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Como explicar aquele misto de medo e curiosidade no primeiro dia de aula do 6.º ano do ensino fundamental? Estamos chegando ao final do ano letivo na maioria das escolas do país, onde mais de três milhões de crianças e adolescentes matriculados no 5.º ano aguardam por essa passagem. Em muitos casos significa necessariamente mudar de escola. Para todos os alunos significa deixar para trás a professora pedagoga polivalente, referência diária e constante, para encontrar vários e novos professores. E ainda encarar novas tarefas e desafios que exigem maior organização e autonomia. Sem falar que tudo isso se dá bem no momento em que passam por mudanças físicas, psíquicas, emocionais e sociais, no caminho entre a infância e a adolescência.

Como então as escolas e redes públicas de ensino se preparam para essa fase de transição? Se por um lado no Brasil os anos iniciais do ensino fundamental – 1.º a 5.º ano – já tem recebido investimentos sobretudo em relação à alfabetização, a etapa dos anos finais – 6.º a 9.º – não tem a atenção devida na formulação e implementação de políticas públicas. Problemas de desempenho, reprovação, abandono e evasão se intensificam justamente nessa etapa, em que meninos e meninas passam a acumular histórias de fracasso escolar.

Uma cultura de reprovação culpa o aluno, mas não muda as estratégias de ensino para que ele consiga aprender de formas diferentes

Os dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – Ideb 2017 confirmam o resultado desse baixo investimento nos anos finais. Conseguimos uma melhoria significativa no desempenho dos anos iniciais, enquanto nos anos finais a evolução foi muito tímida. A taxa de insucesso escolar (reprovação e abandono) do segundo ciclo (12,6% em média) continua sendo radicalmente superior comparado à etapa anterior (5,8%). Além disso, de cada 100 estudantes, 26 estão com atraso escolar de dois anos ou mais, fazendo com que jovens com mais de 15 anos convivam às vezes com pré-adolescentes de 11, e percam a motivação para permanecer na escola. Uma cultura de reprovação culpa o aluno, mas não muda as estratégias de ensino para que ele consiga aprender de formas diferentes. O Brasil é um dos países que mais reprova, apesar das evidências de que repetir de ano não melhora o desempenho.

Mas o desafio dos anos finais não é o mesmo para todos. O Panorama da distorção idade–série no Brasil, divulgado nesse ano pelo Unicef, por exemplo, mostrou que a taxa de alunos que repetiram de ano duas ou mais vezes é significativamente maior para os estudantes indígenas, pretos e pardos, tanto no meio urbano, quanto no meio rural. O Ideb também tem mostrado grandes disparidades por região e nível socioeconômico.

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A complexidade dos processos de escolarização dos adolescentes não está apenas no Brasil. Tem sido alvo de pesquisas e programas em diferentes países e sistemas educacionais. É uma etapa que exige cuidados e reflexões com os quais toda sociedade precisa se ocupar. É área estratégica para as redes municipais e estaduais de ensino, que no Brasil dividem a responsabilidade pelas matrículas. Nesse sentido, a produção de pesquisas aplicadas que possam ir além do diagnóstico do problema, para apontar caminhos, pode oferecer uma contribuição significativa. Um esforço nessa linha é o edital de pesquisas Os anos finais do ensino fundamental: adolescência, qualidade e equidade na escola, que acaba de ser lançado pelo Itaú Social e a Fundação Carlos Chagas, com um conselho de representantes de redes estaduais, municipais e organizações da sociedade civil. Os recursos destinam-se a projetos que unam pesquisadores, comunidades escolares e redes públicas, assim como organizações sociais e coletivos.

Cada vez mais o olhar – e a voz– de quem está no dia a dia da educação precisa estar presente na produção de conhecimento que articula teoria e prática, pesquisa e ação, voltadas a uma etapa escolar tão estratégica para o desenvolvimento educacional do país.

Patricia Mota Guedes é gerente de Pesquisa e Desenvolvimento do Itaú Social.
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