Homem conta notas de 1.000 bolivares (R$ 0,03) para comprar verduras em um mercado na zona metropolitana de Caracas| Foto: FEDERICO PARRA/AFP

Poucos dias depois de o Fundo Monetário Internacional (FMI) ter estimado uma inflação de 1.000.000% para a Venezuela neste ano, as evidências sugerem que o número pode estar subestimado. “Se a história nos ensinou alguma coisa, é que as coisas sempre podem piorar, mesmo quando isto parece impossível, como acontece agora na Venezuela”, diz Matt O’Brien, repórter do Wonkblog, um blog do Washington Post.

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O preço de uma xícara de café medida pelo índice Cafe Con Leche, da Bloomberg, subiu para 2 milhões de bolívares nesta semana, contra 1,4 milhão de bolívares na semana anterior. A alta no período é de 42,9%. 

No final de abril, custava de 190 mil bolívares. Este aumento em três meses equivale a uma taxa anualizada de 1.227.638%. A taxa de inflação acumulada em 12 meses, por enquanto, é menor: 86.857%. 

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O FMI classificou a crise econômica da Venezuela como uma das piores da história, incluindo a da Alemanha, na década de 1920, e do Zimbábue há uma década. 

Combate com medidas paliativas

No país sul-americano, a hiperinflação ganhou força no último ano, afundando a população na pobreza, enquanto o ditador Nicolas Maduro aumentava a velocidade de impressão de moeda. O salário mínimo do país foi aumentado quatro vezes só neste ano. No entanto, os cerca de 5 milhões de bolívares por mês, são insuficientes para comprar três xícaras de café. 

Recusando-se a adotar medidas duras para estabilizar a economia, como a redução dos subsídios aos combustíveis, o governo tem recorrido a medidas paliativas que buscam apenas minimizar o problema. 

O plano mais recente é o de adotar uma nova moeda. O novo dinheiro – o bolívar soberano - estava programado para chegar às ruas no início de agosto. O plano inicial era de cortar três zeros. Mas Maduro anunciou, na noite de quarta-feira, que o lançamento da nova moeda seria adiado por algumas semanas. Ele determinou que tirar três zeros não era mais suficiente. Agora são cinco

Ninguém sabe o quanto isso vai piorar.

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É o que diz Steve Hanke, professor da Universidade Johns Hopkins, um dos maiores especialistas em hiperinflação do mundo. “Não se pode prever o curso e a duração das hiperinflações”, ressalta. 

Segundo ele, é “irresponsável” que o FMI tente fazer projeções em relação à hiperinflação venezuelana. A justificativa é de que a hiperinflação é mais um fenômeno político do que econômico, porque os governos escolhem continuar a imprimir dinheiro mesmo depois de começar a matar suas moedas. Nos últimos seis anos, a da Venezuela perdeu 99,9997% de seu valor. 

Muitos perdedores, poucos ganhadores

Parte do problema é que este tipo de comportamento autodestrutivo do governo nem sempre é autodestrutivo para o governo. “Na realidade, é o oposto”, destaca O’Brien. Regimes que estão passando por uma hiperinflação, muitas vezes tentam negar que isso está acontecendo. Eles estabelecem uma taxa de câmbio oficial que dizem que não é, à qual apenas os líderes do partido e seus parceiros tem acesso. 

 Em termos práticos, isto significa que eles podem obter dólares por apenas alguns centavos por dólar. Na Venezuela, estima Hanke, é possível obter um lucro de 2.092%  em um único dia, comprando o dólar uma taxa e vendendo por outra. Essa é uma das maneiras, diz o professor, de que "o regime é capaz de manter o grupo escolhido ao seu redor". 

Ponto final

Há duas possibilidades para a hiperinflação chegar ao fim, diz Hanke. A primeira é a possibilidade de o governo não conseguir imprimir dinheiro rápido o suficiente. Foi o que aconteceu com a Sérvia, nos anos 90. Naquela época, Slobodan Milosevic, o homem forte da Sérvia, tentou pagar todas as suas guerras desencadeando o que é a terceira maior hiperinflação da história, até que a sua Casa da Moeda chegou ao limite máximo de sua capacidade. Ele não teve outra escolha senão parar. Foi quando a inflação mensal atingiu 313 milhões por cento. 

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A segunda é quando as pessoas, em massa, param de aceitar a moeda. Não é uma ação coordenada, mas sim de pessoas que, seguindo a razão, não desejam manter seu dinheiro em uma moeda que está perdendo rapidamente o valor. É o que os economistas chamam de dolarização espontânea. Isto fez com que a hiperinflação no Zimbábue, a segunda maior da história, tivesse uma parada abrupta há quase uma década. A população do país africano entrou em greve e recusou-se a receber em dólares zimbabuanos, o que deixou o governo sem motivos para imprimir a moeda. Naquela época, a inflação mensal batia nos 79,6 milhões por cento. 

A dolarização forçada começa a se verificar no país sul-americano. "Não consigo mais pensar em bolívares, porque você precisa dar um preço diferente a cada hora", disse um artesão venezuelano à Reuters. Por enquanto, é só a 23° pior hiperinflação da história. Mas a situação pode piorar.