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Há uma sensação de enlevo e êxtase quando imergimos em uma boa leitura, quer pelo aconchego de um livro impresso, quer pela praticidade de um tablet ou outro dispositivo digital. Afinal – ao contrário de algumas previsões belicosas –, os e-books e as versões em papel não são rivais, e sim suportes diferentes que retratam uma harmoniosa convivência entre gerações analógicas, imigrantes digitais e nativos digitais.

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Vivenciamos uma época singular da história com a superabundância de livros, revistas e jornais a preços acessíveis – muito diferente de uma realidade não tão distante –, e o acesso gratuito a praticamente todos os grandes clássicos da literatura universal por meio de downloads.

Há exatos 30 anos, o físico inglês Tim Berners-Lee criou a fantástica rede "www", com a “ambição de que um dia ela abraçasse toda a Terra” – segundo suas palavras –, e sequer a patenteou para que fosse “livre e igualitária”. Só para dar uma ideia de seu gigantismo, nos dias de hoje a cada 5 minutos a internet hospeda novos dados que equivalem, em gigabytes, à totalidade do conteúdo da Biblioteca do Congresso norte-americano – a maior do mundo em acervo físico –, conquanto uma parcela significativa de bits da web seja fútil, quando não perniciosa.

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São os exemplos e não as palavras que influenciam a formação de novos leitores

Assim, a internet tornou-se a quase realização do grande sonho dos diretores da antiga Biblioteca de Alexandria, que no período do século III a.C. ao século IV d.C. continha praticamente todos os registros escritos da Antiguidade em cerca de 700 mil rolos de papiros. Seu lema era “adquirir um exemplar de cada manuscrito existente na face da Terra”.

A aquisição desses exemplares, no entanto, era uma odisseia. Cada pergaminho era obtido por diferentes meios – prioritariamente escambo ou pilhagem –, aproveitando-se do fato de que os navios que partiam de Alexandria singravam todos os mares conhecidos à época. No entanto, pela raridade, o manuseio era restrito aos mais conspícuos mestres da época. Atualmente, em contrapartida, vivemos a Era da Informação, com uma profusão mais ampla e democrática de conteúdo na web, apesar de ainda persistirem restrições de informações, especialmente estratégicas, científicas e tecnológicas.

Os suportes digitais para leitura são práticos, armazenam vários livros – uma facilidade para as viagens – e os preços para download são módicos. Porém, alguns estudos indicam que ler na tela pode eventualmente ser menos eficiente em comparação ao livro impresso para a compreensão e retenção de conteúdo, em especial os mais complexos e para gerações que não são nativas digitais.

Apesar dessa realidade global, o Brasil ainda é um país com baixo índice de leitores, ao menos em termos de conteúdos úteis, pois, considerando a leitura espontânea (ou seja, excluindo os indicados pelas escolas), não chega a dois per capita, enquanto na França é sete e nos EUA é cinco. Afinal, o brasileiro gasta, em média, 3h45 min por dia em redes sociais. Sim, ocupamos o segundo lugar (o primeiro são as Filipinas), num ranking de 45 países, conforme pesquisa publicada há um mês pela GlobalWebIndex, com sede em Londres. Isso significa menos leituras, menos estudo e menor convivência com familiares e amigos no mundo real.

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Um robusto estudo de 298 páginas denominado Retratos da Leitura no Brasil, do Instituto Pró-Livro, indica que quase 56% dos brasileiros se declaram leitores – o critério é ter lido um livro ou parte dele nos últimos três meses. Nos dois extremos, temos 30% que nunca compraram um livro e 25% com boas habilidades em leitura e escrita. Um recorte interessante desse estudo mostra que a maioria considera que a leitura ensina a viver melhor e que se converte em bons hábitos, inclusive citando uma pesquisa da Universidade de Roma que chegou à conclusão de que os leitores são mais felizes do que os não leitores.

Esse mesmo estudo também comprova o que todos sabemos: são os exemplos e não as palavras que influenciam a formação de novos leitores. Nesse sentido, prevalece a premissa de que a criança não nos ouve, mas nos imita, ou seja, pais e professores leitores formam crianças leitoras.

Ademais, os bons leitores têm melhor compreensão de textos, loquacidade, pensamento crítico e escrita fluente na norma culta, requisitos tão valorizados nos concursos e na vida profissional. Quem bem lê, bem escreve. E sobre essa importância de uma boa escrita, os antigos já nos ensinavam em bom latim: verba volent, scripta manent (as palavras voam, os escritos ficam).

Jacir J. Venturi, autor de três livros e membro do Conselho Estadual de Educação, foi professor da UFPR, PUCPR e Coordenador na Universidade Positivo.