Polônia para os poloneses"; com as eleições gerais marcadas para outubro, o partido da situação volta a promover sua visão de "a Polônia em primeiro lugar".

Essa retórica anti-imigração agressiva vem dando dor de cabeça para a União Europeia, que não conseguiu distribuir as cotas do norte da África, Bálcãs e Oriente Médio pelo continente justamente por causa da resistência da Polônia e outros países-membros linha-dura.

E é por isso que muita gente se surpreende ao saber que o governo polonês, muito discretamente, responde pelo maior fluxo de trabalhadores imigrantes na história moderna do país – só que a grande maioria é cristã e vem da vizinha Ucrânia.

O primeiro-ministro Mateusz Morawiecki não tem pudor em promover os planos do governo. "Queremos remodelar e recristianizar a Europa", afirmou, em 2017, em entrevista a um canal de TV católico. E recentemente ordenou que os passaportes recém-emitidos incluíssem a frase "Deus, Honra, Pátria".

O fato é que a imigração na Polônia é um paradoxo. O país se beneficiou enormemente das fronteiras abertas da UE, faturando bilhões de dólares enviados por milhares de trabalhadores que migraram para outros membros do bloco, especialmente o Reino Unido. Hoje, no entanto, com a escassez de mão de obra que a Polônia enfrenta, as autoridades não estão conseguindo atrair a diáspora de volta – e se veem de mãos atadas pela posição política anti-imigratória.

Ucranianos

Se o governo raramente fala da necessidade de força de trabalho imigrante, o volume de ucranianos em muitas cidades polonesas já se faz notar. Segundo o Eurostat, mais de 683 mil estrangeiros receberam as primeiras validações de residência na Polônia em 2017, o número mais alto entre os membros da União Europeia. Há mais de dois milhões de ucranianos hoje na Polônia, a maioria nas cidades que movem a economia nacional.

A questão é saber se eles vão ficar. No ano passado, o bloco começou a isentar os ucranianos do visto, e a Alemanha está facilitando as exigências de entrada para profissionais qualificados, de olho neles. Uma pesquisa recente, realizada por um jornal polonês, concluiu que 59 por cento dos ucranianos no país admitiram ter a intenção de ir para a Alemanha se o mercado de lá se abrir.

"O governo não tem domínio da questão; se você perguntar quantos ucranianos estão trabalhando aqui, vão dizer 500 mil, mas são mais de dois milhões, e, desses, muitos podem estar indo para a Alemanha", diz Anna Wicha, diretora do Grupo Adecco, uma das maiores agências de empregos da Polônia.

Sem estratégia de expansão

Por enquanto, as autoridades não têm uma estratégia de expansão da mão de obra em longo prazo. Muitos especialistas e alguns membros da oposição dizem que a situação só se resolverá se os líderes amenizarem a resistência aos migrantes e aceitarem a pluralidade – mas, em âmbito nacional, só falar sobre imigração já pode ser considerado suicídio político.

Quando o vice-ministro de Investimentos e Desenvolvimento Pawel Chorazy disse, durante um debate televisionado antes das eleições locais de outubro, que "o fluxo de imigrantes na Polônia teria de aumentar para sustentar o crescimento econômico", a reação que gerou foi de escárnio.

Joachim Brudzinski, ministro do Interior, disse que os comentários "não refletem a posição do governo"; o primeiro-ministro, Morawiecki, afirmou que Chorazy "foi muito afobado". E logo em seguida o demitiu.

"Os políticos estão andando na corda bamba, muito conscientes de que em breve pode haver um desastre. É muito fácil fomentar o sentimento nacionalista com uma retórica anti-imigração, mas a realidade das necessidades do mercado de trabalho estão a cada dia mais claras. Estamos em um momento de definição para o país; certas decisões terão de ser tomadas. Não dá mais para adiar", explica Irena Kotowska, diretora do Centro de Demografia da Faculdade de Economia de Varsóvia.

Braços abertos

Aqui em Lodz, na porção central do país, as contradições do dilema migratório polonês são bem evidentes; ao contrário da liderança nacional, porém, a prefeita Hanna Zdanowska abriu o município para os estrangeiros. Quando disputou as eleições em outubro passado, aliás, pediu uma Polônia inclusiva, que recebesse os recém-chegados de braços abertos.

  • Missa realizada em polonês em uma igreja católica em Boston, 4 de março de 2016. A Polônia recebe bilhões de dólares de envios de centenas de milhares de trabalhadores que migraram para outros países na Europa, especialmente para o Reino Unido. Foto: Andrew Testa / The New York Times
  • Uma deli polonesa em Londres, 14 de janeiro, 2014. A Polônia recebe bilhões de dólares de envios de centenas de milhares de trabalhadores que migraram para outros países na Europa, especialmente para o Reino Unido. Foto: Andrew Testa / The New York Times
  • Uma fábrica abandonada em Lodz, que viu a sua população diminuir de 850 mil para menos de 690 mil após a entrada da Polônia na União Europeia, 20 de fevereiro de 2019. Foto: Laura Boushnak / The New York Times
  • Antonina Marushko, imigrante da Ucrânia, e seu filho Olek, 10 anos, trabalha em seu salão em Lodz, Polônia, 21 de fevereiro de 2019. Foto: Laura Boushnak/The New York Times
  • Henryk Panusz, 89 anos. Ele e sua família eram no passado os líderes da indústria de tricô que ajudou a fazer de Lodz uma espécie de cidade multi-étnica na Polônia, 21 de fevereiro de 2019. Foto: Laura Boushnak / The New York Times

O partido do governo jogou pesado contra ela durante a campanha, mas Zdanowska acabou vencendo com 70 por cento dos votos válidos, fenômeno que ela justificou pelo histórico de tolerância local – afinal, o município já foi um centro manufatureiro com centenas de fábricas, com uma população que incluía holandeses, ingleses, alemães e um forte contingente judeu.

Depois da guerra, Lodz passou por dificuldades sob o regime comunista antes de a Cortina de Ferro começar a se desintegrar, em 1989. Uma vez que o país entrou para a União Europeia, oferecendo às pessoas a chance de migrar com mais facilidade, Lodz viu sua população despencar para 690 mil habitantes, quando antes passava de 850 mil – parte do êxodo, desde 2004, de 2,5 milhões dos 38 milhões de poloneses.

Mas a Polônia também se beneficiou dos bilhões em subsídios que ajudaram o país a se tornar uma das economias de crescimento mais rápido do continente. E Lodz atraiu empresas multinacionais, ao mesmo tempo que reinventou muitas fábricas antigas como espaços culturais para atrair uma nova classe criativa.

Sem volta

Mesmo com a prosperidade da economia, porém, o governo polonês não consegue atrair de volta aqueles que saíram em busca de melhores salários e oportunidades, apesar de gastar fortunas em campanhas publicitárias.

Aleksandra Modrzejewska, por exemplo, deixou Lodz em 2014 e conseguiu emprego de garçonete assim que chegou ao Reino Unido; hoje vive e trabalha em Chelmsford, na Inglaterra, como corretora de seguros. E diz acreditar no governo, que já afirmou que, não importa qual seja o resultado do Brexit, ela poderá ficar.

"Ninguém que eu conheço está pensando em ir embora. O Brexit talvez tenha algum impacto no pessoal que está chegando, mas, pelo que tenho visto, para quem já tem vida feita aqui, nada vai mudar."

"Foi uma questão de qualidade de vida. Aqui as pessoas são muito mais abertas e receptivas a culturas e nacionalidades diferentes", conclui, explicando sua decisão de sair da Polônia.

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