| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Houve um tempo em que os políticos debatiam qual o melhor caminho para o progresso; hoje, discute-se como o Brasil pode oferecer escadas mais fáceis para permitir ascensão social aos grupos com poder de pressão no uso dos recursos públicos. Procura-se beneficiar indivíduos, não o país. A discussão sobre as reformas, trabalhista e previdenciária, é exemplo deste desvio da estratégia do “caminho” para a estratégia da “escada”.

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Cada grupo estuda e defende suas posições, favoráveis ou contrárias às reformas, não em função de qual será o melhor caminho para desamarrar o Brasil e permitir caminhar para o aumento de nossa eficiência, produtividade, justiça, independência, sustentabilidade, incentivo aos jovens, proteção aos velhos, pobres e doentes; mas em função de como evitar perdas para seu grupo, ou para conseguir aumentar seus benefícios ou seus votos. Busca-se escadas para indivíduos, não caminhos para o conjunto do país.

Durante a elaboração da Constituição decretou-se mais direitos do que deveres

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Este não é um fenômeno novo. Em reação aos anos de chumbo da ditadura, durante a elaboração da Constituição decretou-se mais direitos do que deveres. Desde a luta pela democracia, que buscava definir os rumos para o país, o debate político perdeu a discussão de quais os melhores caminhos para todos os brasileiros e se concentra até hoje, salvo exceções, em quais são as escadas para servir a cada grupo e cada indivíduo.

Até mesmo boas políticas para corrigir injustiças têm sido definidas mais para atender interesses de grupos do que para formar compromissos com o país: preferimos o uso de cotas para ingresso na universidade ao caminho mais ambicioso de assegurar a educação de base com a mesma qualidade para brancos e negros, pobres e ricos. Contentamo-nos com um programa justo de assistência por meio de transferência de renda para cada família pobre, no lugar de uma estratégia ousada para fazer a emancipação da população pobre e ninguém precisar de bolsas. O Ciência Sem Fronteiras foi mais orientado para beneficiar jovens do que para construir um potente sistema de ciência e tecnologia a serviço de todo o país e seu futuro.

Leia também:De concessão em concessão (editorial de 20 de junho de 2017)

Leia também:Reforma da Previdência: todos precisam dar sua contribuição (artigo de Adolfo Sachsida, publicado em 5 de maio de 2017)

A Operação Lava Jato e a Lei da Ficha Limpa têm a grande vantagem de tirar escadas para a eleição de políticos corruptos, mas não vão construir o caminho para a escolha de políticos honestos. Felizmente já temos o sistema judiciário que prende corruptos, mas ainda não formamos uma massa de eleitores capazes de eleger políticos honestos.

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O Brasil precisa sair da discussão de escadas que atendem interesses de grupos e fazer o debate sobre quais são os melhores caminhos para o futuro desejado. Mas isso é difícil porque, no lugar de buscar construir coesão nacional, preferimos continuar a política de atender corporações, sindicatos, associações, grupos. Não percebemos que essa falta de coesão é a principal causa de nossos problemas e frustrações: porque sem coesão, política e social, não vamos definir um rumo para o conjunto de nosso povo e nossa nação.

Cristovam Buarque é senador (PPS-DF) e professor emérito da Universidade de Brasília (UnB).