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Em tempos de Lava Jato, Zelotes, Triplo X ou Acarajé, é importante lembrar que nada disso seria possível sem uma imprensa livre e independente. Nem a liberdade e nem a independência são coisas que caem do céu. A democracia é quase uma exceção em nossa história e, como dizia meu avô, o preço da liberdade é a eterna vigilância. A democracia corre risco no Brasil? O senso comum diria que não, que não há sinais visíveis deste risco, como demonstram os próprios escândalos que tragam indiscriminadamente personagens de nossa elite política e empresarial. Há um ex-presidente na iminência de ser preso, uma presidente ameaçada de impeachment, ex-ministros, ricos empresários presos e outros que ainda o serão. Há dinheiro roubado sendo devolvido para os cofres do governo, como nunca se viu. As instituições parecem fortes, mesmo tendo em suas lideranças personagens abomináveis como os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados.

Não será o Netflix, o Facebook ou mesmo os noticiários das tevês que garantirão a democracia, a minha e a sua liberdade

Nós, brasileiros, nos acostumamos rapidamente com a democracia e agimos como se ela fosse natural, um direito consolidado. No entanto, há ameaças por toda parte. Várias foram as tentativas nos governos Lula e Dilma de interferência nesta liberdade, via legislação ou pela criação de algum órgão. Na maioria das vezes, ela ocorreu de forma disfarçada, em nome da própria democracia, mas estava lá o vírus, que uma vez implantado se replica como o zika. Até agora escapamos, mas é bom não descuidar. Há, porém, um risco do qual poucos se dão conta: a quebra da imprensa, não pela legislação, mas pelo mercado. Jornais e revistas de grandes grupos vivem um momento crítico. A maior parte acumula altos prejuízos nos últimos anos, faz duros cortes de pessoal e enfrenta o desafio da própria sobrevivência.

O pior é que não se pode dizer que seja uma questão conjuntural, fruto da crise econômica que passamos no Brasil. A revolução digital que afeta todos os setores causa na mídia um dos seus maiores impactos. Não se trata apenas de uma ruptura e uma substituição do antigo pelo novo. Vive-se um tempo em que o antigo é destruído e não há nada no lugar, não um modelo que garanta um jornalismo economicamente saudável e, por isso, independente.

Não nos iludamos: precisamos de jornais e de revistas jornalísticas. O entretenimento e as manifestações culturais são importantes. Elas dão sabor à vida. Mas não será o Netflix, o Facebook ou mesmo os noticiários das tevês que garantirão a democracia, a minha e a sua liberdade. A solução também não virá de concessões públicas ou de generosas verbas publicitárias do governo. Ela precisa vir do mercado e nós, como leitores, anunciantes, empresários e trabalhadores, temos a nossa participação.

O primeiro passo é a conscientização do problema. Parece pouco, mas não é. A ignorância é sempre um inimigo ardiloso. Ela impede que as verdadeiras questões sejam enfrentadas, se aliando, no momento, à criação de fórmulas mágicas, rituais corporativos inúteis e a uma legislação que engorda um sindicalismo retrógrado, que só defende os seus próprios interesses e que, ao fim, dá um tiro no próprio pé.

Julio Sampaio é sócio da Resultado Consultoria, especializada na área de gestão de mídia.
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