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Londres – Desde que o primeiro-ministro da Grã-Bretanha, Gordon Brown, anunciou, no mês passado, que deseja ver as drogas receberem outra classificação, uma nuvem de fumaça com um cheiro estranho tem se erguido do parlamento de Westminster.

A primeira a admitir abertamente que usou drogas "leves" no passado foi a ministra do Interior, Jacqui Smith. O ato inspirou mais da metade do gabinete a fazer confissões similares, em especial sobre o uso de maconha. Há rumores de que isto tudo foi uma estratégia para revelar o passado ilícito do líder do Partido Conservador, David Cameron, que faz oposição ao governo Brown.

Logo em seguida ao escândalo, a revista médica Lancet publicou um artigo sugerindo que usuários de maconha tem chance 40% maior de desenvolver psicopatias do que o resto da população. A imprensa também revelou que Gordon Brown cortou £ 50 milhões (cerca de R$ 194 milhões) do orçamento para o tratamento de usuários de drogas. Seria isso um sinal de hipocrisia, uma vez que o próprio Brown defende que o problema das drogas deveria ser tratado de forma mais séria?

O governo britânico está recebendo duas lições com essa história: a primeira é que maconha faz mal, e a outra é que ela é impossível de ser proibida.

Existem muitas evidências de que não será possível erradicar o uso da maconha por meio de repressão policial e das Cortes Judiciais. No Reino Unido, o contrabando e redes de distribuição da droga estão muito ramificados e tornaram-se praticamente impossíveis de serem combatidos, considerando o alto nível de tolerância da população. Se você perguntar a qualquer adolescente onde comprar maconha ou se ele conhece algum usuário, com certeza a resposta será chocante.

Se tentarmos forçar a proibição da maconha usando força policial estaremos superlotando os presídios e desviando o foco de atenção da polícia de ações mais importantes. E mesmo assim não teremos sucesso. Uma prova disso é a constatação de que o combate repressivo a outras drogas nunca conseguiu se mostrar eficiente. Traficantes e usuários sempre arranjam uma maneira de burlar os esquemas de segurança e combate à ilegalidade. As leis não são a resposta. As campanhas antidrogas comumente erram quando esquecem que a lei acaba profissionalizando o tráfico de entorpecentes. A resposta para o problema se encontra em uma palavra: conscientização.

Mudar as atitudes e a educação das pessoas deve ser prioridade. A lei só será eficiente e aceita se as pessoas associarem o consumo das drogas com as complicações que elas podem trazer (câncer, problemas mentais e outros males para a saúde). Podemos usar como exemplo uma grande mudança social neste verão na Inglaterra e País de Gales: a proibição do fumo em público. Ainda é cedo para avaliar o impacto econômico. Apenas alguns pubs fecharam, mas as vendas de alimento, no geral, subiram. Eu mesmo voltei a freqüentar estes ambientes agora e os encontro absolutamente lotados.

É importante observar que a proibição, mesmo contrariando legiões de fumantes, foi aceita com muita compostura. Foram registrados raríssimos casos de violência e um ou outro caso de desafio à proibição. Por quê? Imagino que devido ao fato de as pessoas saberem que o cigarro traz riscos e malefícios, mesmo para os fumantes passivos. A batalha foi ganha antes mesmo de que a lei fosse imposta. Até aqueles que xingam e reclamam da proibição sabem, lá no fundo, os motivos dela existir. Da mesma maneira, é muito mais importante educar as pessoas sobre os males que a maconha faz para o cérebro do que reclassificar as drogas e sair numa caça às bruxas.

Se você quer trazer mudanças a um usuário de maconha, dê a ele sobriedade e evidências honestas e reais, nada de exageros jornalísticos e hipérboles políticas. Ele mesmo pode se convencer do que é ruim para si, da mesma forma que milhares de ex-fumantes fizeram um dia.

O mesmo problema de conscientização também ocorre com problemas de saúde e estilo de vida, tais como a obesidade, sedentarismo e exagero no consumo de álcool. É responsabilidade do governo atuar com medidas para conscientizar e educar a população, como o incentivo aos esportes, adequação dos rótulos e dos anúncios de bebidas alcoólicas e no fornecimento de alimentação de qualidade em escolas e hospitais públicos.

O que o governo não deve nem pode fazer é invadir a vida das pessoas e forçá-las a beber menos, comer mais verduras ou fazer matrícula forçada numa academia. Isto jamais geraria uma mudança de hábito, mas sim revolta.

Jackie Ashley é jornalista do The Guardian, Reino Unido. Tradução: Thiago Ferreira.

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