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Se fosse possível levar a sério o que o presidente-candidato diz nesta fase em que briga com a evidência nas repetidas desculpas de que ainda não decidiu se disputará a reeleição, o PT estaria em polvorosa com o pito, recheado da ameaça do "vou para casa com índices de aprovação confortáveis", caso o partido em crise não se acerte com o PMDB, o novo aliado perfeito para o acasalamento não apenas na caça ao voto, mas no exercício do bis do mandato.

A história do encontro de Lula com lideranças petistas é contada, com riqueza de detalhes, pelo repórter Josias de Souza, no seu blog na Folha de S. Paulo. E a pouca importância com que os repreendidos como meninos de escola deram ao puxão de orelha do chefe explica o silêncio que preservou o bate-papo por duas semanas.

Todo o enredo dos acertos entre Lula e o PMDB cabe no ensaio que salta por cima da troca de desaforos do passado recente impulsionado pela recíproca necessidade da barganha em dois tempos.

Lula está firme na liderança das pesquisas, favorito disparado e favorecido pela anemia do candidato oposicionista, o ex-governador Geraldo Alckmin, que patina em percentuais medíocres. Mas, voto nunca é demais para a gula insaciável de candidato. E, na mesa da barganha, os interesses se encaixam como peças de jogo de armar. O PT purga, com o lombo ferido, a desmoralização dos escândalos do mensalão e do caixa 2, que destroçaram a antiga direção, jogando no limbo os quadros de comando como José Dirceu, o ex-presidente José Genoíno, o hoje famoso, isto é mal-afamado tesoureiro, Delúbio Soares e toda uma equipe caída em desgraça, e tenta sair do sufoco, sacudindo a lama que também respingou no governo.

Como ilustra a breve crônica do partido, Lula sempre carregou a legenda nas costas, com votação que arrastava o PT e distribuía mandatos parlamentares. Agora, a avaliação das probabilidades eleitorais é pessimista: não mais de três governadores – do Piauí, Sergipe e Acre – e considerável corte nas bancadas do Senado e da Câmara.

Portanto, o partido que deixe de pieguice, bote a cabeça no lugar e abra espaço, como Lula pediu – para o apoio aos candidatos a governador do PMDB.

Do mais ele está cuidando com o habitual desembaraço. No encontro com o ex-governador e desafeto Orestes Quércia trocaram afagos que sepultam ofensas do passado. A vice-presidência foi oferecida na bandeja ao adversário com quem, em tempos idos e vividos, travou o edificante duelo de agravos, iniciado por Quércia ao cutucar na moleira da inexperiência administrativa do torneiro mecânico: "Ele nunca dirigiu nada, nem carrinho de pipoca". A resposta subiu à ofensa: "Pelo menos eu não roubava a pipoca".

Mas, ofensas trocadas deslizam na pele dura de profissionais da política como a sujeira da corrupção sumiu nos esgotos do Palácio do Planalto sem que o presidente tivesse a curiosidade de saber a origem da catinga e das fortunas que financiaram a mais rica campanha da história do país.

Ninharias de fofocas de intrigantes. O apoio do PMDB à candidatura de Lula, depois da edificante reconciliação entre o candidato e Quércia, na verdade pouco altera a bagunça eleitoral. O PMDB aposta no futuro e coleciona promessas. Mas, sempre clareia a escuridão dos conchavos debaixo do pano. Em cada estado, o interesse dos candidatos a governador, puxadores naturais de voto da legenda, passará ao largo dos alinhavos de cúpula.

A candidatura própria do PMDB é capítulo encerrado ao compasso de forró de gafieira.

O presidente-candidato não perde tempo. No derradeiro mês em que o rombo na legislação eleitoral – escancarados pelo mais odiado inimigo, o antecessor FHC – facilita o uso da máquina governamental no disfarce da campanha ostensiva e em tempo integral, Lula cuida de ajeitar a herança maldita para o abençoado uso em proveito próprio.

Com a escassa experiência da praga da reeleição e mesmo com os descontos da fase vexaminosa que estamos suportando, causa espanto o desembaraço com que o governo abre o cofre e compromete as reservas dos êxitos econômicos para a afobada distribuição de favores e o atendimento de promessas de campanha esquecidas durante três anos e meio, com a generosidade de perdulário e a mais leviana impudência.

Os barnabés abandonados às traças durante os dois últimos governos implacáveis, depois de engambelados por migalhas, assistem à distribuição de fatias do bolo às categorias favorecidas pelos critérios da improvisação. Os militares recebem o agrado de 10%. Cerca de 100 mil professores universitários e de colégios federais receberão mais alguns reais.

Até o fim do mês, o balcão funcionará a pleno vapor. Quem quiser e puder que entre na fila.

O tempo é curto. Depois da bonança, mais quatro anos de castigo.

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