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O jornalista Roman Prostasevich, de Belarus, preso em Minsk após o voo em que estava ter sido obrigado a pousar
O jornalista Roman Prostasevich, de Belarus, preso em Minsk após o voo em que estava ter sido obrigado a pousar| Foto: Reprodução / Twitter

A União Europeia impôs novas sanções econômicas contra Belarus e medidas punitivas ao seu setor aéreo, após um voo comercial ter sido interceptado por um caça MiG-29, sob ordens do ditador Aleksander Lukashenko, para a captura de um jornalista de oposição ao regime.

Na noite desta segunda-feira (24), os 27 líderes dos países membros da UE condenaram a ação que obrigou um voo da RyanAir, que iria da Grécia à Lituânia, a pousar em Minsk e exigiram a libertação imediata do jornalista Roman Protasevich e de sua namorada russa, Sofia Sapega, uma estudante universitária de 23 anos. As autoridades pediram também que as companhias aéreas europeias evitem o espaço aéreo belarusso e proibiram as empresas aéreas da ex-república soviética de usar o espaço aéreo e os aeroportos dos países do bloco.

As novas sanções foram aplicadas contra indivíduos envolvidos nas prisões e negócios que financiam a ditadura de Lukashenko. A União Europeia já havia imposto sanções contra dezenas de autoridades de Belarus meses atrás, após a repressão violenta de protestos contra os resultados da eleição presidencial de agosto no país, na qual Lukashenko foi eleito para um sexto mandato. O processo eleitoral foi considerado fraudulento pela oposição no país e por grande parte da comunidade internacional.

O comunicado da UE foi divulgado após a publicação de um vídeo em que Protasevich aparece dizendo que está em boas condições de saúde e confessando que incitou protestos em massa em Minsk no ano passado. Seus aliados afirmam que o depoimento foi gravado sob coerção.

A líder da oposição belarussa, Svetlana Tikhanovskaya, afirmou pelo Twitter que "essa é a aparência de Roman quando ele está sob pressão física e moral".

"Eu posso declarar que não tenho problemas com a minha saúde, nem com meu coração ou outros órgãos. Os policiais estão me tratando de forma absolutamente correta e de acordo com a lei. Eu continuo a cooperar com a investigação e estou confessando a organização de protestos em massa na cidade de Minsk", afirmou o jornalista no vídeo, em que aparenta estar com um hematoma sobre o olho direito.

Falsa ameaça de bomba do Hamas

O regime de Belarus afirmou que a ação foi uma resposta a uma falsa ameaça de bomba no avião escrita em nome do Hamas, grupo militante palestino. Um porta-voz do Hamas negou a alegação e disse que o grupo não tinha conhecimento ou envolvimento com o assunto. A mídia estatal de Belarus relatou que a ordem foi dada pessoalmente por Lukashenko.

O ministro de Relações Exteriores da Irlanda, Simon Coveney, descreveu o pouso forçado como "pirataria da aviação patrocinada por Estado".

O diretor executivo da RyanAir, Michael O'Leary, chamou o caso de "sequestro promovido pelo Estado" e disse acreditar que havia espiões no voo.

Também nesta segunda-feira, Lukashenko sancionou emendas legais que restringem ainda mais a atuação dos movimentos pró-democracia e a circulação livre de informação em Belarus. As emendas obrigam organizadores a pedir autorização dos municípios para a realização de eventos em massa, o que dificulta a organização de protestos. As medidas também responsabilizam partidos políticos e associações caso seus líderes façam convocações a um evento antes que ele tenha sido autorizado. Além disso, a legislação diz que jornalistas não podem atuar como organizadores ou participantes de eventos em massa no curso do seu trabalho, ou levantar fundos para eventos, noticiou o RadioFreeEurope.

Organizações de direitos civis de Belarus estimam que mais de 35 mil pessoas já foram detidas, temporariamente ou não, nos protestos que têm ocorrido regularmente desde agosto. Grande parte dos principais líderes da oposição está presa ou exilada em outros países.

União Europeia, Estados Unidos, Canadá e outros países não reconhecem Lukashenko como presidente legítimo de Belarus.

Quem é o jornalista Roman Protasevich

Roman Protasevich, de 26 anos, estava viajando em uma linha aérea comercial de Atenas a Vilnius, na Lituânia, quando a Força Aérea de Belarus enviou um caça MiG-29 para interceptá-lo. O voo, da companhia aérea irlandesa Ryanair, foi desviado para Minsk, onde o opositor foi detido. A tática, amplamente condenada pela comunidade internacional, foi a última tentativa de Lukashenko de suprimir a voz influente de Protasevich.

Por que o regime de Belarus está preocupado com Protasevich?

Restam poucas fontes de notícias independentes em Belarus, onde a maioria dos meios de comunicação foi forçada a fechar depois de protestos generalizados sobre a contestada eleição presidencial em 2020.

Protasevich é cofundador e ex-editor do Nexta, iniciativa de informação na plataforma de mídia social Telegram, que se tornou um canal popular para os inimigos de Lukashenko compartilhar informações e organizar manifestações contra o governo.

