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Funcionário configura urna eletrônica para eleição legislativa na Venezuela | STRINGER/VENEZUELA/REUTERS
Funcionário configura urna eletrônica para eleição legislativa na Venezuela| Foto: STRINGER/VENEZUELA/REUTERS

Em 23 dias de campanha eleitoral, o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, realizou 15 transmissões especiais na TV estatal – três delas em cadeia nacional – num total de 30 horas. As aparições no programa “Em contato com Maduro” não são proibidas pela lei eleitoral, desde que o chefe de estado não utilize o espaço para beneficiar candidatos do governo – o que ONGs locais o acusam de ter feito. De acordo com a Súmate, Maduro usou o cargo para exaltar postulantes do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) à Assembleia Nacional na maioria das transmissões, violando o Princípio da Igualdade de Condições estipulado pela Constituição. Outra organização civil, a Transparencia Venezuela, entregou ao Conselho Nacional Eleitoral (CNE) 401 denúncias de abuso eleitoral, a maioria relacionada a benefícios sociais que o governo entregou nos últimos meses.

“Como parte dos programas sociais do governo, candidatos que exerciam cargos públicos começaram a distribuir geladeiras, táxis, cestas básicas, celulares e até casas para promover sua candidatura”, explicou Mercedes de Freitas, diretora da Transparencia Venezuela. “Também vimos o uso de redes sociais, como o Twitter de ministérios ou do aeroporto de Caracas, por exemplo, para fazer campanha.”

A Súmate, por sua vez, acusa Maduro de violar os artigos 13, 18 e 70 da Lei contra a Corrupção ao fazer campanha para candidatos de seu partido através do canal público 8 e de todo o aparato de meios de comunicação do Estado. O número de transmissões também foi maior no período: entre janeiro e outubro, antes de a campanha começar, Maduro fez 17 aparições na TV – apenas duas a mais que durante o mês de novembro.

CNE não pune violações

Segundo Francisco Castro, diretor e coordenador de pesquisa da Súmate, a campanha a favor dos candidatos do governo foi feita de maneira explícita.

“Denunciamos o uso de meios públicos e enviamos mais de 150 cartas ao CNE, que não reconhece que associações civis sem fins políticos possam fazer tais denúncias”, afirmou. “A prática é recorrente, mas foi ainda mais intensa neste período. Além da utilização de uma campanha que tenta confundir os eleitores. Vimos casos de candidatos que usaram os símbolos de outras organizações políticas e até de alguns postulantes do PSUV que fizeram campanha afirmando ser da oposição.”

Em abril deste ano, a Transparencia Venezuela começou a receber denúncias de eleitores que constatavam irregularidades através de um aplicativo próprio. No total, foram recebidas 900 acusações, das quais quase metade foram enviadas ao CNE, que não aplicou até agora nenhuma sanção. A própria presidente do órgão, Tibisay Lucena, confirmou que a campanha foi “mais intensa” do que as anteriores. A oposição acusa o CNE de ser um braço do chavismo.

“Houve, sim, violações das leis. Temos mais de 90 organizações políticas que fizeram denúncias e estamos analisando uma a uma”, afirmou Tibisay à rede BBC, recusando-se a dizer que grupo recebeu mais acusações. “Não é só o partido do governo, não é só a oposição. São dois blocos, mas são muitos partidos. As campanhas na Venezuela são muito intensas, muito apaixonadas, muito vistosas. Nos acostumamos a isso com o passar dos anos.”

Um dos casos mais emblemáticos denunciados pela Transparencia Venezuela é de Ernesto “Chacho” Rodríguez, candidato do PSUV pelo estado de Anzoátegui que, durante uma entrevista à Globovisión, admitiu publicamente estar recebendo recursos da empresa estatal PDVSA.

“Isso é natural, quem tem poder deve exercê-lo”, justificou o candidato na entrevista. “Como trabalhador da indústria petroleira, tenho todo o apoio para desenvolver atividades que favoreçam as comunidades do ponto de vista social.”

O uso eleitoral do principal programa de habitação do governo, o Gran Misión Vivienda Venezuela, também foi denunciado pelas ONGs – opositores inclusive chegaram a afirmar que alguns dos primeiros beneficiados estavam sendo retirados de suas casas para que elas fossem entregues a outras pessoas. A Transparencia Venezuela afirma, ainda, que as casas são usadas como forma de castigo: foram 1.490 despejos e 976 demolições. Este ano foram entregues 78 mil casas do total de 400 mil prometidas pelo governo.

“Na campanha de 2012, Chávez já usou este programa descaradamente. A diferença é que agora a campanha é ainda mais grosseira e foi utilizada por mais candidatos. Seu uso só confirma a distorção de conceitos como o público e a cidadania”, disse Mercedes, que lembra que 99% das denúncias recebidas foram contra o governo.

Mesmo sem grandes lideranças e apesar das divisões internas, a oposição ameaça pela primeira vez tirar do chavismo a maioria na Assembleia Nacional nas eleições de amanhã, fortalecida pelo descontentamento popular. Pesquisas apontam que a coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD) supera os candidatos governistas com uma vantagem inédita de entre 14 e 35 pontos. Uma pesquisa recente do instituto Datanálisis mostra, ainda, que 60% das pessoas que se dizem militantes pró-governo avaliam negativamente a situação do país.

Na sexta-feira (4), um grupo de ex-presidentes latino-americanos pediu transparência durante o pleito, denunciando vantagens ilícitas do oficialismo na campanha.

“Esperamos eleições tranquilas, democráticas, transparentes; que as pessoas possam contribuir ao votar”, disse o ex-presidente colombiano Andrés Pastrana, em Caracas. “Esperamos que uma concorrência maciça expresse livremente a vontade popular.”

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