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Ministério Público
Proposta que amplia a influência do Congresso Nacional dentro do CNMP será apreciada pela Câmara.| Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

O Ministério Público do Paraná (MPPR) solicitou a devolução de R$ 650 milhões aos cofres públicos em 2020. Dinheiro que tinha sido desviado da educação, da saúde, da segurança e de serviços que podem melhorar a qualidade de vida da população. Esse montante equivale à distribuição do valor de um salário mínimo para 50 mil famílias pelo período de um ano. Estima-se que no Brasil o desvio de dinheiro represente entre 1,3% e 2% do Produto Interno Bruto (PIB). Estamos falando de bilhões de reais – no ano passado, que foi muito ruim para a economia em função da pandemia, o PIB totalizou R$ 7,4 trilhões.

Trata-se de dinheiro que foi usurpado em situações que envolvem enriquecimento ilícito, danos ao erário e de violação dos princípios da administração pública e foram denunciados e investigados pelo Ministério Público. São processos oriundos do mal que afeta toda a sociedade: a corrupção. Combatê-la é papel do Ministério Público, determinado pela Constituição Federal, o que exige independência funcional e autonomia institucional.

A PEC 5/2021 coloca uma mordaça e tenta silenciar promotores e procuradores por meio da intimidação, favorecendo réus e investigados, um retrocesso no combate à corrupção

Estes dois princípios estão sendo violados pela PEC 5/2021, com a finalidade de dificultar a fiscalização e a denúncia do mau uso do dinheiro público, tarefa que ficará cada vez mais difícil de se realizar. Promotores e procuradores de Justiça muito provavelmente serão punidos por investigados e denunciados que terão esse poder concedido pela PEC 5.

O momento que estamos vivendo não é tão surpreendente assim; investigar e prender poderosos da política e do meio empresarial é passível de reação. Foi assim com a Operação Mãos Limpas na Itália, que inspirou a Lava Jato no Brasil. Tanto lá quanto aqui, a resposta veio em três frentes: absolvição dos condenados, alteração das leis e um movimento de vingança contra as instituições que responsabilizaram os corruptos. Recentemente, o Congresso brasileiro aprovou a mudança na Lei de Improbidade Administrativa; segundo a imprensa, somente com a anulação de ações abertas contra quatro partidos (PT, PP, PSB e um diretório estadual do MDB) será anulado o ressarcimento aos cofres públicos de mais de R$ 1 bilhão. Ao todo, a Lava Jato devolveu R$ 4 bilhões aos cofres públicos.

Agora, a PEC 5/2021 coloca uma mordaça e tenta silenciar promotores e procuradores por meio da intimidação, favorecendo réus e investigados, um retrocesso no combate à corrupção. Isso me faz trazer ao debate a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), no caso Julio Casa Nina: em 2020, a corte responsabilizou a República do Peru pela violação dos direitos a garantias judiciais como consequência de sua destituição do cargo de Fiscal Adjunto Provisório da Segunda Promotoria Penal da Província de Huamanga Ayacucho. Para resumir a decisão, vale destacar a afirmação de que os Estados têm a obrigação de garantir “que os promotores possam exercer suas funções profissionais sem intimidação, obstáculos, assédio, interferência indevida ou risco injustificado de incorrer em responsabilidade civil, penal ou outra”.

Talvez este seja o caminho do Brasil; para poder zelar pela Constituição brasileira, talvez tenhamos de seguir o exemplo do nosso colega peruano, tornando uma prática comum de promotores e procuradores de Justiça brasileiros a de recorrer aos tribunais para não sermos silenciados. Caso a PEC 5 seja aprovada, esse será o caminho para cumprirmos nosso papel de representar e defender a sociedade, impedindo os desvios de recursos de sua finalidade, garantindo, principalmente, à população mais vulnerável o acesso aos seus direitos.

André Tiago Pasternak Glitz é promotor de Justiça e presidente da Associação Paranaense do Ministério Público (APMP).

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