Ele fugiu do país em 2019, temendo ser preso, mas continuou a perturbar o regime enquanto vivia no exílio na Lituânia, tanto que foi acusado em novembro de incitar a desordem pública e o ódio social.

Quando adolescente, Protasevich foi expulso de uma escola de prestígio por participar de uma manifestação de protesto em 2011 e, posteriormente, foi expulso do programa de jornalismo da Universidade Estadual de Minsk.

O que aconteceu no domingo?

Protasevich estava voltando a Vilnius de uma conferência sobre economia na Grécia com a líder da oposição belarussa, Svetlana Tikhanovskaya, segundo autoridades gregas. O voo, que transportava cerca de 170 passageiros, deveria durar cerca de três horas. Ao se aproximar da fronteira entre Belarus e a Lituânia, porém, um caça MiG-29 foi escalado para interceptá-lo.

Lukashenko, que muitas vezes é apontado como "o último ditador da Europa", ordenou pessoalmente que o caça escoltasse o avião da Ryanair até o aeroporto de Minsk após uma ameaça de bomba, disse seu serviço de imprensa. De acordo com o comunicado, Lukashenko, aliado do presidente russo Vladimir Putin, deu uma "ordem inequívoca" para "fazer o avião dar meia-volta e pousar".

Nenhuma bomba foi encontrada a bordo, disseram as autoridades policiais do país.

Antony Blinken, o secretário de Estado dos EUA, criticou duramente o governo de Lukashenko no Twitter no domingo pela detenção de Protasevich. Ele chamou de "ato descarado e chocante desviar um voo comercial e prender um jornalista".

"Exigimos uma investigação internacional e estamos coordenando com nossos parceiros as próximas etapas", disse Blinken. "Os Estados Unidos estão com o povo de Belarus."

Que tipo de punição ele pode enfrentar?

A principal agência de segurança do regime de Belarus, chamada KGB, colocou o nome de Protasevich em uma lista de terroristas. Se ele for acusado e condenado por terrorismo, pode enfrentar a pena de morte. As acusações de incitação à desordem pública e ao ódio social acarretam uma pena de mais de 12 anos de prisão.

Qual foi a reação da comunidade internacional?

Ainda no domingo, reações contra a medida do governo belarusso começaram a surgir entre os países do continente europeu e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), do qual fazem parte o Lituânia, Grécia e Irlanda - países de origem, destino e da companhia aérea do voo interceptado. Lituânia e Letônia pediram que todos os voos internacionais evitem sobrevoar a Belarus como sanção às autoridades deste país. Países da União Europeia se reuniram nesta segunda-feira, 24, em Bruxelas para estudar sanções a serem aplicadas contra o regime de Lukashenko.

O ministro das Relações Exteriores da Itália, Luigi Di Maio, classificou o caso como um "inaceitável sequestro de Estado". "Como governo e como União Europeia, consideramos inaceitável o que se passou. Estamos diante de um sequestro de Estado e isso é inaceitável.

A companhia aérea AirBaltic, com sede na Letônia, antecipou-se a qualquer decisão governamental e afirmou que evitará o espaço aéreo de Belarus. "Decidimos evitar entrar no espaço aéreo belarusso até que a situação se esclareça, ou as autoridades tomem uma decisão", disse a empresa em um comunicado. E completou: "A segurança e a saúde dos nossos passageiros e funcionários é a principal prioridade da companhia".

Está marcada para terça-feira, 25, uma reunião entre embaixadores da Otan para discutir a aterrissagem forçada. "Os aliados realizam consultas sobre a aterrissagem forçada do avião da Ryanair por parte de Belarus, e os embaixadores vão discutir o tema amanhã", disse um porta-voz da aliança militar à France-Presse.

Principal aliada de Belarus, a Rússia se manifestou nesta segunda-feira. A diplomacia de Moscou se disse surpresa com "as acusações ocidentais" contra o regime de Lukashenko: "É surpreendente que o ocidente considere o incidente no espaço aéreo de Belarus seja surpreendente", afirmou a porta-voz do ministério russo de assuntos exteriores, Maria Zajarova. O porta-voz da presidência russa, Dmitri Peskov, afirmou que a avaliação sobre a ação deve ser feita por autoridades aéreas internacionais, e se negou a dar um posicionamento oficial do Kremlin.

O que diz Belarus sobre o caso?

Autoridades de Belarus reiteraram nesta segunda que atuaram de maneira legal quando desviaram um avião com um dissidente a bordo e acusaram os países ocidentais de apresentar acusações "infundadas" por motivos políticos. "Não há dúvida de que as ações de nossas autoridades competentes cumpriram plenamente as normas internacionais estabelecidas", afirmou o porta-voz do ministério das Relações Exteriores, Anatoly Glaz, em um comunicado, no qual acusa o Ocidente de "politizar" a situação.

"Estão fazendo acusações infundadas", acrescentou Glaz, antes de afirmar que foi "triste" que os passageiros "tenham enfrentado alguns inconvenientes. E completou: "No entanto, as normas de segurança da aviação são uma prioridade absoluta".

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