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O presidente da Argentina, Alberto Fernández, fala a apoiadores após a divulgação dos resultados das eleições legislativas no país, 14 de novembro
O presidente da Argentina, Alberto Fernández, fala a apoiadores após a divulgação dos resultados das eleições legislativas no país, 14 de novembro| Foto: EFE/ Juan Ignacio Roncoroni

O peronismo recebeu duro golpe nas eleições legislativas realizadas recentemente na Argentina, fazendo com que o governo deixasse de ser maioria no Senado e mantivesse apenas uma maioria apertada na Câmara dos Deputados. Considerado o panorama político sul-americano, é importante refletir sobre o significado de tal movimento para os demais países da região, especialmente o Brasil.

Algumas experiências de democracia direta, que parecem dar mais qualidade à participação popular nada mais são do que a manipulação da vontade da sociedade por meio de grupos de interesse próximos ao governo.

A derrota do governo peronista de Alberto Fernández é um sinal de mudanças de ares na América do Sul. Em um país fortemente marcado pela cultura política populista, assim como vários outros vizinhos regionais, a perda de influência, ainda que temporária, dos governistas capitaneados por Fernández e por sua vice, Cristina Kirchner, demonstra que a retomada de poder pelos partidos sul-americanos de esquerda, após um período de vitórias de facções políticas de direita, apresenta alguns desafios relevantes. O principal aspecto a ser observado diz respeito à economia.

A Argentina, que chegou a ser um dos países mais ricos do mundo no início do século 20, amarga crises seríssimas nos campos político e econômico, algo especialmente marcante desde o início do século 21. O preço cobrado da sociedade pela instabilidade institucional é sobejamente conhecido pelos observadores da história recente dos vizinhos dos brasileiros. A inflação descontrolada e o vencimento iminente de boa parte da dívida contraída junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI) pelo governo anterior de direita, liderado por Mauricio Macri, são apenas dois dos ingredientes que compõem a indigesta refeição a ser saboreada pelos argentinos atualmente e no futuro breve, ao menos.

O que a situação dos hermanos ensina ao Brasil? Antes de mais nada, evidencia o efeito deletério que o populismo (de esquerda ou de direita) pode produzir sobre a vida dos cidadãos, no curto e longo prazo. A prática populista é caracterizada, sobretudo, por dois elementos: a suposta identificação do líder político com a camada popular, contrapondo-se (ainda que apenas retoricamente) à elite; e a tentativa de eliminar as estruturas de mediação entre os cidadãos e o poder, com base na crítica acerba dos elementos característicos da democracia representativa. Algumas experiências de democracia direta, inclusive em território sul-americano, que parecem dar mais qualidade à participação popular nada mais são do que a manipulação da vontade da sociedade por meio de grupos de interesse próximos ao governo.

O Brasil está próximo das eleições que, além da escolha dos chefes dos Executivos federal e estaduais, permitirão a escolha de membros que comporão a Câmara dos Deputados, parte do Senado Federal e os Legislativos dos estados-membros da Federação. A política nacional é permeada por grandes exemplos de figuras populistas antigas e recentes, algumas das quais com chances reais de vitória no próximo pleito. O exemplo argentino de irresponsabilidade na adoção de políticas macroeconômicas não pode ser desprezado pela sociedade brasileira. Caso isso ocorra, há grandes chances de esses dois grandes países dançarem, cada um a seu jeito, ao som melancólico da canção tocada nessas plagas que sempre provoca, ao fim, a queda de uma lágrima por mais uma oportunidade perdida de conceder vida digna aos respectivos cidadãos.

Elton Duarte Batalha é advogado, doutor em Direito e professor de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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