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Março chegou e, com ele, a vigência do artigo 5.º da Lei 13.103/2015, que obriga motoristas profissionais a realizarem periodicamente exames toxicológicos de larga janela de detecção – que permitem encontrar traços de uso de substâncias psicoativas. Segundo a redação vigente da regulamentação, “o exame toxicológico de larga janela de detecção será exigido para a habilitação, renovação ou mudança para as categorias C, D e E, a partir de 2 de março de 2016, excluindo-se os processos de habilitação que já tenham sido iniciados até essa data”.

Iniciativa louvável, se levarmos em conta que o legislador ansiava pela diminuição dos acidentes de trânsito e, por consequência, de vítimas. O que não foi levado em conta durante a criação da lei, aparentemente, foi toda a dificuldade de implantação que ela geraria, tanto para os laboratórios quanto para os empregadores e até mesmo para os motoristas sobre os quais a legislação incide.

Não irei me debruçar no mérito de a lei ser ou não constitucional, uma vez que não sou especialista em direito e, mesmo entre juristas, o assunto tem gerado grande controvérsia. Quero me ater aqui ao aspecto da aplicabilidade dos exames. Primeiro, quanto à operacionalização por parte dos laboratórios e, em um segundo momento, no que tange ao empregador do motorista profissional.

Isso é Brasil? Um país onde se criam leis para americano ver e sem aplicação prática?

O estado de São Paulo conseguiu, na Justiça, autorização prévia (tutela antecipada) para não condicionar a concessão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) ao teste. Na opinião do governador Geraldo Alckmin, o exame é inútil. Ainda segundo ele, as entidades médicas e de segurança no tráfego dizem que o exame não tem sentido. Inútil ou não, a Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), a Sociedade Brasileira de Toxicologia (SBTOx), o Conselho Federal de Medicina, a Sociedade Brasileira de Ciências Forenses (SBCF), a Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT) e até o Ministério da Saúde, apenas citando órgãos de abrangência nacional, se posicionaram contrários à realização do exame toxicológico da forma como consta na legislação.

Um dos fatos por trás disso é o de que o Brasil não tem infraestrutura para realizar esse tipo de exame. Todas as amostras teriam de ser enviadas aos Estados Unidos e o custo de cada exame seria de aproximadamente US$ 100. Ou seja: sairia por quase R$ 400. Fora isso, às vésperas da entrada em vigor da lei o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) não tinha cadastrado nenhum laboratório para a coleta de material biológico e processamento dos resultados – só em 25 e 26 de fevereiro foram definidos laboratórios aptos a realizar os exames.

Isso é Brasil? Um país onde se criam leis para americano ver e sem aplicação prática? Não quero acreditar que seja assim. Mas infelizmente é o que temos visto nos últimos tempos, com leis saindo e sendo revistas, como a obrigatoriedade do extintor de incêndio no novo modelo, que depois perdeu a validade, deixando para trás empresas quebradas, consumidores lesados e gasto inútil de bilhões. Quem não se lembra do kit obrigatório de primeiros socorros para automóveis? Se você procurar no porta-luvas de seu veículo, quem sabe encontre uma maletinha com gaze e esparadrapo vencido e amarelado. E quem paga a conta sempre? A sociedade.

Quanto aos exames toxicológicos, o motorista irá desembolsar o valor ao fazer ou renovar a CNH, mas nós, os empregadores, de tempos em tempos, também seremos obrigados a aplicar o teste em todos os motoristas de nossas frotas. A um custo de R$ 400 por funcionário. Quem vai pagar essa conta? Os exames toxicológicos devem ser realizados previamente à admissão e por ocasião de desligamento do motorista, ou seja, gerarão custos para o empregador. Agora eu pergunto: como não aumentar o valor do frete? No fim, ao que tudo indica, o exame não trará o resultado esperado – mais segurança nas estradas – e ainda gerará mais custos na cadeia do setor.

Gilberto Cantú é presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas no Estado do Paraná (Setcepar).
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